Oi, oia o trem

por Convidado 8 de maio de 2023   Convidado

por Sérgio Marchetti*

Vem surgindo de trás da fumaça azul. “Oi, oia o trem”, vem fazendo um barulho estrondoso. E atrapalha meu sono, pois a casa em que habito está logo acima da estação — da linda estação, tão judiada pelo tempo, pela chuva, pelo sol e pelo descaso das pessoas que não têm sensibilidade para compreender o valor da memória. E, estou certo de que não sabem que “ A plataforma dessa estação/ É a vida desse meu lugar/ É a vida desse meu lugar/ É a vida…”

Na minha Barbacena amada e desleixada, vejo com tristeza, “da janela lateral do quarto de dormir”, nossas montanhas indo embora. Conto até cem vagões. Depois, desisto de contar. A tristeza me impede de continuar assistindo ao dolorido desfecho de uma ganância sem fim. E, para tão desumana tarefa, incumbiram locomotivas cruéis, se assim posso chamá-las, pois não têm doçura, beleza, bucolismo, e nem mais o piuííí! piuííí! saudoso da Maria-Fumaça. Ao contrário, elas vêm fazendo barulho e demonstrando todo o seu poder. Ferozes, informam com seus apitos ensurdecedores que nada impedirá sua missão, e que irão atropelar quem se arriscar a passar na sua frente. E o trem — fantasia da minha infância —  em sua trajetória, mais parece uma jiboia gigantesca engolindo montanhas e destruindo a natureza. Os vagões, sem vida, cumprem os comandos das perversas máquinas que os escravizam e os puxam num som torturante e ritmado, como se houvesse um metrônomo seguido de uma marcha fúnebre. Assim, acorrentados e engatados, seguem o cortejo levando histórias transformadas em partículas de minério que um dia, em seu esplendor, serviram de palco para fazendas, bosques e histórias de famílias, de um tempo em que nossos trens tinham funções mais nobres de levar e trazer pessoas. “Todos os dias é um vai e vem/ A vida se repete na estação…” ou se repetia, como escreveram Milton e Brant.

 

*Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br

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Recesso

por Luis Borges 14 de novembro de 2021   Sem categoria

O Observação & Análise entra em recesso a partir de hoje. Voltamos no dia 6 de dezembro.

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O último 10 de setembro marcou mais uma vez o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, data criada em 2003 pela Organização Mundial da Saúde e pela Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio. Em função dessa data o Centro de Valorização da Vida (CVV) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) criaram, em 2015, o Setembro Amarelo, campanha brasileira com o mesmo objetivo que chegou ao seu sexto ano de realização. Alguns leitores poderiam até perguntar por que essa campanha é necessária, mas alguns fatos e dados abordados a seguir evidenciam o quanto ela se justifica.

Falar em morte geralmente é um tabu para boa parte das pessoas e quando ela acontece em decorrência de um suicídio parece que o tabu só aumenta. Afinal de contas não é nada fácil tentar entender as razões para uma pessoa decidir antecipar o fim de sua vida intencionalmente.

Segundo a OMS a cada 40 segundos uma pessoa se suicida no mundo e no ano passado aproximadamente um milhão de pessoas praticaram tal ato. É preciso ressaltar que há subnotificação de casos em muitos países. Por outro lado existem estimativas dando conta de que as tentativas fracassadas de suicídio no mundo teriam chegado a 10 milhões no último ano.

Como se vê em função dos dados existentes esse é um problema crônico que precisa ser enfrentado mundialmente. Segundo Antônio Geraldo da Silva, Presidente da ABP, a quase totalidade dos óbitos por suicídio em todo o mundo se relaciona a doenças mentais não tratadas ou tratadas de forma inadequada, em 96,8% dos casos. Transtornos de humor, como depressão e transtorno bipolar, transtornos por uso de substâncias e esquizofrenia são os três mais associados à tentativa de suicídio.

