Faz tempo que a reforma da Previdência Social está no vai e vem de uma verdadeira gangorra que sempre volta à posição inicial.

É importante lembrar, de cara, que reforma significa remendo, trocar a parte podre de um tecido por outro com melhores condições conforme mostram verbetes de dicionários da língua portuguesa. A discussão da matéria Previdência Social foi propositalmente evitada na campanha eleitoral, tanto para Presidente da República quanto para governadores dos estados, Senadores, Deputados Federais e Estaduais. A razão mais segura para ninguém falar nada é muito clara diante da rejeição popular à proposta apresentada pelo Governo Federal, que se encontra na agonia de seus estertores. Como quem herda os cargos também herda os encargos, diz o ditado, fica mais fácil de entender o súbito desejo de aprovar alguma coisa sobre a reforma ainda nesse ano. Mas não dá para fazer em 15 dias úteis de congressistas pouco produtivos – de terça a quinta e de hoje até 20/12 – uma verdadeira e profunda discussão, baseada em fatos e dados reais e transparentes, sobre como deveria ser a Previdência Social no setor público e privado. E a reforma deve ser feita por meio de emenda à Constituição.

Não basta repetir o sofisma de que a maior responsabilidade pelo déficit da Previdência Social está no INSS, onde o inatingível teto dos proventos é de R$5.645,80 e a média das aposentadorias está em torno de R$1.271,88 mensais. O que menos se fala é que nos regimes próprios da Previdência Social para a União Federal, estados e grandes municípios os servidores se aposentam pelo salário integral vigente no momento da aposentadoria. Segundo o Projeto de Lei Orçamentária da União Federal para 2019, em discussão no Congresso Nacional, o valor médio mensal das aposentadorias dos servidores do Poder Legislativo é de R$26.823,48 e a do Poder Judiciário é de R$18.065,40 enquanto no Ministério Público é de R$14.656,32 e no Poder Executivo é de R$8.477,59. Vale lembrar que a proposta orçamentária foi feita considerando que o Governo Federal tem 737.572 aposentados, sendo que desse número fazem parte 300.937 pensionistas. O orçamento estima que os pagamentos a esses aposentados gerarão um déficit de R$90 bilhões, dos quais R$43 bilhões se referem aos militares.

Por outro lado o Regime Geral da Previdência Social, gerido pelo INSS que atende a 30 milhões de aposentados e pensionistas oriundos da iniciativa privada, tem um déficit de R$218 bilhões equivalente a 70,7% do déficit previdenciário total que é de R$308 bilhões. Como se vê 2,4% dos servidores públicos federais aposentados – 737.572- respondem por 29,3% do déficit previdenciário total projetado. Esse é que deve ser o foco para se começar a falar em reforma da Previdência, que tem sido vendida como a grande salvadora do déficit público da União, principalmente para o mercado. Imagine a situação dos estados e dos municípios, principalmente a da maioria de quebrados que ultrapassam os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Após reconhecer que poucas causas de um problema são vitais e que muitas são triviais – Princípio de Pareto – é que se deve passar à discussão de outras premissas que também podem impactar a sustentabilidade do modelo a ser proposto. Por aí passarão o mesmo teto de aposentadoria para o setor público e o privado, idade mínima, tempo de contribuição… O que não dá é tirar da cartola o insustentável fundo de capitalização usado no Chile e que só garante perda do poder aquisitivo dos aposentados. 2019 já está logo ali, já a solução para a Previdência Social…

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O IBGE divulgou os dados da Pnad Contínua do trimestre móvel de julho a setembro de 2018 mostrando que 12,5 milhões de pessoas estavam desempregadas no período. Outros 4,8 milhões estavam em situação de desalento – deixaram de procurar trabalho há mais de 30 dias em relação à data em que foram entrevistadas. Esses números chegaram num momento em que começaram a ganhar intensidade os trabalhos das equipes de transição dos eleitos para a Presidência da República e os governos estaduais, nesse caso com maior ênfase para os de primeiro mandato. Surge aí uma oportunidade para que muitas pessoas alimentem seus sonhos de encontrar um trabalho ou emprego no serviço público, ocupando cargos de provimento em comissão. Aliás, muitos já focaram nesse objetivo no início da campanha eleitoral enquanto outros entrarão em ação durante a transição ou após o início dos mandatos em janeiro. Vale lembrar também que existem vagas nos gabinetes dos Senadores, Deputados Federais e Estaduais principalmente naqueles que estarão iniciando seus mandatos em fevereiro próximo. Todos também devem saber que provavelmente a quase totalidade dos contratados pelos que deixarão seus cargos sairão junto com eles, pois a relação é de confiança e de retorno de investimentos eleitorais.

