No anonimato de tragédias caseiras

por Luis Borges 26 de fevereiro de 2019   Pensata

Passados 30 dias da tragédia causada pela ruptura da barragem de rejeitos da mina de Córrego do Feijão, pertencente à Vale no município de Brumadinho-MG, vão ficando claras as causas que geraram o acontecimento e as trágicas consequências para as pessoas que agora lutam para sobreviver numa correlação de forças muito desfavorável. Tudo nos choca, assusta e revolta quando nos colocamos no lugar das vítimas diretas no estrago enorme deixado para a comunidade e a natureza.

Partindo dessa percepção meu ponto aqui é propor uma observação e análise sobre as condições em que nós e nossas famílias estamos vivendo cotidianamente em nossos lares, nos aspectos ligados à tecnologia, segurança e manutenção das instalações e bens que utilizamos. Frequentemente ficamos sabendo de alguma tragédia anônima que aconteceu com alguém de nossa rede ou bolha, vizinhos, isso sem esquecer do que acontece também  em nossos próprios lares cujo porte varia em média na faixa de 40m² a 120m². Já as consequências sobram para cada indivíduo ou grupo familiar, por exemplo, e são cada vez mais difíceis de serem terceirizadas para o Estado e seus governantes ou a uma entidade filantrópica do terceiro setor.

De repente alguém pisou em falso na escada sem corrimão, o corpo se estatelou no chão e a sequela gerou mais um paraplégico. Se pensarmos nas pessoas idosas dá para lembrar que existem levantamentos mostrando que cerca de 70% de suas quedas acontecem dentro de casa. E quais são as causas? Pode ser um escorregão no tapete colocado na entrada da sala sobre o piso bem encerado e brilhante. Pode ser também um tropeção oriundo de uma gambiarra que gerou um emaranhado de fios e cabos espalhados em meio a uma quantidade de móveis entupindo os espaços. Vale lembrar também a queda de uma senhora de 65 anos que subiu numa cadeira para abrir um armário instalado próximo ao teto de sua cozinha. Ela se desequilibrou e caiu batendo a cabeça no piso. Após um semana na no hospital veio a óbito. Também tem o caso de um pequeno edifício de três andares com dois apartamentos por andar, inaugurado há um ano, que teve seu telhado arrancado numa dessas fortes chuvas com ventos de até 50km/h e que levou junto as placas do sistema de aquecimento solar. Faltou qualidade no projeto, na especificação dos materiais, na construção do edifício ou um pouco de tudo? O que dizer de outro edifício de pequeno porte em que a falta de manutenção do telhado impediu que fossem vistas as folhas entupindo as calhas e o resultado foi a água descendo pelas lajes e paredes dos apartamentos de cima abaixo? Para completar um raio caiu numa casa sem pára-raios e por onde passou deixou uma série de equipamentos danificados. Ainda bem que ninguém estava lá dentro naquele momento.

É claro que cada leitor pode se lembrar de inúmeros exemplos ilustrativos do quanto que ainda é frágil a nossa cultura no que tange a dar prioridade máxima aos aspectos de segurança, que a manutenção preventiva e preditiva tem que ser gerenciada continuamente e que tecnologias baratas não resistem a uma análise mínima de benefício e custo.

E a gente vai levando e pagando o pato no anonimato da tragédia pessoal e familiar com dinheiro curto, pouco chão para dar firmeza, tristeza, angústia e a certeza de que sobrou para cada um dos envolvidos encontrar forças para dar a volta por cima. É cada um carregando a sua própria tragédia com a dimensão e o significado que ela traz.

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Chefe de gabinete e sucessora?

por Luis Borges 24 de fevereiro de 2019   Pensata

Passados quatro meses das últimas eleições e quase dois meses da posse dos governadores e Presidente eleitos, as articulações políticas já miram as eleições para prefeitos e vereadores no ano que vem. Faltam apenas 19 meses, que passarão rapidamente. Tudo será feito pela vitória, não importa como, pois “o feio é perder as eleições”. Propostas para resolver problemas podem ser abordadas genericamente, pois dependerão dos recursos que estarão disponíveis.