Eu poderia continuar abordando diversas outras dimensões do suicídio, mas o que mais nos desafia na situação atual é o que podemos fazer para ajudar as pessoas que estão precisando de apoio. Como sempre a educação é a base de tudo. É preciso abordar continuamente o tema de maneira preventiva para romper o tabu que o cerca. O setembro amarelo tem contribuído muito nesse sentido. É preciso estar atento para perceber os sinais que as pessoas emitem para pedir ajuda, socorro e ter compaixão, solidariedade para ver e agir diante do problema.

Apesar de tudo o que o país enfrenta na saúde pública, existem alternativas. Um exemplo disso é o CVV, o Centro de Valorização da Vida, trabalho voluntário que existe há 58 anos sempre atendendo, ouvindo e falando pelo telefone no número 188 durante 24 horas por dia. Também existem os Centros de Atenção Psicossocial – CAPS – ligados às prefeituras municipais, os serviços gratuitos de atendimento de algumas universidades e faculdades nos cursos de psicologia e medicina, bem como o de algumas organizações religiosas voltadas para o serviço social. É necessário conhecer o caminho das pedras para melhor orientar quem precisa de tratamento em situações de adversidade. Precisamos combater a inércia, deixar o primado da mera contemplação dos problemas e partir para a ação com método, foco, determinação e constância de propósitos. Que prevaleça o dom da vida!

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Pausa

por Luis Borges 18 de julho de 2019   Sem categoria

O Observação & Análise entra em pausa a partir de hoje. Voltamos às atividades no dia 11 de agosto.

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O forte temporal que ocorreu em Belo Horizonte no finalzinho da tarde da quarta-feira passada (8/3) mostrou mais uma vez como a cidade ainda está despreparada para conviver com esse tipo de fenômeno. De novo ficou visível a falta que a gestão faz, tanto do ponto de vista estratégico quanto operacional. Os relatos mostrados pelos diversos meios de comunicação trazem os mesmos problemas de sempre, que já se tornaram crônicos, e para os quais as autoridades governamentais sempre têm uma justificativa. Geralmente é uma chuva maior do que a esperada, manifestações de todo tipo no Centro da cidade, uma falha num cabinho que derrubou todo o sistema do Centro Operacional da Prefeitura, a pane generalizada nos semáforos, maior quantidade de veículos coincidentemente circulando após a volta às aulas…

Estação Santa Efigênia no dia 8/3. 

Um aspecto pouco abordado pela mídia foi o impacto que a chuva teve para os usuários do metrô em pleno horário de pico, que já é normalmente caótico em dias secos. Um usuário registrou a foto e o vídeo deste post, quando tentava embarcar na Estação Santa Efigênia rumo à Estação Vilarinho, em Venda Nova. Como isso não era possível devido à enorme quantidade de pessoas na plataforma enquanto o metrô chegava lotado, o jeito foi embarcar no sentido Eldorado para tentar pegar o metro mais vazio no sentido contrário.

A “cheiúra” era a mesma, por isso esse usuário resolveu desembarcar na Estação Carlos Prates e retornar para desembarcar na Estação Central. Lá ele foi tentar embarcar num ônibus da estação Aarão Reis com destino ao bairro Morro Alto, em Vespasiano. Esperou mais de uma hora no ponto de embarque e quando conseguiu partir ficou com a sensação de que “saiu do espeto para cair na brasa”. Finalmente chegou em casa às 21:30 horas. No dia seguinte pela manhã, sem chuva, retomou sua trajetória cotidiana enquanto as autoridades governamentais continuavam falando para justificar e explicar mais do mesmo de sempre.

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Vale a leitura

por Luis Borges 25 de maio de 2015   Sem categoria

Autópsia 

Nossa vida se passa regida por uma legislação que nem sempre tem clareza suficiente ou aborda todos os aspectos envolvidos, além de também não ser plenamente conhecida por todos. A morte, que é parte da vida, é abordada pela legislação como sendo decorrência de causa natural ou causa externa. Se natural, bastará a emissão do atestado médico declarando o óbito e, se for externa, exigirá a realização de uma autópsia feita pelo Instituto de Medicina Legal. No texto do blog Morte sem tabu a autora explica os pormenores da lei. Vale a pena entender um pouco mais sobre o assunto, pois poderemos ser surpreendidos pela necessidade de enfrentar uma situação onde esse tipo de conhecimento poderá facilitar a solução de um problema.

