Após dois anos de pandemia da Covid-19, que não acabou e prossegue firme com seus desdobramentos em variantes e sub-variantes, como estão as nossas percepções sobre a fidelidade dos clientes em relação a seus fornecedores? Como se sentem os usuários de serviços, concedidos ou não, como energia, telecomunicações, saneamento, transporte coletivo, cartórios… que são tratados na modalidade “É o que temos para hoje” ou “É pegar ou largar”?

A premissa geral é de que cabe ao cliente avaliar a qualidade de um bem ou serviço recebido de seu fornecedor, mesmo quando tratado como usuário (não tem opção) ou paciente (na área da saúde).

Acontece que, em vários setores da economia, a concorrência é bem mais aguçada, a sobrevivência está sempre em jogo (imagine na pandemia!) e o melhor dos mundos é fidelizar um cliente. E, para isso, o fornecedor também deve fazer a sua parte para encantá-lo. Entretanto, o fornecedor deve ter em mente que o cliente só será fiel enquanto for bom para ele, desde que seu poder aquisitivo lhe permita fazer escolhas.

Nesse sentido, um caso interessante do qual tomei conhecimento foi o de um cardiologista que atende por um plano de saúde bem conhecido. Ao tentar agendar uma consulta, o paciente foi informado que só existia vaga para dali a três meses. “Como assim?”, perguntou assustado o paciente que frequenta o consultório há 20 anos.

A secretária do profissional disse que marcaria a consulta para garantir a data e que poderia tentar um encaixe se houvesse alguma desistência. Lembrou, também, que a fila de espera estava grande. Ao argumentar que tinha uma urgência para a consulta o paciente foi informado da existência de espaço na agenda para atendimento particular. Nessa modalidade existia um horário no finalzinho da tarde e outro no início da manhã do dia seguinte com o preço de 700 reais com recibo e de 600 reais sem recibo, mas com eletrocardiograma incluído. É claro que os exames de apoio ao diagnóstico poderiam ser feitos através do plano de saúde.

Como foi a terceira vez que isso aconteceu com membros da família que fazem parte do plano de saúde, a decisão geral foi por trocar o excelente cardiologista, porém inacessível.

E não é que um outro profissional da cardiologia que atende pelo mesmo plano de saúde foi encontrado após a indicação de uma pessoa amiga? A primeira consulta foi ótima, atendeu bem as necessidades e expectativas, inclusive por não existir separação entre clientes privados e de planos de saúde ao se fazer um agendamento.

Ah! Ele aceita retorno da consulta ao longo dos 30 dias seguintes, o que já não acontecia com o profissional “demitido”.

E você, caro leitor, já viveu ou conhece alguém que passou por situação semelhante?

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Passagem mais alta, mais dificuldades

por Luis Borges 7 de fevereiro de 2022   Pensata

A Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra) do governo de Minas Gerais informou no sábado, 29 de janeiro, um aumento de 13% no preço das passagens dos ônibus que fazem o trajeto entre os municípios da região metropolitana de Belo Horizonte e a capital para vigorar a partir da zero hora da segunda-feira, 31 de janeiro. Menos de dois dias depois.

A prática é a mesma de sempre, entra governo sai governo. Nenhuma transparência, nem para anunciar o aumento com mais antecedência e nem para mostrar a planilha real dos custos dos transportes coletivos. A justificativa básica para o aumento de 13% foi a inflação anual, com destaque para o preço do óleo diesel. Além disso, veio a renovação da promessa feita há seis meses, ainda não cumprida, da volta do quadro de horários para os níveis vigentes antes da pandemia, a partir de 1º de fevereiro. A passagem mais usada passou a custar R$6,60 enquanto a mais cara está em R$8,60 e a mais barata em R$5,80. O sindicato das empresas queria um aumento de 53,36% no preço das passagens.

De vez em quando surgem denúncias na mídia mostrando alguém usando sombrinha dentro do ônibus em dia de chuva, pneus “carecas” e superlotação. Em um desses casos recentes, quando houve um acidente no trajeto entre Ribeirão das Neves e Belo Horizonte, havia 93 pessoas dentro do ônibus no momento da ocorrência.

Como se sabe muitos são os moradores dos municípios metropolitanos que trabalham em Belo Horizonte no modo formal e informal. Também sabemos do tamanho do desemprego, do desalento e do crescimento da informalidade por uma questão de sobrevivência. Por outro lado, a inflação alta, a não correção da tabela do imposto de renda, o congelamento dos salários de servidores públicos federais e estaduais e os reajustes abaixo da inflação para a maior parte das demais categorias desenham um quadro de grande perda do poder aquisitivo. A classe média, por exemplo, está cada vez mais achatada. Nesse quadro, o aumento pode dificultar ou até inviabilizar a contratação de serviços domésticos, como diaristas, jardineiros, encanadores e outros.