Ainda que a cobrança por resultados mais efetivos e significativos possa estar crescendo aos poucos, vai se tornando cada vez mais necessário – inclusive por questão de sobrevivência para quem contrata – que se estabeleça um perfil e os requisitos técnicos específicos para quem vai exercer funções de confiança na gestão pública, mesmo que o postulante seja filiado a grupos e partidos políticos que estejam no poder. A avaliação do desempenho também faz parte da gestão e impacta na reeleição.

Segundo informa a Secretaria da Administração e da Previdência no Portal do Servidor:

“cargos de provimento em comissão são aqueles de livre escolha, nomeação e exoneração, de caráter provisório, destinando-se às atribuições de direção, chefia e assessoramento, podendo recair ou não em servidor efetivo do Estado. Ao servidor ocupante exclusivamente de cargo em comissão aplica-se o regime geral de Previdência Social previsto na Constituição Federal, artigo 40, § 13”.

Só para se ter uma noção do tamanho desse nicho do mercado de trabalho podemos lembrar que no Poder Executivo Federal existem aproximadamente 100 mil cargos de confiança. Já no poder executivo do estado de São Paulo os cargos de confiança chegam a 27 mil e no mesmo poder do estado de Minas Gerais são em torno de 17 mil. É importante também lembrar que é prática comum a indicação de pessoas para serem contratadas pelos prestadores de serviços a órgãos da administração direta e indireta do Poder Executivo na União, estados e municípios.

Vamos aguardar para verificar os próximos passos dos eleitos diante da necessidade de uma reforma fiscal para tentar equilibrar a arrecadação e os gastos da deficitária união federal e da maioria dos quebrados estados brasileiros. Será que os cargos de confiança preenchidos por recrutamento amplo serão cortados em até 80% conforme prometeu o futuro governador de Minas Gerais? Quantos e quais o seguirão em seu intento entre os quebrados e os deficitários?

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As mãos de tesoura estão chegando

por Luis Borges 7 de novembro de 2018   Pensata

Encerradas as eleições o tempo prossegue escoando indelevelmente e hoje já faltam apenas 54 dias para a posse dos eleitos para ocupar a Presidência da República e os governos dos estados e Distrito Federal. O que cada um dos eleitos fez ou deixou de fazer para chegar ao poder no regime democrático brasileiro já vai ficando para trás, apesar de todos os pesares e ainda que nem todos os meios justifiquem os fins. O mais provável é que os novos eleitos encontrarão as contas públicas com enormes déficits e os que se reelegeram devem saber como anda o caixa de seus estados.

O fato é que os estados estão quebrados e isso ficou mais visível após a recessão econômica de 2015/16 ter derrubado a arrecadação dos tributos enquanto as despesas públicas continuaram crescendo – e muito. Só a União Federal prevê déficit de R$139 bilhões para o orçamento do próximo ano, enquanto opera 2018 com déficit de R$159 bilhões. Já o estado de Minas Gerais reavaliou seu déficit para 2019 – em agosto era de R$5,6 bilhões e no início de outubro já passou para R$11 bilhões, conforme projeto de lei enviado à Assembleia Legislativa. E assim, quem olhar para o déficit orçamentário do estado do Rio de Janeiro para o próximo ano verá que está estimado em R$8 bilhões e se mirar no Rio Grande do Sul encontrará déficit de R$5,6 bilhões, por exemplo.

