Adormeceu

por Convidado 19 de janeiro de 2015   Convidado

por Sérgio Verteiro

Era pra ter sido o mais feliz de todos os Natais. O dia, porém, amanheceu sombrio, trazendo com ele algumas incertezas. Ainda bem cedinho quando alguns já estavam acordados, a despedida, o pedido de um abraço. Dentro daquele abraço cabia o mundo! E também o consolo e a força necessários para prosseguir caminhando, ainda que fosse difícil. O alvoroço que me despertara permitiu apenas um olhar. Um olhar singelo, um olhar de afago e ternura. Era a última vez que via a cor de seus olhos antes que adormecestes.

Mãe

Com o passar do tempo, um telefonema. Todos a postos ouvimos a notícia de que, segundo o médico, as chances eram mínimas. Entre pedidos de orações, preces e intercessão, a agonia às vezes me consumia. Era um choro calado, um sofrimento reprimido e uma vontade muito grande que seu despertar perdurasse ainda por mais algum tempo.

Buscávamos recursos e soluções mais concretas para que seu sono não viesse tão depressa. Saímos de casa às pressas, tínhamos ainda muitas esperanças de que o impossível também acontecesse, mas que prevalecesse a vontade de Deus e não a nossa. O carro, o vento, os pensamentos e o tempo nos levaram a um lugar descolorido, uma paisagem um tanto quanto triste, um morro, o meu calvário.

Adormeceu, descansou, partiu. Foi pra mais perto de Deus suplicar por seus queridos filhos, afilhados e amigos. Infelizmente não cheguei a tempo do último adeus, mas ainda pude abraçar seu corpo sem vida e derramar lágrimas de gratidão por ter sido pra mim o tesouro mais precioso nessa terra.

Ela que me ensinou a amar, ensinou a rezar, ensinou cantando a canção de Padre Alessandro que, sem Jesus, sem Deus no coração nós não somos nada. Deu educação, ensinou valores e por onde andava deixava um legado – o mais importante era seguir o caminho do bem. Sua devoção a Nossa Senhora fazia delas amigas íntimas. Até parece que foi Nossa Senhora quem a veio buscar. Seu rosto era sereno, calmo e tranquilo. Um sorriso alegre que não escondia a satisfação de uma boa companhia e de uma bela passagem.

Eu não vi as luzes de Natal, nem o presépio, nem estrelas e, pra ser bem sincero, muito menos o luar. Ali, na sala de estar, diante dos meus olhos, apenas seu corpo sem vida, rodeado por seus filhos.

Enfim a noite passou. A manhã chegou trazendo com ela os amigos que prestariam suas últimas homenagens e adeus. A tarde vinha chegando e junto com ela o momento em que pra sempre nos despediríamos de sua última imagem. Era chegada a hora de cumprir também seu último desejo. Que seu corpo fosse depositado junto ao de seus pais. Saiu-se então o cortejo, flores eu espalhei pelo caminho e um galho de rosas singelas coloquei em suas mãos para sentires o perfume de Deus, de sua mãe querida Nossa Senhora. Uma oração, uma encomendação e uma procissão e lá se encerrara. Estava consumado seu ultimo pedido.

Estava ali enterrado o meu tesouro que batera asas e me fizestes erguer a cabeça me confirmando que ali apenas a matéria, mas no céu o Espírito que se encontra junto de Deus. E como dissestes à sua própria netinha, com quem passara seus últimos momentos, ”quando sentir saudades da vovó e só olhar pro céu e ver que ela é a estrela mais brilhante da galáxia”.

Screenshot_2015-01-16-10-00-48

Agradeço de coração a todos que se solidarizaram comigo neste momento. Muito obrigado mesmo. As orações de todos valeram muito. E continuam valendo. Peço que continuem rezando por mim e por minha família. Suplicarei sempre a Deus Pai que derrame a porção necessária do Espírito Santo na vida de cada um de vocês.

Sérgio Verteiro, 33 anos, é Gestor de Recursos Humanos.

  Comentário

Publicado por

Publicado em