Tô nem aí

por Convidado 3 de julho de 2022   Convidado

*por Sérgio Marchetti

Quando fazia Letras na UFMG tive um colega que dizia que a cada dia a escola estava mais longe da sua casa. E, para quem estudava literatura e figuras de linguagem, aquilo era uma linda metáfora. Mas, se me permitem plagiar aquela ideia, digo que a educação está a cada dia mais longe dos jovens. E não me canso de repetir que nada acontece de maneira isolada. Então o contexto atual indica que as mudanças na educação dos filhos foi um fracasso?

Acredito que nenhum adolescente vá ficar com raiva de mim. Eles não vão ler o que escrevo. Não têm esse hábito. Mas não os culpo. Eles são o resultado de um sistema que diz que “evoluiu” e que ter respeito e educação são meras “caretices”, como também a própria palavra (careta) deve estar ultrapassada. Eu sou retrógrado. O que é isso? Alguém que não progrediu. Não conseguiu acompanhar a evolução da sociedade. Sim. Estou velho, tão velho que sou daquele tempo em que respeitávamos as pessoas com mais idade do que nós. Cedíamos o lugar para eles. E, mesmo que não tivessem razão, não ousávamos discutir. Falar palavrão? De maneira alguma, principalmente perto de uma mulher. Hoje, muitas delas evoluíram, e já falam muitos palavrões.

Eu moro no bairro Sion e aqui, bem perto da minha casa, tem uma escola para meninos de classe média alta. Mas, acreditem, meus crédulos leitores, muitos, não todos, mas muitos mesmo, não sabem o que é ser educado. E, para explicar melhor, digo que aqui está impossível almoçar em restaurante no horário entre meio dia e uma hora. Para vocês terem uma ideia, outro dia eu estava na fila para o almoço quando, sem nenhuma cerimônia, três meninas furaram a fila. Fiquei assustado e não disse nada, tamanha a naturalidade delas. Imaginei que já estivessem lá e, por alguns instantes, sem que eu percebesse, houvessem saído. Mas não parou por aí. Em seguida, mais quatro meninos me fizeram lembrar da frase do meu colega de faculdade: senti que meu almoço estava ficando a cada minuto mais distante de mim. Foi aí que intervi. E disse que estava na fila e que não poderia deixar tanta gente passar na minha frente. Fizeram caras de deboche. — Esse velho ridículo está nos atrapalhando— imagino que pensaram. E ainda argumentaram que os lugares estavam guardados, acompanhados de um som de “tô nem aí”. O prazer do almoço prosseguiu. E, finalmente, quando já havia atingido minha meta de ter um prato servido, veio a segunda etapa: não encontrei lugar para me sentar. Com o prato na mão, lembrei-me de um conto surreal de Murilo Rubião. As mesas estavam todas ocupadas, sem que os anjinhos estivessem almoçando. É que na minha completa incompreensão, não percebi que enquanto alguns estavam furando a fila, outros guardavam os lugares nas mesas. Compreendi, naquele instante, que a amizade é uma coisa linda de se ver. Sou ranzinza? Nem tanto. Não estou reclamando do barulho, digo dos gritos que, na minha rabugice, não percebi que eram a maneira de deixar os idosos surdos participarem do rico momento.

Não se preocupem, leitores casmurros, não vou falar da fila do pagamento. Depois do almoço, fui ao supermercado. Não havia vaga para estacionar. Perguntei ao segurança se estava acontecendo alguma coisa diferente. Ele me disse que era o horário. É que os pais estacionam no supermercado para deixar ou buscar os filhos na escola. Em minha pertinácia compreendi que as mães e pais, movidos pelo egocentrismo, “super” confundiram, inocentemente, o nome do estabelecimento, que, por ter a palavra “nosso”, seria o estacionamento deles.

Ao adentrar no recinto, como diz a polícia, tive vontade me evadir. Estava cheio de meninos. Parecia com aqueles filmes de invasores… Fiz a compra de dois itens e fui para o caixa de idosos, direito que já adquiri, e… vocês não acreditam… havia uma fila enorme somente de meninos uniformizados.