Lembrando-me do ditado popular afirmando que “quem não tem competência não se estabelece” só me resta recitar o compositor baiano Assis Valente, em sua música “Brasil pandeiro” que diz que “chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar o seu valor”. Principalmente se for levado em conta que os eleitores tendem a cobrar mais pela entrega de resultados que fazem parte de suas expectativas eleitorais.

Como a economia ainda continua em sua frágil recuperação, sem dar sinais de crescimento para chegar aos patamares anteriores à recessão, espero que o equilíbrio das contas públicas não seja feito simplesmente dando tesouradas lineares para cortar os gastos em 15%, 20% ou 25% no chamado “corte burro”. É claro que, só para lembrar, aumentar impostos nem pensar.

A partir do diagnóstico e dos prognósticos feitos pelas equipes de transição dos governantes eleitos espero que surjam critérios e prioridades para fazer as adequações na estrutura organizacional em função da arrecadação e dos gastos num horizonte de curto, médio e longo prazo. Combater os desperdícios, as mordomias, os privilégios, a corrupção, as obras faraônicas dos palácios dos 3 poderes, a má gestão – inclusive a temerária – são alguns dos aspectos que mostram por que as tesouras não podem cortar a esmo. A ausência de critério não pode ser o critério.

Importante também salientar que forma e conteúdo caminham lado a lado e por isso mesmo é que transparência e respeito à dignidade humana devem estar sempre presentes, mesmo diante de tanta credulidade no liberalismo econômico. Vamos aguardar os resultados lembrando que o passado glorioso não garante nada no presente e que quando a história muda, tudo volta a zero, mas o amanhã não espera e chega todos os dias. Não dá para arrumar desculpas.

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Eu nasci às 4 horas da manhã do dia 24 de outubro de 1954 na capital secreta do mundo, a cidade eterna de Araxá. Fui a primeira luz de Lazinha, então com 21 anos de idade, e de Gaspar Borges, que acabara de completar 27. De lá para cá a roda da vida rodou inúmeras vezes em ciclos e fases, mais no sentido horário do que no anti-horário do relógio.

Agora que acabei de completar 64 anos de idade vieram me perguntar como me vejo e me sinto para prosseguir em meu curso de vida que, inexoravelmente, tende à finitude. Alguns até desdobraram a pergunta para verificar qual é a minha expectativa em relação à quantidade de anos que estão por vir. Acabaram emendando as perguntas abordando temas como a saúde, a família, a condição financeira e o futuro próximo do país.

Assim comecei a ensaiar minhas respostas de maneira bem simples e objetiva para mostrar as condições de contorno que estou delineando neste momento para cada um dos temas colocados.

De cara respondi – e repito aqui – que me vejo como alguém que está sempre em construção e buscando ser uma pessoa melhor, respeitosa para com os outros, realista porém com muita esperança de que tudo pode ser melhor do que está hoje. É uma questão de crença. Disse, também, que me sinto em boas condições funcionais que são compatíveis com a idade, mas que precisam ser gerenciadas para que o sistema que é o corpo humano continue operando bem. Dando sequencia às respostas disse que a minha expectativa de vida, com qualidade, é caminhar até aos 80 anos, o que é um bom salto diante da minha expectativa anterior que era de 72 anos. Persiste a expectativa de ter o merecimento de não ter a vida prolongada artificialmente em função de atos médicos resultantes da obsessão terapêutica pela cura. Na impossibilidade de um fim súbito, melhores serão os cuidados paliativos, o combate à dor, a atenção advinda da escuta e uma boa dose de alta espiritualidade para ajudar a suportar com muita resignação a chegada ao fim da caminhada.

Sobre a minha família e o amor que nos une apenas reafirmo que é a partir dela que me sinto sempre forte para enfrentar os desafios que a vida nos apresenta continuamente, principalmente por acreditar que ela é a base que nos alavanca e nos respeita no jeito de ser de cada um de nós que a formamos. Já os amigos serão sempre imprescindíveis, desde que eu tenha a capacidade de continuar polindo a amizade, pois percebo que o uso excessivo da tecnologia digital só nos dá a sensação de proximidade e nos deixa longe dos encontros presenciais.

