O Natal e os gafanhotos

por Luis Borges 25 de dezembro de 2014   Pensata

O dia de Natal está terminando. Celebrei a data confraternizando com família e amigos na capital secreta do mundo, Araxá. Se o pré-Natal já foi muito bom, fui presenteado com um dia melhor ainda na amplitude das fraternas relações. E é bom que seja assim, pois precisamos renovar e acumular muitas energias para superar as dificuldades sistêmicas que atingem a nação nesses tempos.

Minha alegria e satisfação inerentes ao micro-mundo familiar não me deixam esconder a tristeza, que não me desmotiva, ao verificar a nuvem de gafanhotos vivendo da corrupção alastrada e impregnada por todo o país. Me lembro de Chico Buarque, em sua música “Vai passar”

Num tempo
Página infeliz da nossa história
Passagem desbotada na memória
Das nossas novas gerações
Dormia
A nossa pátria mãe tão distraída
Sem perceber que era subtraída
Em tenebrosas transações.

Qualquer semelhança não é mera coincidência, simplesmente está na nossa cultura.

Até quando aguentaremos conviver com tamanha indecência, justificada e ancorada em nome de uma democracia representativa na qual os representados não são ouvidos de maneira participativa pelos seus representantes? Para saber falar é preciso saber ouvir e a transparência tem que ir além do discurso.

Ainda que de maneira difusa, como ocorreu em junho de 2013, é evidente que o pote de mágoa prossegue aumentando e que nada está maravilhoso como é insistentemente apregoado. Imagine o dia em que lideranças dos movimentos sociais conseguirem focalizar e unificar tantas insatisfações. Como será que a nuvem de gafanhotos reagirá na tentativa de ceder os anéis para não perder os dedos, se é que isso bastará?

O Natal está chegando ao fim. Vou em frente vivendo e louvando o que merece ser louvado, mas sem me esquecer da tortura que a nuvem de gafanhotos nos traz e com a certeza de que ela vai passar, ainda que o tempo da história seja maior que o nosso. Mas quem sabe esse tempo nos surpreende e se antecipa. Também depende de nós.

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