Um caso que ilustra bem essa movimentação está acontecendo num município de aproximadamente 45 mil habitantes na região central de Minas, que tem orçamento de R$198 milhões para 2019. Lá o atual prefeito está no segundo mandato, tendo sido eleito por uma coligação de sete partidos que o apoiam incondicionalmente, inclusive com uma bancada majoritária na Câmara de Vereadores.

Ao longo desses seis anos de poder municipal começaram a surgir nomes de possíveis sucessores do alcaide do município, a começar pelo seu vice-prefeito, que é de outro partido da base aliada. O que muita gente demorou a perceber foi a crescente desenvoltura da chefe de gabinete do prefeito, notadamente a partir do segundo mandato. No primeiro mandato ela era uma espécie de executiva, colocando a gestão em movimento onde o “sim” era dado pelo prefeito e o “não” ficava para ela.

Obtida a reeleição com folga tudo mudou e o foco da chefe de gabinete passou a ser a sua própria eleição no próximo pleito. Cercou o prefeito de tal forma que quase ninguém consegue falar com ele sem que ela esteja presente. Colocou a mão no orçamento anual da prefeitura onde o pouco que sobrou para investimentos passa pelo seu crivo na definição do que é prioritário para ser feito. É óbvio que ela está de olho nos dividendos eleitorais, tendo inclusive virado uma “seda” com os vereadores da base aliada e jamais fala não, no máximo um “bem, vejamos o que é possível fazer”. Para completar aumenta a cada dia suas amplas articulações ao mesmo tempo em que tenta minar de todas as maneiras o desejo do vice-prefeito, seu adversário mais direto na coligação partidária.

Por outro lado começam a crescer nos bastidores variadas críticas ao estilo da chefe de gabinete cada vez mais intempestiva e ansiosa para assegurar o atingimento de seu objetivo estratégico. Seus atos mais obsessivos têm sido classificados como burrice estratégica por alguns membros importantes dos partidos políticos aliados do prefeito. Este, por sua vez, parece altivo e soberano na observação da cena política, deixando que sua chefe de gabinete vá se desgastando naturalmente nesse início de processo enquanto ainda não é chegada a hora “da onça beber água”, conforme aprendeu ao longo de sua trajetória político-partidária.

Vamos acompanhar as cenas dos próximos capítulos sabedores de que “nada existe em caráter permanente a não ser a mudança”, ainda mais na política partidária que só foca no poder.

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Aberto para balanço

por Luis Borges 17 de fevereiro de 2019   Pensata

Conversando com algumas pessoas mais presentes em meu cotidiano tenho falado que em muitos momentos fico também “nas nuvens” – mais naquelas mutantes lá do alto e menos nas da neblina que se forma perto do solo. Na prática, estou sempre aberto para a observação e análise de variados fenômenos e dos processos que os geram.

Mesmo que às vezes um ou outro tema possa se repetir e desafiar a paciência de algum interlocutor, os resultados alcançados incentivam a continuidade da troca de expectativas e percepções.

Neste início de ano, notadamente a partir de 25 de janeiro, têm sido praticamente obrigatórias as conversas em busca de uma melhor compreensão das causas de tantas mortes envolvendo quatro dos principais elementos presentes na natureza – terra, fogo, ar e água. A ruptura de mais uma barragem de rejeitos de minério de ferro da Vale, o incêndio no Ninho do Urubu – Centro de Treinamento do Flamengo, o fortíssimo temporal que caiu no Rio de Janeiro com ventos de até 110 km/h e a queda do helicóptero em que estava o jornalista Ricardo Boechat sacodem a pauta formada por sucessivas tragédias em curtíssimo espaço de tempo.