Quanto às condições financeiras não tenho dúvidas sobre o quanto elas nos desafiam, principalmente já vivendo de proventos de uma aposentadoria num país quebrado que tenta se recuperar de uma grande recessão econômica. O jeito é lutar para viver só com o necessário, sem desperdício, sem ostentação e com uma qualidade compatível, mas que caiba no orçamento.

Finalmente sobre o futuro próximo do país, penso que é continuar acreditando e lutando pelo estado de bem estar social, mesmo diante de tantas revelações advindas do recente período eleitoral, mas buscando aprender com os erros e acertos que se sucedem no processo de construção dessa trajetória ao longo da história. Porém, parafraseando Bertolt Brecht, “infeliz a nação que precisa de heróis”.

Hoje já estou no sexto dia da caminhada rumo aos 65 anos.

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Bola pra trás

por Luis Borges 24 de outubro de 2018   Pensata

A vida está uma correria louca e tudo precisa ser feito rapidamente antes que o dia acabe, embora ele ainda esteja crescendo no meio da tarde. O relógio está prestes a marcar 16h quando dois amigos chegam esbaforidos a um dos velórios de um cemitério parque da cidade de Belo Horizonte. A meta era passar a última hora do velório ao lado do corpo do finado amigo, que fazia parte de um trio formado nos tempos da universidade. Mas por que os dois só chegaram em cima da hora se eram unidos por uma amizade que já registrava pouco mais de 40 anos de bom humor harmonia, cumplicidade e solidariedade, isso para citar apenas algumas características marcantes da relação entre eles?

Aconteceu que desde 2016 ficaram explícitas as divergências deles em relação a posicionamentos políticos partidários que tinham se originado 2 anos antes. O micromundo deles acabou se dividindo em dois polos totalmente crédulos e herméticos, o que fez com que da discussão de qualquer aspecto político se tornasse um grande embate. Foi nesse vai da valsa marcado pela intolerância, incapacidade de ouvir e crescente aumento do desrespeito que, no início de julho, eles resolveram dar um tempo na relação de tantos anos, na expectativa de que buscariam uma retomada do convívio após o segundo turno das eleições de outubro. Assim cada polo tomou o seu rumo e todos os contatos ficaram suspensos. O que nenhum deles pensou foi na finitude da vida. Como cada polo foi para o seu lado, quase que os dois amigos nem ficariam sabendo que o amigo do outro polo veio a óbito devido a um infarto agudo do miocárdio no dia seguinte ao primeiro turno das eleições. Ainda bem que um dos filhos do morto resolveu informá-los sobre acontecido logo após a hora do almoço…

Agora o polo formado pelos dois amigos que sobraram está cheio de reflexões, buscando melhor conhecer e compreender as causas do processo que os levou a dar um tempo na longa relação com o amigo que partiu. Só que, surpreendidos que foram, eles não querem cair no mero conformismo do “bola para frente” ou “vida que segue”. Em suas observações e análises eles estão vivenciando um verdadeiro “bola pra trás” na tentativa de identificar onde e como as falhas ocorreram e as perdas que elas geraram. Eles já sabem que perderam um amigo que jamais será substituído e imaginam que ele provavelmente partiu para o outro plano talvez um pouco magoado, sofrido com os rumos tomados pela amizade em função da intolerância mútua.

Faz parte da sabedoria contar até dez, dar um passo atrás para depois dar dois à frente. É uma questão de inteligência estratégica principalmente para quem não quer viver só e somente só, na solidão que pode deprimir e até matar, inclusive por suicídio. Como sempre, tudo depende também do nosso querer, da nossa ação e da nossa capacidade de admitir erros.

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Aposentou e surtou

por Luis Borges 16 de outubro de 2018   Pensata

A aposentadoria do trabalho é um tema que mexe de muitas maneiras com as pessoas em seu curso de vida. E acaba gerando preocupações enquanto o tempo de labor vai maturando até se cumprir os requisitos necessários conforme as regras definidas pelas leis. A premissa é que tudo caminhe na mais santa paz. Mas como a vida é um risco, inclusive no trabalho, muitas são as causas que podem adiar ou mesmo limitar as condições que regerão uma determinada aposentadoria. Dá para imaginar as apreensões geradas por propostas de reforma da previdência social privada e dos regimes próprios dos servidores públicos em busca de um equilíbrio das contas públicas que impacta nos direitos adquiridos, inclusive de castas.

