E agora, José, o que e como fazer?

por Luis Borges 3 de junho de 2019   Pensata

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou o resultado do PIB do primeiro trimestre de 2019 mostrando que houve uma queda de 0,2% na comparação com o trimestre anterior. Por outro lado, os dados preliminares do segundo trimestre também não são nada animadores. A economia prossegue estagnada, o desemprego segue altíssimo e sem perspectivas de queda, o consumo das famílias só cai, os investimentos estão longe do necessário e a piora das expectativas em relação ao futuro sinaliza que nova recessão econômica pode estar a caminho. Então dá pra imaginar o que pode estar passando pela cabeça das pessoas ao verificar a distância que existe entre a necessidade de crescimento do PIB e os resultados que estão sendo entregues no momento. Há sinais de que o ano poderá ser perdido e que não é suficiente jogar todas as causas nas costas da não aprovação da Reforma da Previdência Social.

Pensando no que e como fazer para prosseguir diante de tantas dificuldades, alertas e ameaças lembrei-me da obra do poeta Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987) nos versos livres da poesia “José”, publicada em 1942, ano de muitas dificuldades na plenitude do Estado Novo, na ditadura de Getúlio Vargas e na Segunda Guerra Mundial. A seguir leia “José”, ou releia, para quem já leu, enquanto fico na expectativa de que surjam contribuições alentadoras para melhor compreender a nossa existência no momento que estamos passando.

José
Carlos Drummond de Andrade

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
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