A linguagem, o ovo e o caos

por Convidado 6 de junho de 2023   Convidado

por Sérgio Marchetti*

Outro dia, escrevi sobre a deficiência da nossa querida Língua Portuguesa. E sei que algumas pessoas disseram que falar certo é antiquado e nos torna pedantes.

Dias depois, numa aula, mencionei que estamos diante do caos, pois fomos surpreendidos por um furacão e, após sua passagem, tudo ficou invertido. Agora, o errado é que é o certo, inclusive na linguagem. Mas fui logo questionado por um aluno. Não perdi tempo. Prontamente, lancei mão da pesquisa no smartphone (significados.com.br) e li para ele: “caos significa desordem, confusão e tudo aquilo que está em desequilíbrio”. “Caos, na mitologia grega, seria o deus primordial do universo, de acordo com a narrativa do poeta grego Hesíodo. Interpretado como ‘vazio’ ou o ar que preenchia o espaço entre a terra e o Éter (céu superior)…”

O aluno, já angustiado com a demora de um minuto para explicar o caos, me interrompeu e disse que a Amazônia seria, então, um exemplo de caos, pois a cada dia identifica-se um vazio maior causado pelo desmatamento. E acrescentou que os governantes ficaram em silêncio diante dos índices de devastação da floresta que, em março deste ano, registraram o triplo da área do mesmo mês em 2022. Foram quase mil campos de futebol de vegetação nativa destruídos por dia.  Nesse fato estão presentes a desordem, o desequilíbrio, a hipocrisia e representa o caos.

Deixando a floresta de lado, e voltando à linguagem, outro aluno me disse que eu tinha razão, pois que o caos também se instaurou na comunicação. As palavras se desgastaram porque os atos são desproporcionais aos seus significados. E, desta vez, fui eu quem solicitou que exemplificasse.

— Claro, disse ele: — em todos os conceitos, a palavra democracia significa “garantia de liberdade individual; liberdade de opinião e expressão; liberdade de eleger seus representantes, independentemente do regime político (presidencialista, parlamentarista, etc.)”.  Essa é a nossa realidade?

—Infelizmente, entre a Constituição Federal e as ações das autoridades há uma lacuna maior do que a devastação da Amazônia — finalizei.

Mas, caros leitores, para fugir da polêmica, e exemplificar minha tese, quero lembra-lhes do ovo de Colombo. Ele também deu um “Tomé” no povo. Creio que todos conheçam sua história. Rapidamente: o rei daquela época ofereceu uma quantia significativa para quem conseguisse pôr o ovo em pé. Nenhum candidato havia conseguido, até que chegou a vez de Colombo. Aquele, velhaco e experiente, bateu o ovo na mesa, quebrou a ponta e o deixou de pé. Muitos participantes reclamaram, mas Colombo levou o prêmio.

Ainda sobre o ovo (o da galinha), há pouco tempo não podia ser consumido mais de duas vezes por semana, pois faria aumentar o colesterol. Agora, tem atleta comendo dez ovos por dia porque faz bem para a saúde. Vocês devem estar se perguntando o que tem a ver o ovo com as calças, digo com o tema?

Estou apenas querendo fazer uma analogia entre o uso do ovo e da palavra democracia. É que as coisas mudam de acordo coma interpretação, conveniência e os interesses escusos de alguns. Inclusive e, lamentavelmente, da mídia. E isso sim pode ser o caos.

 

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br

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Curtas e Curtinhas

por Luis Borges 31 de maio de 2023   Curtas e curtinhas

Bulas de medicamentos só no QR Code?

A bula é um impresso que acompanha um medicamento e contém informações sobre a sua composição, utilidade, posologias e as suas contraindicações, segundo o dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa. Agora a indústria farmacêutica quer propor à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa a substituição da bula impressa pela leitura no QR Code. A justificativa está na sustentabilidade ambiental e na economia de papel e demais insumos gastos na impressão, além de proporcionar a ampliação da quantidade de informações à disposição do consumidor.

Se a proposta for aprovada, será que aumentará o número de leitores de bulas de medicamentos? Aumentará a quantidade de vendas de dispositivos tecnológicos – celular para dar acesso a bula digital?

A conferir.

É popular um carro com preço de R$ 60.000,00?