Depois da odisseia, sei que vocês estão pensando que fugi para casa para ter sossego. Mas não tive. Explico: minha rua era calma, sem trânsito, sem passar ônibus. Podíamos entrar e sair da garagem tranquilos. Mas, um belo dia, segundo alguns cidadãos que frequentaram as reuniões dos moradores do bairro, um certo vereador, por ter filhos na escola, conseguiu mudar o sistema de trânsito nas ruas Venezuela e Estados Unidos, visando, claro, melhorar o conforto dos pais dos alunos, em detrimento dos moradores e dos idosos das casas de repouso. Agora, não nos deixam sair ou entrar na garagem. Temos buzinaços, congestionamentos, conflitos e, até, acidentes de trânsito. Mas nada disso importa; o que vale é a intenção.

Por isso, dizem que “de bem-intencionados, o inferno está cheio” e aqui na Terra também.

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

Período sabático

por Convidado 6 de maio de 2022   Convidado

Neste abril, me reservei o direito de tirar férias e ir para o campo. Muita gente pode pensar que depois da reclusão imposta pela pandemia, o que precisamos é de trabalho e não de folga. Mas como estão as cabeças? Estão aptas às exigências do trabalho? O que tenho ouvido de depoimentos é que as pessoas estão cabisbaixas, desanimadas e depressivas.

Por isso, meus bucólicos leitores, após concluir um trabalho, decidi fazer uma quinzena sabática. Fugi do roncos dos motores, das buzinas de pessoas impacientes (nem por isso justifica-se a falta de educação), dos garis que acordam os moradores, sem cerimônia, perto da zero hora. Mas o maior ganho foi dispensar a internet e a televisão por todos os dias. Somente lá, percebi que estava sendo intoxicado e, pior, tendo meu cérebro massificado para que não conseguisse pensar por mim. Não assisti aos jogos de futebol, nem vi meu galo ganhar outra vez. Será que ganhou? Também não vi nada sobre o covarde massacre à Ucrânia. Tampouco ouvi notícias sobre a política, felizmente. Vocês estão se perguntando, meus tecnológicos leitores, se fiquei sem internet por tantos dias e sobrevivi?

A prova viva de que não morri é que estou, agora, escrevendo a minha experiência. A sensação é de “estou limpo”, como dizem os viciados em drogas quando conseguem ficar um tempo sem elas. O que impera aqui é o silêncio, apenas quebrado pelo canto dos pássaros. Nada substitui o cheiro do orvalho sobre a relva. Os morros, tão verdes quanto a esperança de um menino, me cercam por todos os lados, e um céu de um azul estonteante completa o quadro de paz que me serve como palco neste teatro da vida.  Sentado num banco de madeira e usufruindo de toda essa benção que Deus me proporciona, aproveito alguns instantes para reler o livro de Charles C. Mans, Felicidade: a escolha é sua. Título apropriado para a ocasião.

Os benefícios desta imersão começam pela saúde que, como todos sabem, depende da mente:  – mente sã, corpo são. E o mais surpreendente é que descobrimos o quanto nossas lentes estavam embaçadas, a ponto de vermos coisas de maneira invertida, como escreveu Machado de Assis, quando se referiu à imagem do espelho. Nos vemos invertidos.

Parece utopia, mas não é. Creiam em mim. Precisamos sair do quadrado para enxergá-lo nitidamente. Quando estamos envolvidos não conseguimos agir com precisão, porque a emoção ilude a razão. Salta-me ao pensamento uma memória de um tal “Efeito Halo”. Aprendi sobre ele quando realizava o primeiro trabalho de Avaliação de Desempenho Organizacional. Faz tempo…  mas o fundamento era que dificilmente avaliamos algo ou alguém somente com a razão. Sem precisar dizer que os agentes da comunicação profissional, quando lhes convêm, produzem notícias e têm recursos que nos levam a ver o demônio com a imagem do Salvador. O pior disso tudo é que nos convencem.

Por essa razão, já que estou no campo, é que temos que deixar de sermos rãs e nos transformar em pintassilgos, para sair do buraco, voar e descobrir que há vida fora da caverna, e com liberdade. Assim escreveu Rubem Alves (O pintassilgo e as rãs) e, muito antes dele, Platão também nos fala lindamente sobre o mesmo tema, em  O mito da caverna.

Apesar de tudo isso, ainda não aprendi a voar, apenas meus pensamentos voam “parecem uma coisa à toa…” mas estou apreciando o voo dos pássaros e “A insustentável leveza do ser”.

Sinto-me mais leve de espírito, mais sóbrio, e creio, me recarreguei de energia sem poluentes.

Olho para os morros e, são tantos, uns após os outros, que os vejo de mãos dadas para que a ganância dos homens jamais os consiga separar.

