O social no velório

por Luis Borges 16 de janeiro de 2015   Pensata

Segundo a definição do Dicionário Informalsocial é:

aquilo que pressupõe relações, sociabilidade, abarcando relacionamentos, sentimentos, modos de ser, de estar, de agir e de se manifestar. Aplica-se mais às interações humanas significativas para os sujeitos.

Ainda segundo a mesma fonte, velório é:

uma cerimônia fúnebre em que o caixão do falecido é posto em exposição pública para permitir que parentes, amigos e outros interessados possam honrar a memória do defunto antes do sepultamento.

Busquei essas definições após ouvir o depoimento de um amigo, que ficou estarrecido com as cenas que presenciou na última hora de um velório. Ele chegou ao Cemitério Parque por volta das 16h da última terça-feira, acompanhando uma amiga que foi ao local se despedir de um colega de trabalho de 58 anos de idade cuja morte foi causada por infarto agudo do miocárdio. Naquele momento estavam no local aproximadamente 60 pessoas, entre elas a ex-esposa, engenheira civil, e os dois filhos do casal de outrora. A urna estava lacrada atendendo a um desejo do morto, que não queria que seu corpo inerte fosse visto nessa ocasião.

Ao longo do salão e no hall de entrada parentes e amigos conversavam animadamente, dando a sensação de que o morto foi apenas o pretexto para aquele encontro e não para a dolorida homenagem póstuma. Muitos recebiam e outros enviavam mensagens pelo celular e, assim, todos os grupos se mantinham atualizados pelas redes também sociais.

Próximo à porta de entrada, um senhor que dizia ser um dos 14 irmãos do morto, já que seu pai se casara três vezes, falava animadamente de sua fazenda em Lagoa Dourada e enaltecia a falta de chuvas que está facilitando o acesso ao local. Do lado oposto, um pequeno grupo falava do preenchimento de cargos no segundo escalão do Governo de Minas Gerais enquanto, logo depois da entrada, três pessoas discutiam animadamente questões de início de temporada ligadas aos times de futebol de Cruzeiro, Atlético e América.

É claro que enquanto o tempo passava ainda chegavam alguns retardatários e lá fora a turma do tabaco industrializado cuidava do oficio enquanto outros davam um pulo até a lanchonete.

Enquanto a sensação térmica realçava o intenso calor desse início de ano e as animadas conversas prosseguiam, muitos sequer perceberam que a hora final chegou. Alguns se justificariam depois alegando que não houve nenhuma cerimônia religiosa. Explica, mas não justifica, pois os operários do cemitério fizeram boa movimentação ao colocar a urna e as coroas de flores no carrinho fúnebre, que partiu pontualmente na hora marcada rumo ao jazigo.

Quando nada, segundo meu amigo, foi engraçado ver a reação das pessoas ao perceber, com a redução do alarido, que o cortejo já havia partido. Os últimos retardatários deixaram o local no momento em que o grupo da limpeza já começava a trabalhar no local. Um deles disse que o próximo “cliente” chegaria às 18h.

Meu amigo, estarrecido, não acompanhou o cortejo devido a um desconforto nos joelhos e aguardou sua amiga no hall de entrada. Após o seu relato fiquei imaginando como será o ambiente do meu velório e se haverá muita água no rio São Francisco para receber as minhas cinzas na região de Bom Despacho, onde ele cruza a BR-262.

E você já parou para pensar no seu caso? Em função do que você já semeou, será que é possível estimar quantas pessoas comparecerão à sua cerimônia de despedida?

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