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços – MDIC anunciou no dia da indústria (26 de maio) algumas medidas para reduzir os preços dos automóveis que estão na faixa de R$ 69.000,00 a R$ 120.000,00. A redução variará de 10,79% a 1,5% com incidência no Imposto sobre produtos industrializados – IPI, Programa de integração social – PIS e a Contribuição para o financiamento da seguridade social – Cofins. Assim, o carro popular mais barato, que terá o maior desconto, custará em torno de R$ 60.000.

Será esse preço compatível com os baixos salários recebidos pela maioria da população economicamente ativa? Qual será a taxa de juros para a compra financiada? Onde o Governo Federal vai encontrar recursos financeiros para compensar a redução dos tributos prometidos?

Pelo visto até agora, tudo vai ser bom para a indústria automobilística, que precisa desovar os estoques de suas unidades e não terão nenhum compromisso com o aumento de contratação de mão de obra ou substituição de combustíveis fosseis. Também vale lembrar que esse programa é temporário e poderá vigorar de 1 a 2 anos. Até meados de junho deverão ser divulgadas todas as regras nesse programa do novo carro popular.

As dívidas dos pequenos negócios

A segunda pesquisa Pulso dos Pequenos Negócios, feita por uma parceria do Sebrae com o IBGE, na última semana de janeiro mostrou que seis em cada dez microempresários afirmam que empenham mais de 30% das receitas com despesas financeiras. Já os pequenos e médios empresários informaram que operam com 30% de seu caixa comprometido para pagar dívidas ou juros por causa de prestações atrasadas.

Nesse cenário, muitos proprietários de pequenos negócios estão fugindo de empréstimos bancários, conforme disseram 73% dos entrevistados na pesquisa. Mas os bancos também estão deixando de emprestar dinheiro por causa da inadimplência. O levantamento mostrou que apenas quatro em cada dez pequenos empresários conseguiram aprovação para novos empréstimos solicitados.

Como sabemos, a maioria das empresas brasileiras são de micro, pequeno e médio portes e também são as que mais geram trabalho. É claro que elas precisam de planejamento, orçamento e gestão permanente em seus negócios para se manter nesse mercado cada vez mais desafiador.

É a dor e a delícia para quem quer ter o próprio negócio!

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Curtas e Curtinhas

por Luis Borges 23 de maio de 2023   Curtas e curtinhas

Unimed-Rio é líder no Índice Geral de Reclamações da ANS 

A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS divulgou a lista dos planos de saúde pior avaliados em seu Índice Geral de Reclamações – IGR do mês de abril/2023. A Unimed-Rio, cooperativa de trabalho médico, lidera o ranking pelo sexto mês consecutivo. Em 2º lugar está a Associação de Beneficência e Filantropia São Cristovão, em 3º a Notre Dame Intermédica e em 4º o Bradesco Saúde. Esses dois últimos possuem o dobro de clientes da Unimed-Rio.

Enquanto as reclamações não param de chegar a ANS, os clientes prosseguem inquietos na expectativa do aumento dos preços dos planos de saúde, previsto para ser divulgado em junho. Quantos e quais mesmo assim prosseguirão diante da crescente perda do poder aquisitivo?

Viva o SUS!

Como ficarão os preços da gasolina, óleo diesel e gás de cozinha a partir de junho? 

A Petrobras modificou a sua política de preços dos combustíveis, no início da segunda quinzena de maio, e eles começaram a cair um pouco. Por outro lado, a partir de junho será concluída a reoneração com o acréscimo da segunda metade do ICMS, que voltou a ser cobrado a partir de março pelos estados. Em julho, será retomada a cobrança do PIS/Cofins, que é um tributo Federal. Vale lembrar, ano passado houve deflação nos meses de julho, agosto e setembro após a desoneração dos impostos no período eleitoral. As projeções do Boletim Focus do Banco Central mostram que a inflação medida pelo IPCA do IBGE ficará em torno de 6% nesse ano, bem distante da meta de 3,25%.

Subsídio municipal para o transporte coletivo por ônibus em Belo Horizonte  

Desde o dia 23 de abril está em vigor o aumento de 33% nos preços das passagens para o transporte coletivo por ônibus em Belo Horizonte. A passagem mais usada passou de R$4,50 para R$6,00, enquanto o sindicato das empresas concessionárias dos serviços queriam R$6,90. Após muitas discussões entre a Prefeitura Municipal, a Câmara de Vereadores e o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte – SetraBH, chegou-se a uma proposta de subsídios municipais no valor de R$ 512 milhões na reunião no dia 18 de maio, para que voltem a vigorar os preços anteriores.

