Síndico do prédio nunca mais

por Luis Borges 17 de agosto de 2020   Pensata

No último fim de semana fiz uma visita a um amigo paulistano por meio do velho e bom telefone fixo. É aquele mesmo, que foi adquirido na época do plano de expansão da operadora de telefonia – Telemig – pago em inúmeras parcelas mensais no final da década de 70 do século passado.

Na extensa pauta que marcou a visita coube muita coisa, desde a vida na pandemia com a família na residência em suas várias variáveis, o teletrabalho, as incertezas dos cenários e a decisão de nunca mais ser o síndico do prédio em que mora. Este é o ponto que quero abordar aqui.

O amigo disse que há 14 anos é proprietário do apartamento em que mora e que foi o síndico do prédio nos últimos oito anos, em quatro mandatos consecutivos de dois anos cada, que acabaram de se encerrar. Perguntei a ele qual a causa da decisão tão peremptória marcada com a expressão “nunca mais” para que eu entendesse o caso e a sua decisão. O amigo disse que o prédio existe há 38 anos, tem 40 apartamentos – 4 por andar – em dez pavimentos e 30 vagas de garagem, sendo que um veículo prende o outro. Esse é o detalhe que sempre gera uma fadiga permanente na relação entre os usuários das vagas a partir de alguns que tem comportamentos desrespeitosos, pouco civilizados e que criam impasses para exigir a presença do síndico na mediação dos conflitos. As principais causas de atritos entre os usuários das vagas são os pequenos choques que amassam os veículos, os moradores que não deixam a chave na portaria do prédio para que seja possível manobrar o carro e também aqueles que estacionam o veículo de qualquer maneira quando a vaga está livre. O acirramento aumentou com a pandemia devido à presença mais duradoura das pessoas no prédio, inclusive crianças sem aulas, e muita gente também entrando e saindo do prédio com seus veículos, quase que num bate e volta, indo dar uma espairecida nas ruas.

O amigo sempre exerceu a função de síndico de maneira honorífica e apresentou excelentes níveis de resultados em sua gestão marcada pela liderança apesar do comparecimento médio de 20% dos moradores nas assembléias gerais do prédio, o que, aliás, é uma característica brasileira marcante. Reclamar, se vitimizar e não se comprometer é sempre mais fácil. Ele concluiu esse tema dizendo que chegou num ponto que “deu”, que deixou de ter motivos para a ação – motivação – diante de tanta falta de cooperação entre determinadas pessoas que agem como se não estivessem no mesmo barco com os demais moradores do prédio.

Finalmente, quando nos despedimos ao final da visita, o amigo disse que seu próximo sonho é encontrar uma moradia unifamiliar para prosseguir em sua trajetória de vida. Pelo visto, prédio também nunca mais. Será? A conferir. E se fosse com você, que solução seria dada?

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O adiamento das eleições municipais deste ano foi apenas mais uma das muitas conseqüências da epidemia da Covid-19. Pensou-se até na prorrogação dos mandatos de prefeitos, vices e vereadores para 2022 e assim poderia ocorrer a coincidência com os mandatos estaduais e federais. Olhando para a conjuntura e o pouco visível horizonte próximo, digamos até 15 de novembro, o fato é que faltam apenas 95 dias para a realização do 1º turno das eleições.

Sempre chego a essas ocasiões com uma boa expectativa de renovação entre os que serão eleitos a partir de um nível mínimo de propostas consistentes, estruturadas e defensáveis numa sociedade democrática. O processo eleitoral será curto e exigirá dos candidatos uma enorme capacidade de comunicação com os eleitores, notadamente por meio digital. Sempre tenho a esperança de que a verdade prevalecerá, mas sei que o ambiente polarizado e radicalizado politicamente torna as coisas menos civilizadas, o que abre espaço para o desrespeito, o ódio e as notícias falsas.

Por outro lado devemos nos lembrar que mesmo com muitas críticas à atuação de prefeitos e vereadores é nos municípios que as pessoas vivem, e é neles que as coisas acontecem da moradia ao trabalho, da educação à saúde, da segurança ao lazer… Esse momento eleitoral é mais uma oportunidade para discutir os problemas locais, suas causas e conseqüências.

Porém por mais que o contexto seja local não dá para deixar de lado os grandes problemas nacionais e estaduais que impactam de maneira permanente a vida dos municípios que são partes integrantes do pacto federativo. Dá para imaginar os municípios sem a garantia de renda mínima para as pessoas vulneráveis após a pandemia?