Fico imaginando como estão as pessoas que perderam familiares, amigos, colegas de trabalho, vizinhos… de maneira tão abrupta e inesperada. Prossigo imaginando como estariam as coisas se eu ou alguém próximo de mim estivéssemos na mesma situação de quem ficou chorando a perda daqueles que partiram. Seria hora de questionar o sentido da vida, mesmo sabendo que a vida termina com a morte, instante em que o espírito deixa o corpo? Ou seria a hora de, cada um a seu modo e segundo suas convicções, se esforçar para elaborar a perda num processo que passa pelo choro, dor, luto, saudades e recordações, por exemplo?

Quando nada esta também pode ser uma oportunidade para fazer uma autoavaliação do curso da vida que estamos vivendo, com as escolhas que sempre temos que fazer gerando acertos, erros e consequências. Tudo isso com a consciência de que a vida tem sua finitude, que o tempo escoa indelevelmente e que podemos chegar ao final da reta ou da curva a qualquer momento. Simples assim.

Enquanto isso acredito que só nos resta caminhar, seguir em frente, apesar das tristezas de determinados momentos, mas sempre com os motivos para a ação que vem de dentro de cada um de nós, ainda que falar sobre a morte seja um tabu para muita gente.

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Sem memória

por Convidado 13 de fevereiro de 2019   Convidado

* por Sérgio Marchetti

Estamos novamente diante de uma cena de horror. Assistimos ao “repeteco” da tragédia que destacou negativamente a cidade de Mariana para o mundo. Um verdadeiro filme de terror e um atestado de irresponsabilidade e de descaso pela vida humana. Trata-se da famosa tragédia anunciada. Mas, desta vez, a lambança foi maior. Progrediram, inovaram, desgraçaram famílias e transformaram Brumadinho num cemitério de lama. E, como nada é por acaso, a lama talvez passe a ser nosso símbolo nacional, e represente, literalmente, o Brasil – este campeão de corrupção, assassinatos, assaltos, injustiças e tantas outras coisas ruins que infelizmente completam a pintura do quadro brasileiro.

Não vou repetir o que todos já ouviram e viram na mídia. Mas não dá para guardar no peito tanta insensatez e não desabafar sobre o absurdo que estamos testemunhando. Eu não sei como é a dor das famílias que perderam seus entes queridos. Também não saberia nunca avaliar os sentimentos daqueles que perderam e, definitivamente, não encontraram nem os restos mortais dos parentes que jazem sob a lama mal cheirosa, cheia de lixo e restos do que foram um dia a área administrativa e uma pousada.

A lei da causa e do efeito foi violada. O estudo de tendências deve ter sido engavetado. Mas, se por um lado tivemos que experimentar as consequências de uma série de erros, cometidos por quem jamais poderia cometê-los, pudemos, por outro ângulo, ver o trabalho incansável, insalubre e perigoso dos bombeiros que se arrastaram e chafurdaram na lama que sujou novamente o nome do Brasil.

Jornais de todo o mundo noticiaram o feito da Vale e estamparam manchetes dizendo que o Brasil não aprendeu a lição. E, de fato, não aprendeu. É um país sem memória, e essa é a constatação de todos os cidadãos desta terra descoberta por Cabral (não aquele… mas o Pedro Álvarez).

Houve uma grande comoção, inclusive observada em alguns repórteres que cobriram a tragédia. Mas aos poucos virão novos fatos, outros eventos bem mais agradáveis de serem noticiados. E aí, como nossa memória é fraca, vamos esquecendo aos poucos do que houve naquela pequena cidade. Porém, para quem dependia do emprego do marido, da mulher, do filho e de outro parente qualquer, o ocorrido jamais será esquecido. Brumadinho, assim como Mariana, sofreu um duro golpe e entra nos registros da história pela porta dos fundos. Foi vítima de uma invasão assassina que, sem pedir licença ou dar a chance de fuga, destruiu histórias individuais e matou a possibilidade de muitos sonhos se realizarem.