Se observarmos o caso de um prestador de serviços por diária que mora no vetor Norte de Belo Horizonte e precisa tomar um ônibus e o metrô de superfície para trabalhar no bairro do Prado, por exemplo, o custo diário de transporte fica em torno de R$22,20. Se o valor ficar por conta do contratante, ele deve ser somado à diária da prestação de serviços, que varia de R$140,00 a R$160,00 reais. Dá para ver o peso no orçamento debilitado de quem pensa em contratar um prestador de serviço nesse momento tão difícil em que o calo dói com intensidades diferentes para a imensa maioria das pessoas. No caso de um empregado doméstico mensal o transporte durante 22 dias fica em R$488,40 enquanto um diarista trabalhando 4 dias por mês custa R$88,80. E se a pessoa prestar serviços sem cobrar à parte o transporte, seus ganhos ficam ainda mais prejudicados.

A rádio Itatiaia ouviu, na semana passada, alguns trabalhadores de municípios do vetor Norte falando de dificuldades para prestar serviços devido ao custo do transporte. Os contratantes estão procurando pessoas que moram mais próximas do local de trabalho e que gastem apenas uma passagem de ônibus ou metrô em cada trajeto.

As coisas só estão piorando enquanto prevalece a insensibilidade dos governantes perante o nosso grave quadro social neste ano eleitoral.

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O telefone fixo ficou mudo

por Luis Borges 24 de janeiro de 2022   Pensata

Depois do grande volume de chuvas no início deste ano em Belo Horizonte, região metropolitana e diversas partes do estado de Minas Gerais, a contabilização dos enormes prejuízos e a expectativa de mitigação do nível de estragos sobrou para todos, porém de forma bastante desigual. Fica o lamento pelas inúmeras perdas humanas, que são irrecuperáveis.

Se no plano coletivo foi o que vimos, individualmente também podemos registrar problemas que enfrentamos em nossas moradias, por exemplo. No meu caso específico posso citar o portão eletrônico da garagem parando na metade do percurso, umidade excessiva, infiltração de água no canto da parede da sala e o telefone fixo totalmente mudo durante 4 dias.

Nesse caso, vale a pena relatar as emoções vividas no paciente processo de tentar dialogar com a operadora de telefonia, que é sempre rigorosa quanto ao pagamento da conta da assinatura até a data do vencimento.

Inicialmente imaginei que a linha telefônica ficaria pouco tempo fora do ar, que seria uma intermitência pequena e que tudo voltaria rapidamente ao normal.

No segundo dia pensei em reclamar na operadora, mas desisti quando imaginei que perderia uma ou duas horas ao longo do processo, como já ocorreu outras vezes.

No terceiro dia, telefone ainda mudo, fiz contato pelo atendimento ao cliente – pessoa física – e lá pelas tantas a ligação caiu, o que provocou minha desistência de outra tentativa.

Finalmente no quarto dia de telefone inoperante resolvi que enfrentaria a operadora pelo tempo que fosse necessário, inclusive para refazer ligações caso a linha caísse. Fiquei de 9 às 10 horas da manhã na linha com a operadora, que fez todos os testes previstos em seu procedimento operacional padrão.

Como o telefone continuou mudo, a atendente reafirmou que não havia problemas na rede e que enviaria um técnico para avaliar as instalações internas da casa. Nesse caso, seria gerada uma taxa de 90 reais pela visita caso se constatasse que a causa da mudez fosse interna. Tudo ficou agendado para a manhã do dia seguinte, entre 8 e 11 horas.

Surpreendentemente por volta das 13 horas do mesmo dia o telefone tocou e, quando atendi, a funcionária da operadora perguntou se o aparelho estava funcionando. Disse que sim, pois estávamos falando por meio dele. Ela aproveitou para dizer que a área técnica da empresa fez alguns testes e sanou uma falha detectada.

Diante do ocorrido, a visita técnica marcada para o dia seguinte foi cancelada. Perguntei pelo desconto dos dias mudos na próxima fatura e fui orientado para fazer uma nova ligação para solicitar o crédito.

Com tudo isso, fiquei pensando em alguns aspectos ligados à telefonia fixa, a começar pela crescente queda na quantidade de usuários. Segundo o site Teleco em novembro de 2021 o número de acessos em serviço era de 28,9 milhões. No auge do sistema, em 2014, esse número chegou a 45 milhões. Por outro lado, estima-se no setor que esse número poderá cair para 20 milhões nos próximos 5 anos.