 

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

Regência e gerência

por Convidado 31 de março de 2022   Convidado

*por Sérgio Marchetti

Mais um curso de Formação de Gerentes e Líderes concluído com êxito. Com todas as dificuldades, principalmente causadas pela pandemia, conseguimos cumprir nossa missão. Como é difícil ter uma missão de desenvolver pessoas! Nós, professores, sabemos o que é isso. A começar por tentar fazer os grupos entenderem que toda organização tem uma missão que é, na verdade, sua razão de existir. Mas, em vez de existir, as pessoas acham mais fácil resistir à criação de uma missão. Julgam que é uma bobagem estabelecer missão, visão e valores. O fato é que não percebem que, independentemente de estarem escritos e declarados, o trio já existe, ainda que seja informal. Porque ele antecede a criação de uma empresa.

Neste ano, trouxemos novidades na forma de apresentar o curso. Convidamos Alexandre Dolabella França, Superintendente da Aloshopping, para realizar uma palestra sobre as questões legais que envolvem o trabalho, sobretudo do comércio — que aliás, é a vocação de Belo Horizonte. Na parte de Marketing e Branding tivemos excelentes contribuições, no decorrer da aula da Gerente do Sindilojas, Danielle Rocha. Também fomos brindados com inúmeras sugestões de Merchandising e Branding Pessoal, com cases de mais de 200 lojas, já implementados, pela Designer de Ambientes, Marina Armond, da Arqdecore, que trouxe valiosos subsídios ao nosso trabalho.

No que me coube, trabalhei, na prática, o Planejamento Estratégico — primeiro passo para alcançar qualquer objetivo. Também persistimos na Gestão por Competência que permite a autoavaliação dos participantes e de suas equipes, por intermédio do Gap Analysis. Este último representa uma ferramenta essencial a qualquer organização. Ressaltamos a importância da seleção de pessoas, do teste DISC de Análise Comportamental e de outras ferramentas que complementam a metodologia para obter uma identificação fidedigna do perfil atual de seus colaboradores e, desta forma, poder implementar ações pontuais para sua melhoria. Também apresentamos um levantamento de diagnóstico de gestão do tempo, feito em sala, para buscas de correções individuais. Contudo, não relegamos a venda a um segundo plano. Os processos de vendas foram demonstrados, exemplificados e, com foco no cliente-consumidor atual, no Marketing, na tecnologia e no Neuromarketing, avançamos bastante na capacitação dos participantes.

A distribuição de importância dos temas foi muita igualitária, porém, ponderamos que, se sua empresa tem liderança, ela ganha um ponto (1); conta com uma boa equipe de vendas, acrescentamos um zero (0,) fazendo dez (10) pontos. Havendo bom ou bons pontos de venda, acrescentamos outro zero (0), indo para cem (100) pontos. Caso invista em tecnologia, podemos somar mais um zero (0), perfazendo-se mil (1000) pontos. E, se possui treinamentos sistemáticos e planejamento, atribuímos mais um zero (0), atingindo dez mil (10.000) pontos. Porém, se tiramos a liderança que representa um ponto (1) ficaremos com zero, zero, zero, zero (0000), que não representa nada. Apenas por essa razão, protagonizamos a liderança e trabalhamos um perfil de líder que compartilhe, desenvolva pessoas, que sirva, agregue e crie relacionamentos. A liderança genuína exige um profissional que tenha visão sistêmica, que compreenda, domine e controle todos os processos da organização. Daí também a importância da gestão de processos acompanhada do MASP – Método de Análise e Solução de Problemas (TQC – modelo japonês)

Foi assim que demonstramos as ferramentas, visando a implantação de uma gestão, cujas raízes se assemelhem às do bambu chinês, que crescem anos para dentro da terra, criando uma força poderosa e, para que, ao crescerem para cima, possam ser quase perenes.

Precisamos, mesmo sem ventos a favor, criar pessoas com mentalidade de cooperação. Indivíduos vencedores, mas com sentimentos de empatia e compaixão. Pessoas espiritualizadas, que compreendam que tem um papel social na empresa. Seres que saibam que a felicidade gera dividendos e que pessoas felizes rendem mais, produzem mais e adoecem menos. Queremos desafiar os adoradores de líderes mal-intencionados, de chefes despreparados, inescrupulosos, pois pessoas competentes e honestas merecem líderes que os levem a caminhos mais retos na rota da ascensão social.