Mesmo com toda essa crise econômica e social, já que a política é permanente, tenho algumas sugestões que podem nos ajudar a ter um posicionamento mais fundamentado no conhecimento na hora de fazer as escolhas na urna eleitoral.

Tente se lembrar em quem você votou nas últimas eleições para prefeito e vereador. Quais eram os seus partidos políticos e com quem eles se coligaram na ocasião? Do programa eleitoral apresentado o que foi efetivamente realizado e o que ficou para depois ou por isso mesmo?

Outra sugestão é para que as pessoas listem as coisas com as quais não admitem mais conviver. Por exemplo, a falta de transparência nas comunicações, a ausência de um modelo de gestão na condução dos negócios públicos, as mesmas enchentes que se repetem anualmente, a precariedade das vias públicas, o descompromisso com a saúde e educação, a imobilidade urbana…

Você já tem se deparado com alguns pré-candidatos em suas redes? Eles já estão mostrando suas propostas em algum tipo de mídia? Mesmo com a pandemia ainda no platô o que nos resta é participar do processo para tomar a melhor decisão na parte que nos cabe a favor da dignidade permanente. As coisas começam com a gente.

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Faz tempo que dona Lindalva Paiva cultiva um pé de jabuticaba no quintal de sua casa no bairro de Santa Tereza, em Belo Horizonte. No início ele chegou na forma de uma muda e logo em seguida ficou 10 anos num grande vaso bem à frente do alpendre. A seguir ele foi transferido para uma área mais próxima do fundo do quintal onde já está por outros 10 anos e só tende a prosseguir. Agora o pé de jabuticaba já está bastante frutífero de julho para cá embora muitas jabuticabas já tenham sido colhidas. Estão bem docinhas.

Jabuticabas em Santa Tereza

Como se vê é apenas um pé, mas já faz a alegria de todos que freqüentam a casa, pois, aliás, todos gostam das jabuticabas e sua árvore.

Sabemos também que alguns outros quintais de Santa Tereza possuem um ou mais pés de jabuticaba. O bairro tem em torno de 16 mil habitantes segundo o IBGE.

Jabuticabas

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A Reforma Tributária aparece com muita freqüência a partir do ano 2000 nas análises de conjuntura e cenários de quem trabalha com planejamento estratégico e sua gestão. Estiveram na cena outras reformas e algumas até acabaram acontecendo, como a Trabalhista e a da Previdência Social, que muito desagradaram aos trabalhadores. Enquanto isso a Reforma Administrativa Federal, a Político Partidária e o Pacto Federativo seguem aguardando um momento mais oportuno e conveniente.

O fato é que a primeira parte da proposta da Reforma Tributária enviada pelo Ministério da Economia ao Congresso Nacional em julho se juntará a outras que estão tramitando na Câmara dos Deputados – representante do povo – e do Senado Federal – representante dos estados que formam a União. Vale lembrar que segundo o Dicionário Houaiss reforma é uma mudança introduzida em algo para fins de aprimoramento e obtenção de melhores resultados; nova organização, nova forma; renovação.

As reformas são sempre vendidas como a solução para todos os problemas do país, mas é preciso que se demonstre com fatos, dados, transparência e discussão aprofundada no processo participativo as causas que justifiquem a real necessidade delas. Não dá para fazer isso a toque de caixa sob o argumento de que é preciso equilibrar as contas públicas, que os gastos são sempre crescentes e maiores que a arrecadação. E quando será feita uma análise crítica dos gastos, a começar pelos helicópteros e passagens aéreas, por exemplo?

É preciso conhecer as premissas da Reforma Tributária e seus parâmetros para a União, estados e municípios. Só para ilustrar, podemos verificar que a proposta do Ministério da Economia indica que essa primeira etapa é só para simplificar o processo de cobrança dos tributos federais. Assim veio a proposição da singela fusão do Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS gerando a Contribuição sobre Bens e Serviços – CBS. A alíquota para todos os contribuintes foi fixada em 12%, exceto para os bancos – setor financeiro que será de 5,8%. Dá para entender por que dessa diferença? O setor de telecomunicações está reivindicando de 6% a 7%.

Existe o pressuposto de que não haverá aumento da carga tributária, hoje em torno de 38% do PIB. Mas basta não corrigir a tabela do Imposto de Renda Retido na Fonte, como tem acontecido anualmente, para se ter aumento real da carga tributária. E se o sonho dourado da volta da CPMF vier em nova embalagem sob a denominação de contribuição sobre transações financeiras eletrônicas para desonerar a folha de pagamento salariais das empresas?