A onipresença do celular e da internet podem ser causas da migração de usuários. O atendimento prestado ao cliente, porém, pode ter grande peso nessa desistência pelas linhas fixas. Fica a reflexão.

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Um pequeno balanço na virada do ano

por Luis Borges 10 de janeiro de 2022   Pensata

Faz parte da nossa cultura, em diferentes intensidades e modos, que as pessoas separem um pouco de tempo perto da virada de cada ano – e não deveria ser só nessa época – para observar e analisar como foi a sua vida no período.

Os pensamentos e reflexões pululam e realimentam os sonhos, propósitos, objetivos e metas para o próximo ano que já estará começando. Esse também é um momento de olhar para trás, ainda que muitos não gostem de fazer isso, para aprender com os erros e acertos para melhor prosseguirmos em nossos projetos de vida. Aliás, esses projetos precisam ser colocados em movimento para que não fiquemos apenas numa autodeclaração de boas intenções, sem avaliação dos resultados nunca alcançados e sem verificar as suas causas.

Comigo não foi diferente e por isso mesmo pensei, refleti e avaliei muito nos últimos dias do ano passado o que foi bom e o que “deu ruim” em minha travessia no período que estava se acabando.

Vou citar aqui quatro pontos dos muitos que me ocorreram. Um primeiro ponto se refere à conjuntura brasileira na virada de 2020 para 2021, quando era grande a expectativa em relação ao início do processo de vacinação contra o vírus da Covid-19, que acabou se iniciando na segunda quinzena do mês de janeiro.

Eram grandes a incerteza, a insegurança, a ansiedade e o medo da maioria das pessoas diante do risco da contaminação e suas consequências. Agora que o ano passou e já tomei três doses da vacina – mas sabedor de que a pandemia não acabou – persisto preocupado com as novas variantes do vírus que vão se sucedendo e a demora para começar a vacinação de crianças de 5 a 11 anos.

O segundo ponto está no olhar para a economia brasileira ao longo do ano. Ficou visível a consolidação da perda do poder aquisitivo e a obrigatória necessidade de adequar o orçamento a partir do questionamento de gastos. Foi preciso revisar e reduzir as contas de telefones, fixo e celular, TV a cabo, internet, plano de saúde, consumo de água, energia elétrica… A estratégia foi e continua sendo de sobrevivência, pois sabemos como será difícil o ano eleitoral de 2022 e ainda mais com o crescimento econômico tendendo a zero.

O terceiro ponto está ligado às atitudes perante as medidas sanitárias para combater a transmissão do coronavírus a partir do distanciamento/isolamento social, uso de máscaras bem como a necessidade de evitar as aglomerações de diversos portes. É claro que o avanço da vacinação, aliado aos cuidados preventivos, contribuiu para a flexibilização das medidas de saúde pública. Mas ficou para cada um de nós a decisão sobre como retomar os encontros com outras pessoas e em qual quantidade, frequência e tipo de local. Concluí que vou continuar priorizando as ações a favor da segurança sanitária.

O quarto ponto a destacar é como ficou o meu e o seu nível de compaixão e solidariedade com as pessoas mais atingidas pelo aumento da fome, da insegurança alimentar e pelo incremento da linha da pobreza. O que foi e como continuará sendo encarar de frente os pedidos de ajuda feitos pelas pessoas nas portas das padarias, sacolões, açougues, farmácias e supermercados, por exemplo?

Será que ajudei conforme a minha capacidade ou poderia ajudar mais e sem questionar imaginariamente a destinação que seria dada à aquela ajuda? De qualquer maneira tudo toca o coração quando ainda tenho a capacidade de me indignar e de ficar atento para não cair na indiferença.

E você caro leitor, como ficou seu balanço de virada do ano?

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Se você fosse ouvido por um instituto de pesquisa durante um levantamento para retratar um determinado instante do tempo, o que diria se a pergunta fosse “quais são as suas preocupações nesta virada do ano”? Por acaso estariam entre elas o aumento da pobreza, do desemprego e da fome? Apareceria na sua resposta a economia que nunca deslancha e é cada vez mais marcada pela estagnação com inflação alta? Em que sequência apareceriam as preocupações com a educação, saúde, segurança, combate à corrupção e reforma política, por exemplo?

Pelo que tenho visto em algumas pesquisas confiáveis divulgadas por agora fica disparada em primeiro lugar a preocupação com o aumento da pobreza e da fome. Em segundo lugar, mais abaixo, aparece a economia que não cresce.