Viciados em compras

O impulso caminha na contramão da estratégia e seu estrago costuma ser nada agradável. É o caso que afeta as pessoas que consomem sem planejamento, de maneira incontrolável e que demonstram inconsciência em  relação aos tempos bicudos que estamos vivendo. Muitos casos chegam a ser patológicos nas pessoas que buscam no consumo desmedido as soluções para seus problemas crônicos ou momentâneos. Como você avalia as suas atitudes perante o consumo? Alguma vez você já chegou ao fundo do poço? Leia a abordagem de Márcia Dessen, colunista da Folha de São Paulo, no artigo Viciados em compras.

Quando o ato de comprar passa a ser exagerado, incontrolável e irresistível, o sinal vermelho acende! Você pode ser vítima de um transtorno conhecido como oniomania, quando o consumo diante de um apelo, um evento negativo, resulta em prejuízos significativos no funcionamento social, familiar e financeiro.

Brasileiro simpático 

O sociólogo espanhol Manuel Castells, professor da Universidade da Califórnia, concedeu uma entrevista ao Jornal Folha de São Paulo. Entre suas falas, abordou o que chama de “mito do brasileiro simpático”. Segue um trecho:

Agora, a internet permite às pessoas comunicar-se diretamente sem passar por esses controles, e sem passar por qualquer censura. Ainda que se queira controlar a internet, não se pode.

Eu não creio que no Brasil, com a internet, exista mais agressividade no debate. O Brasil sempre foi agressivo. Nos tempos da ditadura, no final dos anos 60, anos 70, o debate não só era agressivo como se torturavam pessoas diariamente com impunidade.

A imagem mítica do brasileiro simpático existe só no samba. Na relação entre as pessoas, sempre foi violento. A sociedade brasileira não é simpática, é uma sociedade que se mata. Esse é o Brasil que vemos hoje na internet. Essa agressividade sempre existiu.

Na mesma entrevista, Castells fala sobre a crise de representação que vivemos hoje e sobre os movimentos sociais, como a Primavera Árabe e Occupy.

A política e o violino

A corrupção está em pauta no Brasil e no Chile. Nos dois países, as presidentes vieram de organizações políticas de esquerda, cumprem seu segundo mandato e enfrentam crises econômicas e políticas. Os programas que defenderam para se eleger e o que tem sido praticado em seus governos são temas abordados pela economista Mônica Baumgarten de Bolle neste artigo, que começa citando uma frase de Esperidião Amin – “o poder é como o violino. Toma-se com a esquerda e toca-se com a direita”.

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Curtas e curtinhas

por Luis Borges 19 de maio de 2015   Sem categoria

Mais greves de professores

Enquanto se prolongam as greves dos professores das redes estaduais de São Paulo e Paraná, outra greve começa a tomar forma. É a dos professores das Instituições Federais de Ensino Superior filiados à Andes (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior), convocada a partir do dia 28. Entre as reivindicações estão a autonomia universitária, a reestruturação da carreira docente e o reajuste da tabela salarial. Essa é mais uma variável para complicar um pouco mais o Governo Federal no momento em que tenta aprovar o ajuste fiscal no Congresso. É bom lembrar que no dia marcado para o início da greve estarão faltando algo em torno de 35 dias para o final do semestre letivo. Vamos acompanhar para verificar como esse jogo será jogado diante da atual correlação de forças.