A discussão tende a ser longa em função do tamanho da mobilização da sociedade e suas instituições, mas até a divisão do bolo tributário federal precisará ser revista. Hoje a União fica com 55%, os estados com 27% e os municípios com 18% sendo que os dois últimos tiveram um grande crescimento de seus encargos nas últimas décadas.

Será que dessa vez a Reforma Tributária vai chegar nalgum lugar bom? Na Conjuração Mineira a luta era contra 20% do quinto do ouro como imposto.

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Vale a leitura

por Luis Borges 2 de agosto de 2020   Vale a leitura

Quando o desrespeito tem conseqüências

A vida numa sociedade que se diz civilizada deveria ser marcada pelo respeito entre as pessoas que dela fazem parte. Só pelos casos de desrespeito que vem à tona e outros tantos que ficam submersos fica evidente que ainda estamos longe da excelência nesse quesito básico. Nesse sentido chamam a nossa atenção alguns episódios recentes que foram abordados por Élio Gaspari em seu artigo Cidadão, não; engenheiro formado publicado pela Folha de São Paulo.

As câmeras tornaram-se um remédio eficaz para combater os demófobos prontos para aplicar carteiradas sociais no “outro”, hipoteticamente inferior. Ao “você sabe com quem está falando”, o progresso contrapôs o “você sabe que está sendo filmado?”…

Em geral essas cenas de humilhação do “outro” duram poucos segundos e, sem os vídeos, não teriam consequência. Graças a eles, custam caro.

Sonhando com a volta ao bar preferido

A cidade de Belo Horizonte é considerada a capital brasileira dos bares, que estão fechados há mais de 120 dias. Algumas pessoas com quem tenho conversado – observados os padrões de segurança em vigor – manifestam saudades de voltar ao(s) bar(es) preferido(s), mas ainda não vislumbram quando isso será possível e também  não imaginam quantos deles sobreviverão à pandemia. Por outro lado ficamos imaginando como será o novo padrão que os bares sobreviventes utilizarão na volta quanto às distâncias entre as mesas, pessoas sentadas e circulantes, horário de funcionamento, higienização das mãos, uso de máscaras…

É interessante observar o ponto de vista de Juliana Simon no artigo Não, eu não vou ao seu bar agora publicado no blog Siga o copo.

Não faz nem uma semana que os bares e restaurantes estão autorizados a reabrir em São Paulo e já vi alguns bons bares cervejeiros (para ficar somente no tema mestre deste blog) prometendo aquela experiência regada a distanciamento e álcool gel.

Não, obrigada. Eu não vou.

Entendo que é uma necessidade do negócio, que o governo não ajuda e que nem todo mundo consegue levar a casa pra frente com delivery e take out. São empregos e vidas em jogo.

Assim como voltar a frequentar bares nesse período é claramente jogar na roleta da minha saúde e das pessoas que me cercam (as mais próximas, para agravar, do grupo de risco).

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Até onde vai a solidariedade?

por Luis Borges 29 de julho de 2020   Pensata

Estamos no quinto mês de enfrentamento da pandemia da Covid-19 encarando as conseqüências das perdas e danos, ainda que sejam mais para uns e menos para outros. A grande desigualdade na distribuição de renda se escancara mostrando que quanto pior, pior mesmo. A estratégia de sobrevivência exige que se encare um dia de cada vez diante do horizonte próximo cheio de incertezas. A palavra solidariedade tem sido uma das mais faladas durante essa pandemia, principalmente no seu início quando pegou todo mundo de surpresa. Mas quais são as expectativas e as percepções que temos em relação às práticas solidárias em prol do bem comum? Será que essas ações estão conseguindo se sustentar ao longo do tempo ou são apenas uma força auxiliar para minimizar as lacunas geradas pelo sistema capitalista em que vivemos?

Para ajudar a nossa reflexão podemos encontrar no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa um significado para a palavra solidariedade nos verbetes a seguir: “um sentimento de simpatia, ternura ou piedade pelos pobres, pelos desprotegidos, pelos que sofrem, pelos injustiçados etc” e “manifestação desse sentimento, com o intuito de confortar, consolar, oferecer ajuda etc”. No mesmo dicionário também podemos buscar o significado de outra palavra citada com freqüência que é a compaixão“sentimento piedoso exclusivamente humano de simpatia para com a tragédia pessoal de outrem, acompanhado do desejo de minorá-la; participação espiritual na infelicidade alheia que suscita um impulso altruísta de ternura para com o sofredor”.