Durante as negociações os empresários do setor propuseram que o subsídio fosse de R$ 740 milhões. Esse valor foi descartado pela Prefeitura e Câmara de Vereadores por falta de comprovação de sua necessidade. Para terem direito ao subsídio, as empresas concessionárias deveram atender aos requisitos de manutenção, limpeza e funcionamento do ar condicionado dentre outros, além de aumento de 10% na quilometragem rodada e colocar em operação 420 novos ônibus.

Enquanto a tramitação dessa proposta prossegue na Câmara de vereadores, a população continua padecendo com os novos preços que entraram em vigor há 1 mês. Cada dia com a sua agonia!

Câmara de Belo Horizonte terá mais 2 vereadores 

A população de Belo Horizonte elegerá, em outubro de 2024, mais 2 vereadores para a Câmara Municipal, que assim passará a ter 43 membros. O aumento foi aprovado por 40 dos atuais 41 vereadores – o presidente da Câmara não votou. Em função do que determina a lei, os municípios com população entre 2,4 e 3 milhões de habitantes podem ter no máximo 43 vereadores e, como atualmente Belo Horizonte tem 2,55 milhões, ficou óbvia a opção dos Edis pelo número máximo permitido.

O salário pago aos vereadores tem o nome de subsídio, conforme definido pela Constituição Federal.  O subsídio pago ao vereador é definido ao final de cada legislatura, com efeito para os quatro anos subsequentes. Na atual legislatura os vereadores recebem um subsídio mensal de R$ 18.402,02. Aos 41 vereadores é facultado contratar até 15 assessores parlamentares para apoio ao desenvolvimento de atividades institucionais e de mandato, além de um atendente parlamentar, um auxiliar legislativo e um chefe de gabinete parlamentar, totalizando, no máximo, 18 servidores contratados em cada gabinete.

Como se vê, poderemos ter até 38 novas ocupações diretas no mercado de trabalho, todas em prol da representação do povo de Belo Horizonte. Recursos financeiros ainda não faltam!

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Curtas e Curtinhas

por Luis Borges 16 de maio de 2023   Curtas e curtinhas

Transferências financeiras da União e Estados para os municípios

A Confederação Nacional dos Municípios – CNM publicou em seu portal os valores dos recursos financeiros repassados obrigatoriamente pela União (Governo Federal) e pelos Estados para os 5.570 municípios brasileiros. Se olharmos as transferências feitas para o município de Araxá no 1º quadrimestre desse ano, veremos que houve uma queda em relação ao mesmo período do ano passado.

Por exemplo, a Compensação Financeira pela Exploração Mineral – CFEM gerou R$ 1,701 milhão ante R$ 2,678 milhões no ano passado. Por outro lado, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica – Fundeb gerou R$ 21,807 milhões no quadrimestre perante R$23,237 milhões no mesmo período do ano anterior, enquanto o Fundo de Participação dos Municípios – FPM transferiu R$ 28,391 milhões no período ante R$ 25,805 milhões no ano passado. Já o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS trouxe receitas obrigatórias de R$ 63,077 milhões nesses 4 meses diante dos R$ 84,490 milhões do mesmo período do ano passado.

Essas 4 modalidades de transferências representam 99% do total recebido pelo município de Araxá no período e somaram R$ 114,978 milhões em 2023 e R$ 136,212 em 2022. Portanto, o município recebeu menos R$ 21,234 milhões na comparação do 1º quadrimestre desse ano com o igual período do ano passado. Sabemos que as despesas crescem, mas será que a arrecadação conseguirá acompanhar o ritmo na gestão do orçamento R$ 720 milhões no ano de 2023?

Abstenção em torno de 48% dos candidatos no último concurso do Banco do Brasil

No dia 23 de abril foi realizado um concurso para o preenchimento de 4.299 vagas no país inteiro, das quais 2.149 são para agente comercial – escriturário e 2.150 para agente de tecnologia – escriturário.

O salário inicial é de R$ 3.622,23 por uma jornada de 30 horas semanais, além de auxílio de R$ 1.014,42 para alimentação ou refeição, cesta-alimentação de R$ 799,38, auxílio-creche, participação nos lucros ou resultados, previdência complementar, plano de saúde, plano odontológico, auxílio a filho com deficiência e acesso a programas de educação e capacitação.

Aproximadamente 1,5 milhão de candidatos se inscreveram para o concurso, mas pouco mais de 700 mil não compareceram para fazer a prova o que significou uma abstenção em torno de 48%.