E assim o fizemos. Indicamos atitudes que descarreguem mais ocitocina e serotonina do que dopamina e cortisol. E o resultado estava estampado nos rostos dos alunos ao final de nosso encontro. A gratidão — o alicerce de qualquer projeto — comprovou a vitória da equipe de professores e participantes que, como membros de uma orquestra, mantiveram a sintonia e a harmonia das partes, trabalhando uma gerência com a alma da regência.

E quando todos atingem um objetivo comum, todos são vencedores, e o grupo fica feliz.

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

O arquétipo de Bolsonaro

por Convidado 3 de março de 2022   Convidado

* por Malco Camargos

Você já ouviu falar em arquétipo? No Marketing Político os arquétipos são usados como atalhos para demarcar traços de personalidade, valores, visão de mundo e crenças. A construção de um arquétipo ajuda a equipe de campanha a unificar a narrativa, facilitando o reconhecimento do candidato pelos eleitores.

O Presidente Jair Bolsonaro fez – e faz – uso contínuo desta associação. Entre os vários arquétipos possíveis, Bolsonaro escolheu o que representa a PESSOA COMUM, alguém próximo do eleitor, com os mesmos gostos, o mesmo estilo de vida.

Desde a campanha eleitoral, quando fez uma live cortando cabelo em um salão simples no Rio de Janeiro, passando pelas várias aparições públicas com camisas de times de futebol, até o uso da caneta BIC em reuniões oficiais podemos lembrar fatos que demostram o esforço do Presidente de se aproximar deste arquétipo.

Nos últimos tempos a construção deste arquétipo está também nas saídas do Presidente, seja comendo pizza em Nova York, seja na escolha do cardápio em barracas nos arredores de Brasília em seus passeios de moto pela Capital Federal.

Em tempo recente foi publicada em redes sociais (e depois excluída) pelo Ministro das Comunicações, Fábio Faria, uma filmagem de Bolsonaro, em um dos seus passeios de moto, parado em uma barraca de rua comendo frango com farofa.

A cena não impacta pela simplicidade do lugar, a cena impacta pela forma com que o Presidente se alimenta e pela bagunça que faz ao manusear os alimentos. Na cena em tela, Bolsonaro exagera nos trejeitos e passa uma imagem bem distinta de uma pessoa comum se alimentando com frango e farofa em uma barraca de rua ou mesmo dentro de sua casa.

Em tempos de escassez de alimentos, em um país onde mais de 50% da população não faz três refeições diárias, a pessoa comum nunca se alimenta da maneira que o Presidente representou.

Se Bolsonaro circulasse um pouco mais pelas periferias iria observar pessoas carentes, talvez famintas, mas que não jogam comida no chão ao se alimentar. Bolsonaro observaria que o arquétipo que tenta encarnar está cada vez mais distante da pessoa comum no Brasil de hoje.

*Malco Camargos é Doutor em Ciência Política, diretor do Instituto Ver Pesquisa e Estratégia e professor da PUC Minas. 

  Comentários
 

Nem samba, nem enredo

por Convidado 18 de fevereiro de 2022   Convidado

*por Sérgio Marchetti

Mais uma vez, estamos diante de um Carnaval no qual todos os dias são quartas-feiras de cinzas. E, se “…O importante é ser fevereiro/ E ter carnaval pra gente sambar…” e ter “A praça toda iluminada com tanta gente na calçada/…” então haverá somente “angústia, solidão, um triste adeus em cada mão…”. Porque a festa mais brasileira não acontecerá. “Aquela fantasia que eu comprei/ Ficou guardada e a sua também/ Ficou pendurada…” e vão continuar no armário. Seu bloco não vai desfilar… mesmo que diga: — “Eu quero é botar meu bloco na rua/ Brincar, botar pra gemer…” Não! As águas não vão rolar e muita garrafa cheia vai sobrar.

Meus caros leitores carnavalescos, “Quem sabe, sabe/ Conhece bem/ Como é gostoso/ Gostar de alguém…” E o carnaval, embora eu não aprove certas liberdades sem limites, é a festa da libertação do amor e da espontaneidade. Mas, para quem o importante é se “…perder de mão em mão, e ser ninguém na multidão…”, o sonho será adiado e “Quem não tem seu sassarico, sassarica mesmo só!” . O jeito é se conformar, meu caro folião.