A queda da barragem me lembrou de Pompéia e, tal qual o vulcão daquela cidade, a lama de rejeitos cobriu a todos que estavam no caminho, sem piedade. E, embora tenha ouvido a palavra azar entre tantas vozes, não aceito a tese. Havia possibilidades, havia risco e o acidente era iminente. E, quando acontecesse, todos os trabalhadores seriam engolidos pela lama. E, como vimos e ouvimos, tudo falhou. Erros primários e inconcebíveis para uma empresa daquele porte.

Para quem está vivo, resta a esperança de um novo começo, com um novo governo que possa ser justo e honesto, e que inspire os brasileiros a seguirem caminhos retos, sem jeitinho e sem vantagens. Chega de lama, chega de mortes violentas, chega de lucro a qualquer custo e basta de favorecimentos…

“Já choramos muito/ Muitos se perderam no caminho/ Mesmo assim não custa inventar/ Uma nova canção/ Que venha nos trazer/ Sol de primavera…”( Beto Guedes).

* Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

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Que metamorfose!

por Luis Borges 10 de fevereiro de 2019   Música na conjuntura

O Senador Renan Calheiros (MDB-AL), 63 anos está no Senado Federal desde 1995 e tomou posse no dia 1º de fevereiro para cumprir seu novo mandato de 8 anos. Se cumprido até o final ensejará ao Senador uma carreira de 32 anos na casa revisora de leis. O Senador alagoano desejava ser eleito Presidente do Senado pela quinta vez e, para isso, afirmou que passou por uma metamorfose que o levou a ser um novo Renan, bem diferente do velho Renan, mas admitindo que os dois ainda se comunicam. Deu no que deu na eleição para Presidente do Senado nos dias 1 e 2 de fevereiro, quando acabou retirando a sua candidatura denunciando uma metamorfose casuística no regimento interno daquela casa do Congresso Nacional no que tange ao voto aberto em plenário.

Lembrei-me da tão falada e necessária palavra reinventar para quem precisa formular estratégias de sobrevivência ou de manutenção numa conjuntura marcada por uma tímida e incipiente recuperação econômica. Segundo o Dicionário Online de Português reinventar é tornar a inventar, recriar uma solução para um problema antigo, mas que exige uma nova abordagem; reelaborar. Já metamorfose é definida no site Significados.com como mudança, é a transformação de um ser em outro, de uma forma em outra. No sentido figurado metamorfose é a mudança considerável que ocorre no caráter, no estado ou na aparência de uma pessoa, é a transmutação física ou moral.

Assim também não há como se esquecer do Maluco Beleza que, segundo a mesma fonte, Metamorfose ambulante é o nome de uma das principais músicas do cantor e compositor Raul Seixas (1945-1989), gravada no ano de 1973. Nessa música o artista afirma que prefere viver em um estado de constante mudança do que ser o mesmo todos os dias, com opiniões imutáveis e intransigentes.

Vale a pena ouvir a música na voz do próprio Raul Seixas após 46 anos de seu lançamento e também acompanhar possíveis metamorfoses do novo Renan depois de não ter conseguido realizar seu desejo de ser o atual presidente do Senado Federal.

Metamorfose ambulante
Fonte: Letras.mus.br

Prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo
Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo

Eu quero dizer
Agora o oposto do que eu disse antes
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo
Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo

Sobre o que é o amor
Sobre o que eu nem sei quem sou

Se hoje eu sou estrela
Amanhã já se apagou
Se hoje eu te odeio
Amanhã lhe tenho amor

Lhe tenho amor
Lhe tenho horror
Lhe faço amor
Eu sou um ator

É chato chegar
A um objetivo num instante
Eu quero viver
Nessa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo
Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo

Sobre o que é o amor
Sobre o que eu nem sei quem sou

Se hoje eu sou estrela
Amanhã já se apagou
Se hoje eu te odeio
Amanhã lhe tenho amor