Vale lembrar que existem 9,2 milhões de desempregados no Brasil e cerca de 4,6 milhões de desalentados, desistiram de procurar trabalho, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD Contínua do IBGE no trimestre de janeiro a março deste ano.

Renda continua altamente concentrada

Termina no dia 31 de maio o prazo para a entrega da Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física. Enquanto isso, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil – Unafisco divulgou dados consolidados das declarações do ano passado mostrando a concentração da renda no topo da pirâmide salarial do país. O levantamento indica que o grupo de pessoas mais ricas do país, cerca de 1% da população, informou que recebeu salários mensais de ao menos R$ 26 mil e tem patrimônio superior a R$ 1 milhão, em média.

No topo dessa pirâmide estão 0,13% das pessoas, que declararam renda mensal acima de R$ 400 mil e bens no valor médio de R$ 78 milhões. Isso é o que demostrou o Unafisco. O restante fica por conta dos outros 99% que são obrigados a fazer a declaração.

É o que temos para o momento.

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Oi, oia o trem

por Convidado 8 de maio de 2023   Convidado

por Sérgio Marchetti*

Vem surgindo de trás da fumaça azul. “Oi, oia o trem”, vem fazendo um barulho estrondoso. E atrapalha meu sono, pois a casa em que habito está logo acima da estação — da linda estação, tão judiada pelo tempo, pela chuva, pelo sol e pelo descaso das pessoas que não têm sensibilidade para compreender o valor da memória. E, estou certo de que não sabem que “ A plataforma dessa estação/ É a vida desse meu lugar/ É a vida desse meu lugar/ É a vida…”

Na minha Barbacena amada e desleixada, vejo com tristeza, “da janela lateral do quarto de dormir”, nossas montanhas indo embora. Conto até cem vagões. Depois, desisto de contar. A tristeza me impede de continuar assistindo ao dolorido desfecho de uma ganância sem fim. E, para tão desumana tarefa, incumbiram locomotivas cruéis, se assim posso chamá-las, pois não têm doçura, beleza, bucolismo, e nem mais o piuííí! piuííí! saudoso da Maria-Fumaça. Ao contrário, elas vêm fazendo barulho e demonstrando todo o seu poder. Ferozes, informam com seus apitos ensurdecedores que nada impedirá sua missão, e que irão atropelar quem se arriscar a passar na sua frente. E o trem — fantasia da minha infância —  em sua trajetória, mais parece uma jiboia gigantesca engolindo montanhas e destruindo a natureza. Os vagões, sem vida, cumprem os comandos das perversas máquinas que os escravizam e os puxam num som torturante e ritmado, como se houvesse um metrônomo seguido de uma marcha fúnebre. Assim, acorrentados e engatados, seguem o cortejo levando histórias transformadas em partículas de minério que um dia, em seu esplendor, serviram de palco para fazendas, bosques e histórias de famílias, de um tempo em que nossos trens tinham funções mais nobres de levar e trazer pessoas. “Todos os dias é um vai e vem/ A vida se repete na estação…” ou se repetia, como escreveram Milton e Brant.

 

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br

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Nascimento e Finitude

por Luis Borges 3 de maio de 2023   Pensata

Nasceu Helena no dia 25 de abril. Nesse mesmo dia, há 49 anos, aconteceu a Revolução dos Cravos em Portugal. Primeira filha de Lolô e Pedro, talvez a única para tempos como esses, é neta de Dizinha São José, dos Campos, lá no Estado de São Paulo. Enquanto escrevo ela já está no quarto dia após a luz. Por outro lado, eu que acompanhei a gravidez pelos informativos da avó materna, prima permanentemente querida, fiquei pensando também no fim do caminho, na finitude da vida, na luz que se encerra.

Simultaneamente, um turbilhão de coisas que precisam ser feitas vieram à tona como que a desafiar a gestão do tempo que segue passando. Aliás, tempo que corre como a água do rio ainda perene, mas que não voltará atrás. Se o que passou, passou mesmo, o que ainda falta exige priorização diante do bem cada vez mais escasso que é o próprio tempo. Obviamente que a ausência de critérios não pode ser o critério para definir prioridades. E se, por exemplo, a amplitude for reduzida com a antecipação da finitude diante de uma surpreendente, mas probabilística parada cardiorrespiratória?