Já, para muitos brasileiros não há problema se tudo faltar: “Pode me faltar tudo na vida:/ Arroz, feijão e pão/ Pode me faltar manteiga/ Tudo isso não faz falta não/ Pode me faltar o amor/ Isso até acho graça/ Só não quero que me falte/ A danada da cachaça…”

Até na “cidade maravilhosa, “…Berço do samba e de lindas canções/ Que vivem n’alma da gente/…” Nem lá, no Rio de Janeiro, na “…Praça onze tão querida, do carnaval a própria vida, onde tudo é sempre carnaval…”  não vamos ver, neste ano, os blocos passarem trazendo alegria.

Mesmo sem samba e sem enredo, mas com alegria, tão necessária a todos, neste triste momento, eu sugiro que, em família, em pequenos grupos, com os devidos e necessários cuidados e testes, sejam feitos seus carnavais, com ou sem chuva, sem perder a cabeça, mas com suor e cerveja, num churrasco ou numa festa qualquer. E que todos possam festejar a sobrevivência, a amizade e o encontro — que é tão essencial à vida.

“Liberdade! Liberdade! Abre as asas sobre nós.”

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

Ainda que haja sombras

por Convidado 3 de janeiro de 2022   Convidado

*por Sérgio Marchetti

Enfim, o ano de 2022 chegou e, ainda que tantos fatos e factoides nos levem a desacreditar em uma retomada mais abrangente, estou confiante de que a escuridão não haverá de perdurar. Vejo um raio de sol insistente em nos emprestar luz para um novo dia. E, estratégica e psicologicamente, janeiro é o mês mais apropriado para recomeçar, planejar e renovar.

Em mensagens nos cartões de Natal e Ano Novo observei nos desejos externados que ficou explícita a vontade de ver as pessoas se abraçarem sem medo e se libertarem da corrente invisível que nos prende há tanto tempo. Estivemos condenados à solidão e muitos cidadãos, cujas identidades não carregam os perfis de resiliência, se perderam em sua misantropia, promovida por grande parte da mídia. E não há como negar a ruptura que vivemos e que, impedidos de trabalhar, nos mergulhou nas trevas. E, apesar da sociedade ter evoluído para um cenário de idosos solitários, o estágio que nos impuseram não surtiu efeitos positivos. Apenas confirmaram que o homem é um animal gregário.

Mergulhamos em uma obra cinematográfica ou numa série (já que estão em moda) baseada em fatos, que encenava uma tragédia com progressivo número de vítimas de um vírus que, como um tufão, carregou pessoas queridas para longe de nós.

Peço licença aos meus leitores para estabelecer um paralelo da doença com o filme, baseado na obra de José Saramago, “Ensaio sobre a cegueira”. E, para quem não conhece, o autor descreve uma cegueira coletiva, e, bem rapidamente, todos vão sendo acometidos por ela. Somente uma mulher podia ver, mas manteve isso em segredo.

Na minha maneira de analisar e entender, Saramago, propositalmente, nos faz examinar as consequências de uma doença pandêmica e passa, sem nenhuma cerimônia, uma imagem crítica sobre as reações da sociedade, dos órgãos responsáveis e das atitudes cruéis, egoístas e hipócritas.

Continuando a narrativa, a cegueira coletiva era iminente e, depois de estabelecida, viria o caos completo. As autoridades enviaram os cegos para um manicômio para que ficassem isolados dos demais cidadãos. Desavenças, disputas, formação de grupos foram observadas e destacadas fortemente. Jogo de interesses, favoritismos e tudo de mais sórdido seriam, como sempre, utilizados pelos oportunistas para atingirem seus objetivos escusos.

Há muita coisa em comum com a nossa atual doença? Estou convicto que sim. E vale pela reflexão.

Em 2022, ainda teremos cegueiras, escuridão, apagões, doenças e a impossibilidade de testemunharmos uma recuperação milagrosa. Mas quero crer que, se mudarmos nossas atitudes e tivermos mais compaixão, amor e união, certamente iremos escrever um enredo com mais luzes do que sombras, e, com boa vontade, poderemos contar com a possibilidade de acendermos uma vela para iluminar nossos caminhos e apaziguar as aflições de nossas almas.

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

*por Malco Camargos

Um partido político é uma associação de pessoas que busca na vida política institucional disputar o poder para legislar e implementar políticas públicas.

Participar de um partido político significa acatar determinadas idéias, se submeter a um estatuto e a um programa de intenções que deveriam ser implementadas.