Digamos que, ainda assim, chega o momento em que é possível se aposentar e muitos são os casos daqueles que quase nem aguentavam continuar trabalhando até completarem as condições necessárias. O que fazer para prosseguir no curso da vida após o dia seguinte à aposentadoria ou depois do quadragésimo dia?

Esse tipo de planejamento não foi feito pelo assistente administrativo Rominho Talarico, que se aposentou aos 57 anos no final de 2017. Desde então ele passou a ficar em casa praticamente o tempo todo, sem muita definição clara do que fazer e, ao mesmo tempo, tentando se mexer aleatoriamente em busca de atividades para encontrar coisas para preencher o dia. Ler jornais, ouvir emissoras de rádio, assistir à programação da televisão e atuar nas redes sociais digitais foi um bom começo, mas não demorou muito a ficar um pouco enfadonho, ainda mais diante de confrontos regidos pela intolerância, raiva e ódio.

Fazer compras em padarias, sacolões e supermercados para suprir necessidades da semana ou do dia, sempre pesquisando melhores preços, acabou gerando fadiga na relação com a esposa, aposentada alguns anos antes, por divergências em relação às quantidades, marcas, preços e formas de pagamento. Isso levou a seu afastamento da atividade para preservar a duradoura relação de todo o tempo de seu trabalho profissional, quando não participava desse tipo de atividade. O jeito foi focar mais no futebol e acompanhar tudo de seu time do coração em todas as competições disputadas. Logo veio uma restrição por parte da esposa ele não poderia gritar ou berrar o nome do seu time em caso de um gol assinalado, apenas manifestar discretamente a sua satisfação.

Nesse contexto do cotidiano acabou surgindo mais uma atividade para Rominho. Seu neto mais novo, de quase um ano, passou a ficar em sua casa durante o dia para que sua mãe voltasse ao trabalho na sala de aula de uma escola municipal. Avô e avó passaram a se dedicar prioritariamente ao neto, com muito amor e crescente admiração por todos os seus feitos no processo de crescimento. Acontece que no final de setembro, após três meses cumprindo a missão, o avô já demonstrava grande ansiedade para que o neto dormisse nos horários planejados, principalmente no meio da tarde. Todos os barulhos gerados pelo edifício de 4 andares e também 4 apartamentos por andar passaram a incomodar cada vez mais ao avô que, aliás, mora no primeiro andar. Manobras de carros e motocicletas na garagem, música alta nos dois apartamentos de cada lado do seu, crianças brincando no corredor fazendo algazarra e outros acontecimentos mais típicos de um condomínio residencial acabaram “tucicando”, incomodando cada vez mais o dia-a-dia de Rominho.

Foi assim que ele acabou surtando na tarde da sexta-feira 28 de setembro, quando totalmente descontrolado partiu para o ataque a seus vizinhos, falando muitas asneiras e exigindo que naquele horário prevalecesse a lei do silêncio. Logo alguém acionou a polícia, que não apareceu de imediato, enquanto uma moradora do segundo andar tentava localizar o síndico. Instalado o caos, só algum tempo depois as coisas foram voltando à serenidade.

Desgastado e deprimido com os acontecimentos Rominho Talarico chamou a família, inclusive o genro, para uma reunião onde expôs os seus transtornos de ansiedade. Segundo ele a causa principal era não ter se preparado para viver fora dos aposentos após ter se aposentado há apenas nove meses. Pediu ajuda para começar a fazer o que não foi feito por ele e nem pela sua esposa. Também pediu à filha e ao genro que buscassem rapidamente uma solução para o neto, que poderia ser uma creche, por exemplo. Finalmente disse que procuraria ajuda médica até superar a fase mais difícil da qual espera sair brevemente. De lá para cá já se passaram 18 dias.

