Reforma ou remendo na Previdência?

por Luis Borges 3 de junho de 2016   Gestão em pauta

Há pelo menos 30 anos ouço falar em reforma da Previdência Social enquanto entra e sai governo. Se reforma pode significar a reorganização de um sistema, o remendo apenas substitui uma pequena parte que já não funciona a contento. Alguns governantes tiveram até dois mandatos consecutivos, que resultaram em pequenos remendos e muitas bravatas, num jogo mais de cenas do que de vontade de mudar alguma coisa para melhor. Basta a lembrança do fator previdenciário, que reduz a remuneração de quem se aposenta em torno dos 50 anos de idade mesmo tendo atingido o tempo de contribuição por ter começado a pagar lá pelos 15 ou 16 anos de idade.

Mas por que a reforma da Previdência Social incomoda tanto a todos nós? Está em nossa cultura o desejo de parar de trabalhar profissionalmente o mais cedo possível e com a garantia de receber proventos que nos assegure a continuidade da vida no ócio com dignidade até o dia em que os olhos se fecharem definitivamente. Mas o que pesa tanto para o equilíbrio e a sustentabilidade da Previdência Social nos setores privado e público?

No caso do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), que se aplica aos trabalhadores da iniciativa privada, é importante enumerar alguns aspectos marcantes que o evolvem. Sempre se fala aos quatro ventos que “existe um déficit anual crescente em suas contas”, mas ninguém se lembra de apontar que em 1988 a Constituição Brasileira determinou a incorporação de 5 milhões de trabalhadores rurais na condição de aposentados. A condição era que o Tesouro Nacional repassaria ao INSS o valor gasto com os pagamentos, mas isso já deixou de ser feito há décadas. Em 2015 o RGPS teve um resultado negativo de R$85,8 bilhões em função do superávit de R$5,1 bilhões da previdência urbana e do déficit de R$91 bilhões da previdência rural. A contribuição urbana representa 98% e a rural 2% Como falta transparência e a gestão é frágil, sobram informações incorretas, manipulação de dados, fraudes, roubos e desperdícios. Não dá para esquecer que a recessão econômica e 11,5 milhões de desempregados impactam e contribuem para reduzir a arrecadação, bem como a desoneração da folha de pagamentos salariais das empresas. Também é importante lembrar que a taxa de fecundidade já chegou a 1,7 filhos por mulher e a expectativa média de vida já se aproxima dos 75 anos.

Sendo assim, vale discutir de maneira racional, sem manipulações governamentais, sindicais – de empregados e empregadores – e de partidos políticos as várias variáveis que interferem no modelo e na gestão do RGPS, tais como idade mínima para se aposentar, tempo e teto máximo de contribuição, fontes de financiamento, auditorias e transparência para permitir o acesso a todas as informações.

Espera-se que dessa grande discussão não prevaleçam propostas que só transfiram para os trabalhadores todos os ônus de uma reforma que reequilibre o sistema, enquanto o Estado e seus governantes de cada momento poderão fingir que a solução não passa por eles.

Enquanto isso, um grupo de trabalho foi criado em Brasília para apresentar uma proposta de reforma em 30 dias para posterior discussão no Congresso Nacional. Esse tempo já está quase acabando, mas a discussão será muito desgastante e penosa devido aos interesses em disputa no jogo. É claro, e também se espera, que o Regime Próprio da Previdência Social que se aplica aos servidores públicos federais, estaduais e municipais dos três poderes também faça parte dessa discussão, que deve apresentar uma solução integrada para toda a Previdência Social – para o serviço público e o serviço privado – , seja ele na cidade ou no campo.

Até lá, a corrida para a aposentadoria só tem aumentado, em função daqueles que querem assegurar os direitos adquiridos em vigor sem ter que se submeter a possíveis regras de transição.

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