Participar de um partido significa, também, ter acesso a recursos financeiros e de comunicação que são fundamentais nas disputas eleitorais.

Mais do que votar e ser votado(a). A participação política através deste canal se dá também com a frequência em reuniões, convencer pessoas a optar por determinado candidato, contribuir financeiramente para campanhas, arrecadar fundos e expressar sua opinião.

Partidos são úteis para se chegar ao poder e também para dar estabilidade ao jogo político depois das eleições, por isso se pressupõe certa fidelidade, reconhecida inclusive pelo Supremo Tribunal Federal.

Uma de nossas lideranças atuais tem uma carreira política bem diferente dos demais. Eleito por um partido insignificante à época, o PSL, Jair Bolsonaro tem algumas características bem atípicas. Além da ausência da compostura no exercício do cargo, Bolsonaro não tem vínculos partidários. O Presidente passou a maior parte do seu mandato sem estar filiado a um partido e, em sua trajetória política, já foi filiado a oito legendas diferentes.

Bolsonaro agora se filia à nona legenda e vai disputar as eleições de 2022 pelo Partido Liberal – PL. O partido é coordenado pelo ex-deputado Waldemar da Costa Neto, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 7 anos e 10 meses de prisão em 2012 pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Bolsonaro faz mais um acordo de curta duração, com interesses pouco republicanos e com uma enorme imprevisibilidade em relação ao seu comportamento futuro. Características estas que deveriam ser afastadas da política.

Porém, enquanto os partidos forem dirigidos como empresas, que buscam realizar operações superavitárias para seus participantes, o resultado será sempre este: baixa previsibilidade, baixa governabilidade, ausência de compromissos e lucro para alguns. Precisamos mudar essa história para que a boa política possa fazer valer a sua força.

*Malco Camargos é Doutor em Ciência Política, diretor do Instituto Ver Pesquisa e Estratégia e professor da PUC Minas. 

  Comentários
 

Na hora “H” me dá branco

por Convidado 10 de dezembro de 2021   Convidado

*por Sérgio Marchetti

Dia desses, mais um dos meus clientes me pediu para ajudá-lo a desenvolver o dom da resposta — que é, por assim dizer, a argumentação — fato corriqueiro na vida de um professor de oratória, mentor ou coach. Entretanto, percebi que meu orientado estava desorientado (desculpem-me pelo trocadilho, mas não resisti), e quando ponderou que as pessoas, de forma geral, levavam vantagem sobre ele em quaisquer discussões, compreendi que talvez pudesse abrandar seu sofrimento. Também me confidenciou que, depois das reuniões ou do momento do debate, algumas respostas ótimas surgiam em sua mente mas, na hora que precisava, era acometido por uma paralisia e não conseguia combater as objeções.

“Eu não tenho salvação”, disse-me desolado e com o semblante de quem só estava de corpo presente, porque o pensamento viajava por outras paragens. Fiquei observando sua ausência e esperando sua alma retornar. E quando acontecesse daríamos prosseguimento à conversa. Confesso que fiquei penalizado, embora não goste deste sentimento e já esteja vacinado contra ele. E, quando a alma de meu cliente pousou, pudemos resgatar nossa prosa e, assim, procurar uma solução para aquele caso. Obviamente que enveredamos por uma trilha psicológica para ir ao cerne do problema, antes de teorizarmos as técnicas.

Caros leitores que me leem de corpo e alma, alguns de vocês também já passaram por isso?  Saibam que o caso dele ocorre com muitas pessoas. O que difere é o indivíduo e como ele irá lidar com o problema.  A outra face da moeda é o tema. Caso seja político, eu diria que contra a ideologia não há argumentos, e fatos são chamados de teoria da conspiração. Então, discutir temas polêmicos, como religião, política e futebol é mera perda de tempo, pois, se fatos não dizem nada, não há argumento; o que impossibilita um diálogo saudável.