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A tia vai bem. Será?

por Luis Borges 9 de outubro de 2018   Pensata

Nesses tempos de elevado consumo de bens e serviços advindos dos diversos níveis do aceleradíssimo avanço tecnológico o mais frequente é cada um cuidar de si, preferencialmente dentro de algumas bolhas específicas, o que não é novidade para quase ninguém. Acaba sendo uma mera constatação. Mas e daí? Pode até sobrar para muitos de nós uma boa oportunidade para combater a solidão numa rede social digital ou mesmo numa relação bilateral e de maneira muito rápida pelo WhatsApp, por exemplo.

Entretanto fico pensando se além do texto, do áudio, do vídeo encaminhado, do pescoço dolorido, das ressecadas córneas dos olhos e de alguns dedos das mãos doendo se ainda é possível resgatar outras formas de contato com as pessoas, bem mais utilizadas nos tempos de outrora, com calor humano, afetividade e respeito mútuo.

Mas como fazer isso acontecer no tempo que urge sem gestão e na sobrevivência cotidiana que cobra permanentemente uma resposta em tempo real? E o pior é que ainda sobra tempo para a solidão, que os dispositivos tecnológicos não dissipam. Surge aí um espaço para reflorescer o propósito do reequilíbrio como na aurora de uma primavera que surge após longo e frio inverno. Melhor seria visitar a idosa tia solteira, irmã da finada mamãe, do que perguntar pelo WhatsApp ao irmão, ao primo ou à prima como vai a tia, se ela está bem sem necessariamente se preocupar em visitá-la ou saber se precisa de uma ajuda material ou de um pouco da presença do sobrinho que há tempos não comparece à sua casa. Até fico com a sensação de que a prevalência é da curiosidade mórbida alinhada com a necessidade de aparecer bem na fita, principalmente se da tia sobrar uma parte da herança a ser distribuída assim que seus olhos se fecharem definitivamente.

Essa menção à tia tão mais querida quanto abandonada que faço aqui pode ser considerada um exemplo genérico, mas verdadeiro, sobre nossas posturas em relação a outros parentes próximos, aos poucos amigos feitos nos tempos da universidade, inclusive na militância política estudantil, aos dois ou três colegas de trabalho que se tornaram nossos amigos ao longo de uma trajetória no serviço público, numa empresa estatal ou privada e até mesmo um vizinho de um bairro da cidade em que moramos noutros tempos. A tecnologia que pode facilitar a aproximação cada vez mais veloz entre as pessoas é a mesma que também pode facilitar o afastamento pelo excesso de acessos sem nenhuma presença física. Até o bom dia ou boa noite cotidiano no WhatsApp torna-se cansativo, frio e cada vez mais visualizado sem se prestar nenhuma atenção. É como se fosse apenas dar vazão a uma imensa ansiedade de estar ligado a qualquer coisa.

Você também tem refletido sobre o distanciamento ou mero afastamento cada vez mais frequente entre os humanos ou isso não está no foco das suas preocupações?

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Pelo quarto ano consecutivo está acontecendo o “Setembro Amarelo”, uma campanha que se iniciou em 2015 lançada pelo Centro de Valorização da Vida, Conselho Federal de Medicina e Associação Brasileira de Psiquiatria. O objetivo principal da campanha é conscientizar as pessoas sobre a prevenção do suicídio por meio de alertas à população sobre esta prática no Brasil e no mundo. Essas organizações defendem que a melhor forma de prevenir o suicídio é o diálogo e a discussão sobre as causas que geram o problema, o que pode contribuir para a definição adequada das principais medidas a serem tomadas em busca de uma solução para cada caso.

Melhor seria que o tema tivesse a mesma visibilidade que tem durante o “Setembro Amarelo” nos meses seguintes. Mas como toda campanha tem um tempo finito, o jeito é seguir pelejando com os meios disponíveis até se chegar novamente à maior visibilidade na campanha do próximo ano. Infelizmente até lá nos restará persistir no propósito de mostrar em todas as mídias que a não divulgação da ocorrência dos casos de suicídios pouco contribui para a solução desse problema de saúde pública. Mesmo diante do sofrimento, da dor e do luto das pessoas vale lembrar que os fatos não deixam de existir só porque são ignorados e que admitir que um problema existe já é 50% de sua solução.

