O primeiro ano na aposentadoria

por Luis Borges 27 de julho de 2016   Pensata

A aposentadoria é um sonho cercado de expectativas, ainda mais na atual conjuntura brasileira em que o assunto “reforma da previdência” para os trabalhadores do setor privado aparece dia sim, dia não nos jornais. De alguma maneira pode até sobrar para os trabalhadores do serviço público…

Mas qual é a percepção que as pessoas têm após se concretizar a tão sonhada aposentadoria, seja ela no mundo público ou privado? Vou contar aqui o caso de um amigo com o qual conversei no último fim de semana. Ele completava exatamente um ano na condição de trabalhador aposentado. Engenheiro metalurgista, hoje com 61 anos de idade, ele deu o seu melhor para a indústria desde a tenra idade de recém-formado.

Ao relembrar seu processo, o amigo enfatizou que tudo foi planejado, inclusive a previdência complementar. O desejo era iniciar o ciclo idoso da vida na condição de aposentado, cumprindo a idade mínima prevista em lei para alguém ser considerado idoso. Segundo ele os 3 primeiros meses se passaram como se fosse um período de férias, algo como “férias prêmio”.

aposentadoria cadeiras pessoas lendo jardim

A aposentadoria pode ser o momento de fazer aquela viagem tão sonhada, aproveitando o tempo livre para simplesmente não fazer nada. Foto: Jardin des Tuileries, Paris. / Marina Borges

Foi grande o sentimento de liberdade. Nada dos horários rígidos da indústria. Adeus à logística desgastante de deslocamentos entre os extremos da cidade. Logo ele percebeu que os outros membros da família – sua esposa, professora municipal aposentada, um filho canguru (não quer sair de casa) e uma filha descasada que voltou para casa lhe trazendo um neto – também tinham suas agendas específicas. A partir dessa percepção, meu amigo começou a planejar minimamente os dias úteis, tendo como referência os horários de café da manhã, almoço e jantar.

E assim os nove meses seguintes se passaram, embalados pela vontade férrea de não fazer nenhum trabalho profissionalmente e com muita flexibilidade para definir o que fazer relaxadamente. O nível de leitura aumentou, bem como o tempo dedicado à música e à soneca após o almoço. Não foi muito difícil ficar um pouco gordinho, o que acabou reforçando a necessidade de reservar uma hora pela manhã para fazer caminhadas. Mais recentemente surgiu espaço para duas sessões de pilates por semana, no final da tarde. Sobrou também mais tempo para algumas idas a médicos especialistas, ao dentista e até ao salão do barbeiro.

No plano familiar aumentou bastante o convívio com os entes queridos, em função do maior tempo de permanência em casa. Isso gerou também um índice maior de conflitos devido à sua eterna desorganização e a alguns hábitos arraigados como os de acompanhar tudo sobre futebol masculino, Fórmula 1 e política partidária.

O amigo encerrou a breve conversa falando de suas preocupações com a perda do poder aquisitivo em função da inflação, inclusive a específica que atinge os idosos, e a não correção plena do valor da aposentadoria. Ele ficou de contar numa próxima conversa algumas de suas percepções sobre o lado oculto da aposentadoria, que envolve perda de sono no meio da madrugada, preocupações com o futuro do neto, o uso de alguns medicamentos e o temor de um dia ter de morar numa instituição de longa permanência para idosos.

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