Calma, leitores ansiosos! Descontraiam os corpos, descruzem as pernas e os braços e deixem suas almas respirarem. Não as sufoquem tanto. Foi exatamente assim que falei para meu “desorientado”.  E completei: quando houver uma reunião, você deverá se informar sobre o assunto e se preparar com leis, normas, regulamentos e outros documentos. Uma pessoa informada vale por muitas. Identifique quem são os participantes, se os conhece e como costumam se comportar. Deixe que falem antes de você — se não for obrigado a ser o primeiro. Nesse caso, tendo que iniciar, procure ser objetivo e atenha-se ao assunto ou tema da reunião. Quando um dos participantes estiver mais agressivo, mantenha-se mais calmo, respire fundo e ouça até o final. Dê corda para que se enrole nela e perca a razão. Isso poupará seu trabalho. E não se esqueça de que a emoção tem funções maravilhosas e que seu fruto mais belo é a paixão mas, nessas horas, só atrapalha. O que lhe oferece argumento é a razão. E continuei minha orientação: faça objeções, questione aquilo que não for bem fundamentado, seja pragmático, contextualize, argumente com fatos e lógica. Experimente fazer associação de ideias, questionar as fontes e se utilize de estatísticas e informações disseminadas por veículos confiáveis.

E vocês? Como têm se comportado diante da necessidade de argumentar, explicar, ensinar?

Desejo que estejam se saindo bem. Mas, cuidado com o “eu não acredito nisso” (quando for fato), e com o “penso assim e ninguém me convence do contrário”, etc.

A filosofia do trabalho de comunicação e orientação é gerar opções e mostrar as fontes e não obrigar alguém a beber água. É bom saber que o que é melhor para mim, pode ser o pior para o outro. Enfim, a questão passa por uma substituição simples de verbo. Que tal trocar o impor pelo propor?

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

De volta ao trabalho

por Convidado 14 de novembro de 2021   Convidado

*por Sérgio Marchetti

Não imaginei que, nos dias atuais, estaria falando sobre a mesma pandemia. Porém, “o sentimento não para, a doença não sara” (MF). Viver se tornou chato e muitas pessoas, não suportando psicologicamente a tensão, sucumbiram diante de outras doenças, mesmo tendo passado imunes à Covid-19. A resiliência nunca foi tão essencial. O momento é de perseverança.

Provavelmente, meus bucólicos leitores, todos já foram a uma zona rural e tiveram a oportunidade de ver aves soltas no quintal. Na fazenda do meu avô havia uma horta de verduras e, a cada descuido, as galinhas saltavam a pequena cerca de tela e a invadiam. Sei que vocês estão pensando que gosto de galinhas. É verdade. Já usei as galinhas, recentemente, para outro exemplo. Mas continuando… Uma das minhas tias, mais atenta ao problema, gritava e espantava as galinhas de lá. Passado algum tempo, uma por uma, olhando de soslaio, com aquele sonzinho de Cóo… Cóo… e desconfiadas como nós mineiros, com passos lentos, voltavam e cometiam a mesma transgressão.

Por que as galinhas? A nossa realidade me remeteu a elas; para mim é uma imagem do que ocorre hoje. — O comércio vai abrir! — Os bares vão funcionar! —  As aulas vão voltar! Os treinamentos presenciais vão acontecer! E, assim como a galinhas, vamos voltando desconfiados, com receio de que nos espantem outra vez para longe de nossas fontes de alimentos. De repente, alguém então grita: — o Kalil vai fechar tudo!!!

O grito de terror gera a incerteza. O medo e a ameaça ligam nosso alarme cerebral e fazem derramar em nossas correntes sanguíneas a adrenalina e o cortisol. A tensão não acaba e, tampouco a mente identifica saídas para o problema. O estresse se aproveita de nós. Vem a tristeza, a impotência, e a depressão toma conta. As perdas são contabilizadas e, com toda certeza, muitas serão irrecuperáveis. Não há conquista nem realização. Não haverá dopamina, o neurotransmissor que reage às ações realizadas.  E nem a serotonina será derramada, pois não existe bem-estar numa situação como essa. Dá vontade de fugir. Mas “José, para onde”? (CDA)

Bem, aqui termina o capítulo da problemática e começa o da solucionática, como diz o Dadá Maravilha. A fuga não é a solução. Calma! Deus não está morto, como nos sugeriu Friedrich Nietzsche, o filósofo maluco.  Se estamos vivos, como Deus poderia não estar? Sempre defendi, leitores de boa memória, que a vida é sistêmica e que o contexto explica os efeitos e pode nos mostrar a causa e a solução. Nem sempre a saída é pela porta da frente. As respostas podem estar fora do quadrado. Estamos vivendo uma guerra e, de alguma forma, todos foram atingidos ou tiveram suas vidas alteradas pela maldita doença. Muitos reagiram bem. Alguns perderam tudo, inclusive a vida. Outros tentam se recuperar alterando ou buscando um novo trabalho. Estes últimos fazem parte do maior número dos clientes que oriento. Seja pela permanência do negócio ou pela mudança radical; o que tem sido muito recorrente é a pressa. E o que confirma esse senso de urgência são frases como — “tenho que aprender a trocar o pneu com o carro andando”. Sabe quando isso vai acontecer, meu visionário leitor?