Nesse sentido destaco, entre fatos e dados divulgados pela mídia no mês de julho, uma entrevista de Gilson Rodrigues, Coordenador nacional do G10 Favelas ao Portal UOL.

“Durante o mês de abril nós recebemos uma série de ajudas de um movimento muito grande de solidariedade no Brasil, que ajudou não só Paraisópolis, mas favelas do Brasil inteiro. Mas nós percebemos a partir de maio e junho que a ajuda diminuiu e, em julho, as doações praticamente pararam.” […]

“Parece até que a gente não sofre outras conseqüências da Covid, como por exemplo, o desemprego e a fome, que aumentou bastante. Para você ter idéia, nós distribuíamos mais de 10 mil marmitas por dia, e às vezes as marmitas acabam e a fila continua. É um desafio muito grande manter esse trabalho e nós não acreditamos em um Brasil diferente ou mais solidário se isso não iniciar agora. Não existe um pós pandemia ou um novo normal sem que a gente pense o normal da favela”.

Se estamos passando do pico para o platô da pandemia vai ficando claro que precisamos de outras medidas mais permanentes do Estado que substituam o auxílio emergencial, por exemplo, pela garantia de uma renda mínima mensal. A solidariedade entre as pessoas é importante, mas não é suficiente pela sua própria natureza.

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O fim de mais um trabalho

por Luis Borges 22 de julho de 2020   Pensata

A senhora Neusa Rodrigues tem 50 anos de idade, é casada, mãe de dois filhos e é cuidadora de idosos há 9 anos. Vale lembrar que essa atividade profissional é exercida por mulheres em torno de 90% dos casos e teve sua regulamentação como profissão totalmente vetada pelo Presidente da República no segundo semestre do ano passado, veto este não derrubado pelo Congresso Nacional.

Antes de exercer essa atividade Neusa trabalhava na área administrativa de uma empreiteira do setor de mineração do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais. Porém desistiu do segmento após longo período desempregada, que acabou por levá-la ao desalento – deixou de procurar emprego. A solução para encontrar uma nova oportunidade de trabalho foi a descoberta de um expressivo mercado de venda de bens e prestação de serviços para idosos de diferentes níveis de poder aquisitivo.

Segundo a lei brasileira, as pessoas idosas são aquelas com idade superior a 60 anos e que hoje são aproximadamente 30 milhões, o que equivale a algo em torno de 15% da população do país. Neusa focou no nicho de cuidadores de idosos e fez um curso básico de formação ministrado pela associação da categoria em Belo Horizonte. Pouco tempo depois ela conseguiu sua primeira oportunidade na atividade indicada pela própria associação de cuidadores de idosos e passou a atuar formalmente segundo os critérios definidos para o Micro Empreendedor Individual – MEI. Ela praticamente não ficou parada mais do que 2 meses entre um trabalho e outro. Na maioria das vezes a causa principal da interrupção da prestação dos serviços foi o óbito do cliente vindo em seguida a deterioração das condições financeiras.

Pensando com seus próprios botões a cuidadora foi percebendo que a vida tem sua finitude e que a qualquer momento seus clientes poderiam chegar ao fim da jornada. Mesmo com essa consciência o fato é que Neusa está há 9 dias sem trabalho devido ao óbito do senhor Alfeu, ou simplesmente Fefeu, cliente do qual cuidou durante os últimos 12 meses. Ele tinha 86 anos, viúvo, funcionário aposentado do poder Judiciário Federal e com importantes restrições em suas condições funcionais. Além do avanço do mal de Alzheimer rumo à fase mais aguda, era hipertenso, portador de DPOC (Deficiência Pulmonar Obstrutiva Crônica) e grandes variações de seus índices glicêmicos ao longo do dia.

Agora Neusa está mais preocupada e imaginando quanto tempo levará para conseguir um novo trabalho – finito, enquanto a pandemia da Covid-19 prossegue trazendo incerteza, insegurança e medo, ainda mais para quem luta pela sobrevivência dia após dia.

E você caro leitor já se imaginou cuidando de uma pessoa idosa, profissionalmente ou não? E se fosse você mesmo é que estivesse necessitando de um cuidador na fase idosa da vida? Espero que seja uma reflexão sem dor.

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