Uma face triste da invisibilidade do tema “suicídio” é que temos dificuldades de perceber os sinais de alerta dados por quem pensa em tirar a própria vida. Em muitos casos, só identificamos os sinais depois que a morte acontece. O Ministério da Saúde divulgou novos dados sobre o suicídio e também um guia com sinais de alerta para amigos e familiares. Vale a leitura do material.

Outro aspecto que chama atenção é quando se levanta o número de pessoas que são afetadas pelo suicídio de alguém. Existem pesquisas mostrando que esse número em geral varia de 9 a 140 ao se considerar família, parentes, amigos, colegas de trabalho, vizinhos e irmãos de fé. Muitas terão que lidar com a culpa por não terem percebido os alertas…

Se observarmos as várias possibilidades de causas e maneiras que podem levar alguém à morte – e geralmente todas com algum potencial de publicação em determinadas mídias, inclusive nas redes sociais digitais – não dá mais para esconder o suicídio. Ainda mais quando, de repente, somos confrontados por ele, quando às vezes acontece nas grandes cidades, ou ficamos sabendo de um suicídio de um amigo ou familiar.

Aproveite o “Setembro Amarelo” para se informar mais sobre o tema. E, não custa lembrar, estar disponível para amigos, familiares e nutrir boas conversas e amizades pode dar confiança e abrir caminhos para que os outros nos peçam ajuda. Ou para nos ajudarem, se for o caso.

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A primavera brasileira terá início no próximo sábado e deve nos encontrar cheios de expectativas quanto ao reflorescimento da flora e a beleza das flores que darão o característico colorido da estação. É nela que terá inicio o período chuvoso do Sudeste brasileiro, que deverá se prolongar até o final do verão.

Também será na primavera que acontecerão os dois turnos das eleições de outubro, que estão gerando muitas expectativas, incertezas e variados níveis de esperança e ceticismo para a solução de crônicos problemas brasileiros. Um dos mais citados em prosa e verso mostra que o Estado brasileiro – União, estados e municípios – está simplesmente quebrado. Isso pode ser verificado pelos déficits orçamentários previstos para 2019, como os R$139 bilhões da união, R$6,8 bi do Rio Grande do Sul, R$5,6 bi de Minas Gerais e R$5 bi do Rio de Janeiro. Aliás, nenhum desses déficits começou agora, mas terão que ser enfrentados pelos que serão eleitos no próximo pleito.

Enquanto os brasileiros vão se preocupando de diversas maneiras e intensidades – inclusive com indiferença e alienação – diante das grandes questões do nível macro da política partidária ou não, da economia e do tecido social é importante se verificar como está a situação dos indivíduos e das famílias no micro mundo do cotidiano em que estão vivendo. Se tudo começa com a gente, cabe às pessoas, com o nível de informações e conhecimentos que possuem, também imaginar e projetar suas situações a partir de premissas que poderão dar condições de contorno às suas vidas no próximo ano.

Será que quem está trabalhando atualmente terá a garantia de continuidade ao longo do próximo ano? Se sim, será possível conseguir um reajuste salarial que reponha as perdas inflacionárias medidas pelo IPCA nos 12 últimos meses que antecederão a data-base de sua categoria profissional? Se vier o pior, a falta de trabalho, como poderia ser feito um plano de ação para se atingir a meta de recolocação no mercado em até 6 meses, por exemplo? Será que os novos governantes retomarão as discussões para a reforma da previdência social, solicitando um sacrifício extra de quem recebe acima de dois salários mínimos para combater o déficit da previdência dos servidores públicos e dos empregados da iniciativa privada? Quem trabalha para o poder executivo dos estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul já sabe que os seus salários continuarão a ser parcelados no próximo ano, independente dos resultados que os futuros governadores conseguirem no primeiro ano de suas gestões…

Não tenho aqui a pretensão de levantar todas as possibilidades de situações que poderão ocorrer nos próximos meses, mas apenas sugerir que é importante fazer o dever de casa. Inclusive quem está na zona de conforto, para não ser surpreendido pelos cenários que se desenham para o futuro cada vez mais próximo. Acredito que ainda serão predominantes as estratégias de sobrevivência pois quanto pior, pior mesmo. Só se vitimizar depois que as coisas acontecerem não será suficiente. Por isso é preciso ter “um olho no peixe e outro no gato”. Às vezes muitas pessoas são surpreendidas por estarem sabendo e acompanhando tudo que acontece no Brasil e no mundo, mas perdem o foco ao não cuidarem de si mesmas.