A força cortante simplesmente corta e marca o fim de uma caminhada e simultaneamente acontece a passagem para outro plano, com ou sem velório do corpo inerte à espera de uma destinação. Pensando assim percebo como é difícil não só pensar sobre isso, com os próprios botões pensantes, ou mesmo conversar com outras pessoas sobre a finitude e a hora em que ela se dará e com qual nível de qualidade ainda estaremos vivendo. Muitas das vezes a conversa até se inicia, ganha alguns degraus na imaginação de possibilidades e, de repente, alguém sugere que se mude de assunto, pois pensar nisso dá até medo. E não é que o assunto é mudado mesmo!

Talvez alguns dos caros leitores estejam se perguntando por que estou abordando esse assunto agora. Provavelmente alguns até me perguntarão se estou deprimido ou preocupado por estar caminhando para o fim da década da idade marcada pelos anos que começam com 60. Digo com clareza que nenhuma das hipóteses é verdadeira. Meu ponto é provocar, estimular conversas, diálogos e percepções em torno da finitude da vida, inclusive nos encontros presenciais que às vezes até acontecem. Isso muitas vezes nos surpreende, mostrando o despreparo que temos para encarar de frente a realidade como ela se mostra. Que, pelo menos, não sejamos tão surpreendidos diante da sucessão de acontecimentos em variadas velocidades.

Tudo passa também pelo realismo diante das probabilidades sobre o que o futuro poderia vir a ser para nós todos, aí incluídos você e eu.

Mas de nada adiantará as expectativas pelo avanço das pesquisas sobre as células tronco ou da maciça presença da inteligência artificial na transformação digital do modo de ser de cada um de nós.

A finitude da vida é real, pelo menos como a conhecemos. Devemos pensar e agir também em função das variáveis dela advindas.

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Aplicando o senso da utilização

por Luis Borges 25 de abril de 2023   Pensata

No Brasil da década de 90, do século passado, estava em evidência no mundo dos negócios a implantação e implementação da Gestão pela Qualidade Total-GQT, ou seja, para todos os evolvidos nos processos.

Uma pergunta que sempre surgia era sobre como começar. Em muitos casos, tudo acontecia a partir do Programa 5S, com os sensos de utilização, arrumação (ordenação), limpeza, saúde e autodisciplina.

O primeiro senso, o da utilização, nos ensina a selecionar os bens que são usados com mais frequência e que, portanto, devem estar mais próximos. Por outro lado, os bens que não são mais usados e ficam ocupando espaço podem ser doados para quem esteja precisando ou simplesmente descartados num local apropriado. É uma forma de combater o desperdício e remover a energia parada no ambiente.

Isso que é proposto para o mundo dos negócios pode também ser aplicado no cotidiano de nossas residências. Afinal de contas, tudo começa com a gente.

Vou contar aqui um caso que envolve a prática do senso da utilização, inclusive para contrapor a acumulação crescente de bens e a necessidade de se encarar o desapego daquilo que não é mais útil. Muita gente guarda bens em casa na expectativa de que poderá precisar deles um dia, que geralmente quase nunca chega.

Uma advogada de 50 anos, casada, sem filhos, decidiu se mudar do apartamento em que mora há 15 anos. Aproveitou a ocasião para colocar em prática o senso da utilização e abriu mão de alguns móveis e artigos de decoração que não se adequariam no novo apartamento.

No caso das luminárias da sala conjugada com a copa, o interesse espontâneo da então vizinha de apartamento, esteticista, síndica do prédio, 45 anos, casada, duas filhas, facilitou a destinação dos bens.

Quase que imediatamente a síndica providenciou a desmontagem das luminárias e, agradecida, enfatizou que chegaram em boa hora.

A advogada mudou-se do prédio no sábado da mesma semana em que doou as luminárias. Mas logo na manhã da segunda-feira seguinte ela recebeu um telefonema da já ex-vizinha perguntando pela nota fiscal emitida quando da compra das luminárias. A advogada quis entender o porquê. A resposta foi imediata e justificadora. Disse que, mesmo tendo gostado muito das luminárias, resolveu vendê-las para sua irmã e queria ter uma base para estabelecer o preço de venda e as condições de pagamento. Aproveitou também para reclamar da falta de um pequeno componente numa das luminárias, o que poderia desvaloriza-la um pouco.

A advogada lamentou não ter condições de atender a ex-vizinha e despediu-se dela cordialmente, como é da sua natureza. Porém seguiu pensando na Lei de Murici, que preconiza que “cada um cuida de si”. E assim a humanidade prossegue em sua caminhada

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