Lhe tenho amor
Lhe tenho horror
Lhe faço amor
Eu sou um ator

Eu vou desdizer
Aquilo tudo que eu lhe disse antes
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo
Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo.
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Esperando a próxima tragédia

por Luis Borges 4 de fevereiro de 2019   Pensata

Já se passaram onze dias do rompimento de mais uma barragem de rejeitos de minério de ferro construída por alteamento a montante na mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), pertencente à Vale Sociedade Anônima. Fico pensando sobre a avalanche de fatos, dados, informações e até conhecimentos consolidados que estão sendo difundidos por diversas mídias. É inquestionável a dimensão da tragédia humana em todos os seus aspectos, a começar pela dor trazida pela morte de quase 400 pessoas das quais ainda falta encontrar a maior parte dos corpos. Para quem mora num dos 34 municípios da região metropolitana de Belo Horizonte, como eu por exemplo, fica a sensação que tudo aconteceu muito pertinho de nós, logo ali a 5, 10 ou 20 km de onde moramos, trabalhamos ou frequentamos em busca de lazer. Também fica uma pergunta passeando pela mente, que vai e voltam querendo saber ou imaginar como estariam as coisas se eu, nós ou um de nossos parentes ou amigos estivéssemos lá no local onde aconteceu o acontecido.

Passaram-se apenas 11 dias, mas o que aguarda os envolvidos direta e indiretamente na tragédia nos próximos dias, meses e anos? Se tudo começa com a gente e a desgraça é individual dá para imaginar a ordem de grandeza das perdas de cada parte e do todo, chamado sociedade, com seus diferentes grupos de interesse vivendo num país típico do capitalismo tardio?

Em meio a tanta inquietação e na plenitude do veranico que retarda o sono só aumenta a entropia trazida pela lama que desceu da barragem. Mas, se quanto maior a entropia mais próximos estaremos da solução para o problema, é preciso também saber se existe um querer que implique na busca de uma solução que leve em conta todos os interessados, e não apenas parte deles, segundo as melhores práticas em prol da sustentabilidade em todas as suas dimensões.

Como isso ainda é só um ideal, quase que uma utopia, dá para entender porque a história se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa. Basta lembrar que uma barragem de rejeitos de minério de ferro com alteamento a montante se rompeu há pouco mais de três anos em Mariana e quase nada mudou de lá para cá. No momento estamos passando por um grande brainstorming, tentando encontrar as causas fundamentais e prioritárias que levaram a esse efeito tão trágico. Da ganância dos donos da Vale –  focados na máxima lucratividade para seus investimentos – passando pelas ações e omissões do estado e seus agentes e chegando-se até as condições em que se realiza o trabalho na mineração, diversas são as causas que tem surgido nas discussões sobre essa tragédia de Brumadinho.

É importante lembrar que um dos donos da Vale é a Litel Participações com, 20,98% das ações. A Litel é formada pelos fundos de pensão dos empregados do Banco do Brasil (Previ), da Caixa Econômica Federal (Funcef), da Petrobras (Petros) e da Cesp (Funcesp). Entre outros acionistas da Vale estão o BNDESPar e o Bradespar além de ações comercializadas em bolsas de valores.

Enquanto isso fico me perguntando se serão necessários mais três anos para que se removam as causas da atual tragédia e também penso no que poderá ser feito para desativar as bombas relógio instaladas em barragens de municípios como Rio Acima, Nova Lima, Itabirito, Congonhas e Itabira, por exemplo. Afinal de contas depois de “Mariana nunca mais” chegou a vez de “Brumadinho nunca mais”. Será que haverá um próximo nunca mais?

Parafraseando o educador Paulo Freire “é fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal maneira que num dado momento a tua fala seja a tua prática.” A necessária transformação que o momento aponta continua desafiando a todos e a cada um nas partes que lhes cabem nesses tempos liberais.