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A crise política, econômica e social pela qual está passando a Venezuela colocou em evidência na mídia a cidade de Pacaraima, que fica no norte do estado de Roraima, na divisa com o país vizinho. É por lá que os Venezuelanos estão entrando no Brasil em busca da sobrevivência, de um abrigo que não existe para todos, do combate à fome e da perspectiva de um recomeço em outros lugares pelo Brasil afora. É claro que diante da quantidade de imigrantes chegando – já seriam mais de 30 mil na capital, Boa Vista, segundo a prefeitura municipal – tornou-se inevitável o conflito com brasileiros, como o que aconteceu há três semanas em Pacaraima. E olha que a cidade é apenas um ponto de entrada e de passagem até que se chegue o momento de rumar para Boa Vista e de lá para onde for possível ficar. Vale lembrar, segundo estimativas do IBGE em 2018, que o estado de Roraima tem população de 522.636 habitantes, enquanto Pacaraima tem 12.375 habitantes e Boa Vista 375.374. A energia elétrica usada no estado é comprada da Venezuela, a quem a Eletronorte deve atualmente U$30 milhões pelo fornecimento.

O estopim para confrontos com os venezuelanos pode vir do furto de um bem, como um aparelho de telefone celular, até o roubo em uma casa ou estabelecimento comercial, por exemplo. Há registros de casos de imigrantes que preferiram retornar à Venezuela. Sobreviver é preciso, custe o que custar e das mais variadas formas.

Mapa de parte do Brasil com a cidade de Pacaraima destacada em vermelho. | Fonte: Google Maps

Enquanto isso o finado governo Temer continua batendo cabeças em busca do que fazer com a fronteira diante das razões humanitárias e dos acordos internacionais que abordam o assunto. Nesse instante prevalece a decisão de manter as fronteiras abertas e de direcionar os venezuelanos que estão em abrigos ou vias públicas de Boa Vista para diversos municípios ao longo do país.

Nesse contexto fico imaginando como muitos de nós se comportariam caso morassem em cidades como Pacaraima e Boa Vista. Penso também nas atitudes que seriam tomadas em função da espiritualidade, religiosidade e generosidade por quem prega o sempre falado “coloque-se no lugar do outro”, mesmo na plenitude da luta de classes do regime capitalista.

Fico imaginando também se muitos de nós estivéssemos no papel de refugiados que comportamento teríamos diante de uma situação pessoal e familiar nunca imaginada antes? Isso porque é mais fácil imaginar que as coisas só acontecem com os outros e nunca com a gente. Dá até para lembrar como ficamos perplexos diante de mais de 7 mil pessoas, segundo a prefeitura de Belo Horizonte, sobrevivendo nas vias públicas em frente a edifícios residenciais, comerciais ou simplesmente acampadas em praças ou debaixo de viadutos. Lembro-me também que o Brasil recebeu imigrantes do Haiti, da Síria… Agora uma queda de braços está se dando na Nicarágua, país da América Central que é logo ali, onde uma das causas do impasse foi a proposta de reforma da previdência social, que já foi retirada da pauta pelo Presidente da República cuja renúncia é pedida por parte da população.

Será que estamos realmente preparados para colocar em prática diversas ações por razões humanitárias, logo nós que somos tão preocupados com a ordem, a segurança pessoal, a familiar e do patrimônio?  Em tempos de escassez e de outras configurações para atenuar as muitas desigualdades e os chamamentos para trabalhos voluntários, como ficaria o “farinha pouca meu pirão primeiro”? Será que o baile seguirá com a mesma valsa?

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