Petrobras

A Petrobras anunciou lucro líquido de R$5,3 bilhões no primeiro trimestre deste ano, total R$1,2 bilhões menor do que o de igual período do ano passado. Apesar da euforia inicial de alguns setores do mercado, o que está prevalecendo mesmo é a cautela diante do curto período analisado. Vale lembrar que o lucro sucedeu o prejuízo do trimestre anterior, que foi de R$26,6 bilhões. O que está em alta é a expectativa gerada pelo novo plano estratégico de negócios, que deverá ser divulgado no próximo mês. Especula-se que esse plano terá mais foco na melhoria da operação e gestão da manutenção, embora sejam preocupantes as despesas financeiras decorrentes do autoendividamento, hoje em torno de R$322 bilhões. De qualquer maneira, a empresa vem tendo seu aprendizado após as revelações da Operação Lava Jato, inclusive compondo seu Conselho de Administração sem a participação de Ministros do Poder Executivo Federal. Finalmente!

Crédito online

As empresas de crédito online já são uma realidade no Brasil e prometem facilidades para emprestar dinheiro sem exigir muitas garantias. Ainda que não assumam explicitamente, o fato é que elas têm seus mecanismos próprios para analisar o cadastro em função do CPF apresentado, e o máximo que pode acontecer é o crédito ser negado. Nesse caso, o constrangimento do solicitante também será online. Já para quem for aprovado, existe a exigência de conta corrente em algum dos grandes bancos brasileiros bem como a assinatura eletrônica do contrato. Entretanto uma grande atenção deve ser dada ao prazo do empréstimo e às taxas de juros cobradas, que costumam ser maiores que as dos bancos. Quem não tem foco na educação financeira torna-se presa fácil, principalmente nesses tempos de inflação e desemprego em alta.

Menos cerveja

A Associação Brasileira da Indústria da Cerveja informou que as empresas do setor produziram 923,1 milhões de litros da bebida em abril. O número mostra queda de 8,8% em relação à produção de março e de 12,6% em relação à de abril do ano passado, período que antecedia à Copa do Mundo. Mas, de qualquer maneira, os números não mentem e mostram produção menor em função do encolhimento da economia brasileira.

Rodovias federais

O Ministério dos Transportes estuda a possibilidade de devolver 14,5 mil km de rodovias federais aos estados por onde elas passam. A razão é o fim do convênio que transferiu a manutenção delas da responsabilidade dos estados para a União na década passada. Os trechos dessas estradas equivalem a 19% da malha rodoviária federal e alguns estão em estados com situação financeira ruim, como Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul. Será que essas estradas acabarão indo para o pacote dos serviços públicos cujas concessões serão oferecidas à iniciativa privada em julho?

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O primeiro

por Luis Borges 18 de março de 2015   A história registrou

Há um ano a história registrou a primeira postagem do Observação & Análise. Era um sonho tornando-se realidade após igual tempo de planejamento e delineamento do experimento.

Os leitores que nos acompanharam ao longo dessa trajetória devem estar percebendo que a melhoria contínua existe e merece ser buscada. Esse espaço prossegue fiel à sua crença de não ser proprietário da verdade, mas sim de expor percepções, reflexões e formulações diante das questões que se colocam no dia-a-dia de pessoas e sociedades, em permanente transformação. E peço uma licença poética a Milton Nascimento e Fernando Brant para reafirmar que “se muito vale o já feito, mais vale o que será”.

Deixo aqui agradecimentos aos leitores que tanto nos honram e nos difundem, bem como aos patrocinadores, ambos muito contribuindo para a sustentabilidade desse blog.

Como não poderia deixar de ser, também registro um agradecimento especial a Sérgio Verteiro e Marina Borges, que fazem as coisas acontecer no dia-a-dia, aos colaboradores convidados e ao conselho consultivo formado por Cristina Borges, Gustavo Borges e Igor Costoli.

Para relembrar o primeiro dos nossos 220 posts, clique aqui. 

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Marcha da quarta-feira de cinzas

por Luis Borges 18 de fevereiro de 2015   Sem categoria

O tempo prossegue em seu curso soberano, mesmo medido nos dezesseis diferentes fusos horários que a Terra tem. Por aqui o Carnaval já acabou, mesmo com a resistência de alguns que imaginavam que a quarta-feira de Cinzas não chegaria tão rapidamente.

