O caso de Mariana à luz da gestão

por Luis Borges 25 de novembro de 2015   Gestão em pauta

Já são passados 20 dias da ruptura de uma barragem de rejeitos da Samarco Mineração, empresa controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, em Mariana (MG). As tragédias social, ambiental, tecnológica e econômica, dentre outras dimensões, prosseguem estampadas em diversas mídias.

Se considerarmos um conceito bem simples sobre o que é um sistema, podemos defini-lo como um conjunto de partes interligadas. Mais uma vez, ainda poderemos aprender com as lições trazidas pela tragédia apesar do alto custo desse aprendizado.

Em função das informações já disponíveis, que observações podemos fazer em relação ao sistema de gestão do negócio usado por todas as partes envolvidas e interessadas em seu resultado? Fazendo uma análise crítica fica visível que muitos fundamentos da gestão estão presentes apenas na intenção, mas não são acompanhados da necessária intensidade dos gestos. Neste texto, a proposta é tirar lições desse caso para as demais organizações.

Imagem de satélite mostrando a área atingida pela lama em Mariana. / Foto:  Globalgeo Geotecnologias, retirada do portal G1

Imagem de satélite mostrando a área atingida pela lama em Mariana. / Foto: Globalgeo Geotecnologias, retirada do portal G1

Plano de ação

O caso de Mariana evidencia desleixo na preparação e na execução do plano de ação para desastres. Nesta matéria da Folha, por exemplo, mostra-se o “jogo de empurra” entre governo federal e estadual. Afinal, quem aprovou o documento, que não previa uma estratégia para avisar os moradores da região em caso de rompimento da barragem? Na terça, o jornal Estado de Minas afirmou que um plano de ação contratado pela Samarco há anos nunca foi posto em prática, por razões econômicas. A empresa contratada à época diz ter feito um planejamento extenso, prevendo proteção à comunidade e aos funcionários, mas disse que ele não saiu do papel.

Um plano de ação é o caminho usado para se atingir uma meta. Ele mostra o que vai ser feito, como vai ser feito, a qual custo, quem será o responsável pela ação e em que prazo tudo deverá ser feito. Portanto, se não houver esforço e transpiração, o plano será estéril, não permitirá que se chegue ao resultado esperado.

Responsabilidades

A Organização das Nações Unidas (ONU) cobrou publicamente governo e empresa pelas falhas na condução do caso. Criticou as medidas insuficientes e a demora na ação, evidenciando a inaptidão das partes para tomarem para si as responsabilidades.

Por que as pessoas que possuem atribuições em função das partes que representam, tais como poder público, investidores, clientes, fornecedores… não cumprem na íntegra os seus papéis? Por que faltam o querer, a vontade de fazer acontecer, a cooperação nos processos de trabalho e o assumir explícito da responsabilidade de cada pessoa e sua respectiva organização?

Creio que falta a presença firme dos líderes e também a cobrança dos resultados das ações ao longo da hierarquia presente na estrutura organizacional. Cada instância deve cumprir de maneira integrada o seu papel e, para isso, é preciso querer, ter vontade política e encarar todos os riscos decorrentes do seu exercício. Os atos e as omissões têm que ter consequências mas, se isso não acontece e predomina a complacência entre as partes, fica claro que ainda estamos longe da excelência que um sistema de gestão integrado pode ajudar a alcançar.

Dilma Rousseff e Fernando Pimentel durante sobrevoo das áreas atingidas pelo rompimento da barragem em Mariana. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Dilma Rousseff e Fernando Pimentel durante sobrevoo das áreas atingidas pelo rompimento da barragem em Mariana. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Cumprimento da legislação

Nesse caso específico, fica evidente que a lei que trata da segurança de barragens não foi cumprida em sua plenitude. Também é visível que quem tem a missão de verificar seu cumprimento também teve seus momentos de inércia e negligência. Basta verificar o que fizeram – ou deixaram de fazer – antes da tragédia a própria empresa, os órgãos fiscalizadores de município, estado e União, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), o Ministério Público entre outros.

As normas e leis fazem parte do ambiente de negócios e devem ser levadas em conta. Ninguém está isento de suas responsabilidades ou das consequências em caso de descumprimento das regras. Todo empreendimento tem uma responsabilidade social e não cabe omissão.  

Como prosseguir?

A lição que fica é que ainda faltam disciplina, constância de propósitos e  líderes para praticar efetivamente o que sistemas, métodos, normas e leis determinam, apesar dos inúmeros interesses das partes envolvidas que sempre estão em jogo. Os fatos e os dados estão aí sendo escancarados e a nos mostrar que o escondidinho, a omissão e a resistência à transparência vão ficando cada vez mais insustentáveis.

Querer trabalhar com método e saber que as organizações são feitas por pessoas que cumprem papéis ligados aos diversos interessados são necessidades que jamais poderiam ou podem ser ignoradas. Estamos na era do conhecimento e, se o plano proposto para uma ação orientada não for colocado em prática, com certeza ele será estéril, não dará resultados e deixará evidente que foi apenas uma carta de intenções. A prática é um dos critérios da verdade.

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