A objetividade é positiva mas, o desespero, compreensível até certo ponto pela necessidade premente de recuperação, leva as pessoas a serem muito imediatistas. Querem tratar exclusivamente do pontual em detrimento do contexto. Confundem “o ter foco” com ignorar o todo e ainda usam a emoção para tomarem decisões.

Calma! “Gente! A vida não se resume a festivais”.

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

A economia e a realidade

por Convidado 16 de outubro de 2021   Convidado

*por Malco Camargos 

Uma frase que marcou para sempre o mundo das estratégias das campanhas eleitorais começa a soar cada vez mais alta aqui no Brasil. Em 1992, quando Jorge Bush destacava seus feitos em guerras internacionais e valorizava a soberania conquistada, Bill Clinton aumentava seu favoritismo à medida que os americanos avaliavam a crise econômica, o medo da inflação e a dificuldade de comprar imóveis. Nesse contexto o mote da eleição foi dado por James Carville, responsável pelo marketing na campanha de Clinton – “É a economia, estúpido”.

James Carville foi o criador da frase mas não foi responsável por mostrar o peso da economia na escolha dos eleitores. Diversos autores, em diferentes universidades no mundo, vêm comprovando e refinando a teoria do impacto da percepção da situação econômica sobre a decisão de voto. O cálculo é simples e pode ser resumido em uma única frase – se a economia vai bem o eleitor vota no candidato governista e se a economia vai mal, busca um nome na oposição.

Para falar de economia uma distinção básica deve ser feita – o que podemos entender por macroeconomia e microeconomia.  O cenário macroeconômico aborda questões da economia doméstica e internacional com ênfase nas perspectivas de crescimento, política monetária e fiscal – a macroeconomia mensura o desempenho da economia em um país, sua capacidade de produzir crescimento e sua política econômica internacional. Uma área valorizada por economistas e agentes econômicos e, em geral, relevada pelos cidadãos. Já a microeconomia vai ter foco no comportamento e nas escolhas das pessoas na economia e também na relação entre o capital e o trabalho que podem gerar diferenças salariais entre grupos da sociedade (homens e mulheres, brancos e negros, etc…) e as motivações das decisões dos consumidores.

Entre estes dois cenários, o macro e o micro, deve-se considerar também a percepção das pessoas. Nenhum indicador macroeconômico tem peso maior do que a constatação do desempenho econômico a partir da experiência do consumidor/cidadão/eleitor. É na hora de ir ao supermercado, à farmácia ou mesmo ao bar que o cidadão faz sua avaliação da economia; isto somado com a possibilidade ou não de sair para trabalhar e ter uma remuneração digna formam o pensamento econômico que vai moldar o voto do eleitor quando ele estiver em frente à urna. Nesse sentido, em algumas situações, economistas e alguns especialistas valorizam a ação de determinado governo na condução da política econômica, mas os cidadãos não percebem melhoria na sua qualidade de vida e optam por outra alternativa que não a recondução do grupo que governa ao poder.

No Brasil, em 2022, o presidente Bolsonaro vai tentar valorizar seus feitos econômicos: enxugamento da máquina, privatizações, distribuição de dividendos, balança comercial e busca da solidez nas contas públicas. Mas nada disso é mais significativo do que a sensação de que o salário conquistado – quando isso é possível – não dura até o final do mês para a maior parte dos brasileiros e que vários itens básicos não são incluídos na cesta de compras por falta de dinheiro.

Não há retórica econômica que mude a percepção de que Bolsonaro não produziu melhoras na vida dos brasileiros. À revelia do que dizem alguns economistas, nenhum indicador significa mais que a própria experiência diante de uma realidade cada vez mais dura para milhões de brasileiros. Realidade esta que faz com que o eleitor tenha saudade de um tempo em que podia viver bem o presente e sonhar com o futuro – duas coisas que lhe foram tiradas nos últimos tempos.

*Malco Camargos é Doutor em Ciência Política, diretor do Instituto Ver Pesquisa e Estratégia e professor da PUC Minas. 

  Comentários