Para os que gostam e os que não gostam o fato é que já estamos depois do Carnaval e muitas decisões ficaram para ser tomadas a partir de agora. Se é da nossa cultura dizer que o Brasil começa depois do Carnaval, neste ano o Governo Federal já se antecipou e abriu seu saco de maldades bem antes. Tudo foi feito em nome do ajuste fiscal, mas sem assumir explicitamente a sua própria incompetência que faz parte das causas que geraram o problema. Para nós, cidadãos e consumidores, só resta pagar a conta, também depois do Carnaval, na forma de impostos e contribuições obrigatórias num ambiente de perda de poder aquisitivo devido a inflação.

Mas se ainda assim é preciso cantar, lembrei-me de Vinícius de Moraes e Carlos Lyra que se eternizam na musica Marcha da Quarta-feira de Cinzas. Prosseguiremos cantando mesmo, sabendo que “com tempo ruim, também se dá bom dia”.

 

Marcha da Quarta-feira de Cinzas
Carlos Lyra & Vinicius de Moraes
Fonte: site oficial de Carlos Lyra

Acabou nosso carnaval
Ninguém ouve cantar canções
Ninguém passa mais brincando feliz
E nos corações
Saudades e cinzas foi o que restou

Pelas ruas o que se vê
É uma gente que nem se vê
Que nem se sorri
Se beija e se abraça
E sai caminhando
Dançando e cantando cantigas de amor

E no entanto é preciso cantar
Mais que nunca é preciso cantar
É preciso cantar e alegrar a cidade

A tristeza que a gente tem
Qualquer dia vai se acabar
Todos vão sorrir
Voltou a esperança
É o povo que dança
Contente da vida feliz a cantar

Porque são tantas coisas azuis
E há tão grandes promessas de luz
Tanto amor para amar
De que a gente nem sabe

Quem me dera viver pra ver
E brincar outros carnavais
Com a beleza dos velhos carnavais
Que marchas tão lindas
E o povo cantando
Seu canto de paz
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por Sérgio Marchetti

E o Carnaval chegou. Carnaval é comédia, espontaneidade. E o ridículo, no Carnaval, é quem não está ridículo. Vale o deboche, as caricaturas que mostram verdades. Figura e fundo, sombras e luzes – tudo se mistura e tem valor na decoração carnavalesca. Adoro o Carnaval. Adorava, melhor dizendo. Já participei intensamente, apaixonadamente de bailes, de blocos e até de escola de samba. Gostava dos sambas e das marchinhas. Cantava todos de cor e salteado. Com esta frase dá para saber que faz tempo. Queria ter vivido na época dos corsos, pois representam a origem da festa carnavalesca.

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Foto: Marina Borges

Eu amava os salões cheios de gente bonita e cheirosa. Sempre achei que o Carnaval era a festa mais democrática que existia. Todos podiam ser felizes e sair pelas ruas, sozinhos ou em bando. Hoje, Carnaval é outra festa. O luxo das fantasias deu lugar à nudez. Era mais inocente. A brincadeira se transformou, e os “ficantes” vão para as ruas para exercer o hedonismo sexual. É uma licença frenética. Não tem nada de poética. “…Mas é carnaval! Não me diga mais quem é você! Amanhã tudo volta ao normal…” e é assim mesmo. “Quero me perder de mão em mão, quero ser ninguém na multidão.” O que era refrão virou atitude. Mas cada um sabe de si. Então vamos cantar, pois quem canta seus males espanta, mesmo que os presságios para 2015 não sejam os melhores; sem contar com a falta d’água. Ainda bem que cachaça não é água… “Pode me faltar tudo na vida… só não quero é que me falte a danada da cachaça.” E “…pra frente é que se anda…