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A possibilidade de receber uma herança num dia que ainda vai chegar povoa o imaginário de muitos descendentes de casais que possuem terras, casas, apartamentos ou aplicações financeiras, por exemplo. Se esse não for o caso, vale sonhar com a herança de um tio ou tia solteiros ou viúvos que não tiveram filhos e não destinaram seus bens através de um testamento. É interessante observar que surgem diversas formulações em torno da partilha de diferentes quantidades de bens e do número de herdeiros, portadores de necessidades específicas em função de suas condições de vida.

Tomei conhecimento do caso do sr. Tiãozinho e de dona Aninha, que eram proprietários de 2 alqueires de terra em uma região de Minas Gerais banhada pelo rio Suaçuí. Eles tiveram 12 filhos, 7 mulheres e 5 homens que permanecem vivos, a mais velha com 60 anos e a mais nova com 38.

A história registrou o falecimento de dona Aninha há 4 anos, quando ela tinha 79 anos, e do senhor Tiãozinho há um ano e meio, aos 83 anos de idade. Após a missa de sétimo dia por intenção de sua alma ficou claro que o luto pela perda do pai já havia passado para alguns filhos mais apertados financeiramente. Eles só queriam discutir a partilha da propriedade e dos bens nela existentes, além do dinheiro depositado numa caderneta de poupança. Um detalhe importante é que o pai deixou definido em testamento que a partilha de tudo deveria ser feita em 12 partes iguais.

Rapidamente Nozinho, o terceiro filho, solteiro comunicou a todos que deixaria Belo Horizonte e voltaria a residir na casa da propriedade junto com a irmã mais velha, viúva pensionista da Previdência Social. Ele justificou a decisão dizendo que era para conduzir o processo de partilha dos bens, o que não foi contestado por nenhum dos irmãos. Logo veio a contratação de um advogado para obter a liberação do dinheiro da caderneta de poupança, processo esse que durou em torno de 8 meses e que rendeu R$5 mil para cada herdeiro além dos devidos honorários pagos ao profissional operador do direito.

Dois meses depois do recebimento desse dinheiro, Nozinho decidiu monocraticamente arrendar a propriedade por um valor desconhecido pelos herdeiros, que até o momento não receberam nada pelo negócio e também nada cobraram dele. Como quem cala consente, ele começou o ano de 2019 apresentando aos demais herdeiros uma proposta para comprar as suas partes na propriedade em pleno dia de Santos Reis. Cada herdeiro receberia R$15 mil pela sua parte num futuro indefinido e assinaria a escritura passando o bem imóvel para o irmão. Com isso, seria possível ele solicitar um empréstimo ao Programa Nacional de Agricultura Familiar – Pronaf, para investir na plantação de alimentos, modalidade que tem prazo de carência de três anos para inicio do pagamento das prestações do financiamento.

Em função dos resultados alcançados Nozinho começaria também a pagar alguma parte do valor proposto a cada herdeiro, sem correção monetária, e esperando que nas safras seguintes conseguiria quitar o restante da dívida. Para facilitar a comunicação entre os herdeiros ele criou o grupo de WhatsApp “Nossa Roça” e a reação foi imediata. A maioria rechaçou a proposta, comparando-a com a emissão de um cheque em branco e considerando muito baixo o valor proposto para a compra das terras. Além disso, veio à tona a informação de que Aprígio, o quarto filho, já havia comprado anteriormente a parte da irmã Catarina por R$25 mil e posteriormente a do irmão Berto por R$18 mil.

Mesmo instalado o caos entre os herdeiros, Nozinho continua insistindo e cobrando pelo WhatsApp uma resposta para a sua proposta que ainda é a mesma. Aprígio com suas três partes e os outros 8 herdeiros, com uma parte cada, prosseguem quietinhos e deixando as coisas como estão para depois ver como ficarão. Herança também dá nisso!

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