Vamos viver uma coisa de cada vez. O povo brasileiro está mais triste. Mas apesar de tantos pesares, ou “apesar de você, amanhã há de ser outro dia…” Dia de alegria, afinal “o importante é ser fevereiro e ter Carnaval pra gente sambar”. Esquecer as mágoas, vestir fantasias e tirar a máscara gasta e surrada que usamos o ano inteiro. É isso mesmo. Muita gente tira a máscara somente no Carnaval. Então vamos entrar no primeiro bloco que surgir. “Ô abre alas que eu quero passar. Eu sou da Lira não posso negar…” “… e este ano não vai ser igual àquele que passou. Eu não brinquei. Você também não brincou…”. O Carnaval era brincadeira, liberdade para se apaixonar. Era início de uma paixão e fim de namoro. Mas depois tudo voltava ao normal. Havia o perdão. Mas, pudera, nos salões havia mulheres lindas que encenavam peças com “o Pierrot apaixonado que vivia só cantando e que por causa de uma colombina, acabou chorando…”. As bandinhas tocando marchinhas provocativas. Era o paraíso na terra: “tanto riso, ó quanta alegria, mais de mil palhaços no salão. E o arlequim está chorando pelo amor da colombina no meio da multidão”. E vinham o estribilho e a felicidade dos foliões: “vou beijar-te agora, não me leve a mal, hoje é Carnaval.” Arrepiante! E alguém que flertava em busca de um namoro, tirava a sorte cantando: “eu perguntei a um mal-me-quer, se meu bem ainda me quer. Ela então me respondeu que não. Chorei, mas depois eu me lembrei que a flor também é uma mulher. Que nunca teve coração…”.

Assim era a festa do povo, três dias de total libertação. Baile a noite inteira. “São três dias de folia e brincadeira. Você pra lá e eu pra cá, até quarta-feira”.  E depois o mundo tornava a começar. “Mas quarta-feira tem um ano inteiro é todo assim, por isso quando eu passar batam palmas pra mim…”. E faltar água não é nenhuma novidade. Mas o povo pedia: “tomara que chova três dias sem parar”. O brasileiro sempre foi assim. Riu e ri da própria desgraça. Mas com “chuva, suor e cerveja” resolve seus males.

Alegorias, adereços, harmonia…  Tudo era, literalmente, fantasia e, se surgia uma bela mascarada, havia repertório para abordá-la: “linda pastora, morena da cor de Madalena. Tu não tens pena de mim que vivo tonto com o seu olhar…”, “…Morena que me faz penar a lua cheia que tanto brilha, não brilha tanto quanto o seu olhar”. E a lourinha? “Lourinha dos olhos claros de cristal, desta vez em vez da moreninha serás a rainha do meu carnaval”. Mas estamos no Brasil e “a mulata é a tal… e só dá ela, eie, eie eie, eie eie, eie, na passarela…” .Salve! Braguinha!

Fora dos clubes havia os blocos organizados, e “lá vai meu bloco vai, só desse jeito é que ela sai…”, “…e o sereno vem caindo. Cai, cai sereno devagar, que o meu amor está dormindo...”. E tudo podia naqueles dias. Ainda pode. “Olha o bloco do sujo que não tem fantasia, mas que traz alegria para o povo sambar…”.

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Bloco de rua em BH no carnaval de 2014. / Foto: Marina Borges

E aí, meu caro leitor, sentiu saudades dos antigos Carnavais? Nada de tristeza! “Tristeza, por favor vá embora.. .”, “…Vê, estão voltando as flores. Vê, nessa manhã tão linda. Vê, como é bonita a vida. Vê, há esperança ainda”. Então, o que está esperando? Ponha seu bloco na rua, “bote para quebrar e gemer”. Dê uma chance para sua endorfina.  Ah! Você quer paz? Então usufrua da energia dos dias de folia da maneira que lhe convier.  “Na rua, na chuva, na fazenda, ou numa casinha de sapê…”.

Deixo, como reflexão para os foliões, uma homenagem ao maravilhoso samba enredo da Beija Flor de Nilópolis, em 2003. “Chega de ganhar tão pouco /tô no sufoco: vou desabafar/ pare com essa ganância, pois a tolerância /pode se acabar…”.

Assim seja!

Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui Licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br 

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