Observando e analisando os fatos e dados vai ficando clara a consolidação das perdas do poder aquisitivo causadas pela alta inflação. Retrato disso é que, em média, 70% das categorias trabalhistas não conseguiram negociar ajustes salariais para repor a inflação. Junte-se a isso a não correção da tabela do Imposto de Renda das pessoas físicas, o que já acontece há 7 anos. Na prática, um aumento de carga tributária. No cálculo da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal a defasagem na correção da tabela nos últimos 25 anos (1996- 2021) chegou a 130% e gerou uma arrecadação extra para os cofres públicos de R$149 bilhões. Ainda segundo a Unafisco, se a correção tivesse sido plena, estariam isentos de pagar imposto de renda os ganhos até R$4.469,02 ao invés dos atuais R$ 1.903,98. Na faixa superior da tabela estariam sujeitos à alíquota de 27,5% os ganhos acima de R$10.948,96 e não os atuais R$4.664,69.

A proposta de reforma ampla do Imposto de Renda enviada pelo Ministério da Economia à Câmara dos Deputados em junho de 2021 tentava fazer uma tênue correção da tabela, mas empacou no Senado e foi colocada na “geladeira” pelo senador Ângelo Coronel (PSD-BA), relator da proposta. Para evitar o vácuo deixado, o relator apresentou em 15 de dezembro de 2021 um novo texto tratando apenas da tabela do Imposto de Renda, que deve começar a ser discutido pelos senadores a partir de fevereiro de 2022 após o fim das férias dos parlamentares. Essencialmente entre as proposições estão o limite de isenção para quem ganha até R$3.300 mensais, a extinção da alíquota de 7,5%, a manutenção das demais alíquotas, sendo corrigidas em 13,6%, o que elevará a alíquota máxima de 27,5% para R$5.300,00 ao invés dos atuais R$4.664,68. Faz parte também a correção automática da tabela toda vez que a inflação acumulada chegar a 10%. A ideia é que tudo entre em vigor em 2022.

Se tudo der certo, será que isso estará aprovado antes das eleições ou é apenas mais um canto de sereia no tempo que não deixa de passar? Enquanto isso a cada mês consolidam-se as perdas do poder aquisitivo praticamente sem perspectivas de serem recuperadas numa conjuntura em que prevalecem as estratégias de sobrevivência num verdadeiro “salve-se quem puder” pois “o trem tá feio mesmo”. Basta olhar para a drástica redução da classe média e o grande aumento da base da pirâmide social.

E você, caro leitor, como avalia o seu caso diante dos fatos e dados aqui citados?

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Natal, carestia e famélicos

por Luis Borges 6 de dezembro de 2021   Pensata

O ano caminha para o fim, sinalizado pela chegada do Natal precedido pela preparação que o advento propõe. Nesse tempo miramos o renascimento e o fortalecimento da esperança em tempos melhores que precisam chegar. Nada é tão bom que não possa ser melhorado e nem tão ruim que não possa ser piorado.

Parto da premissa de que tudo começa com a gente e depende de nós a partir do indivíduo, da família e do coletivo social com o devido respeito às pessoas e às regras do regime democrático numa sociedade civilizada. Pensando e refletindo sobre isso acabei olhando um pouco para trás no tempo, mais precisamente para o Natal do ano passado, que já foi tão difícil. Lembrei-me das condições de contorno em relação ao enfrentamento da pandemia da Covid-19, ainda sem vacina, mas com as agora já clássicas medidas de saúde pública para conter o vírus – uso de máscara, de álcool em gel, adoção do distanciamento social, o “não” às aglomerações, o trabalho remoto, o “se possível, fique em casa”…

Agora, um ano depois, o Natal acontece sem que a pandemia tenha acabado e uma espada paira sobre nossas cabeças com a presença de mais uma variante da Covid-19, a ômicron, que continua a nos exigir cautela e manter as precauções e cuidados diante de tantas possibilidades de aglomerações nos eventos dessa época do ano. Lembremo-nos desses mesmos eventos em igual período do ano passado.

Por outro lado, por tudo que o Natal possa significar para as pessoas em diferentes aspectos, não dá para ignorar as condições políticas, econômicas e sociais que nos afetam direta e indiretamente neste Natal. Os fatos e dados escancaram o desemprego, o trabalho informal crescente, o aumento da carestia diante da alta inflação e a consequente perda de poder aquisitivo. A fome e o aumento dos famélicos mostram como se acentuam a desigualdade e a péssima distribuição de renda, que só aumentam a quantidade de pessoas na base da pirâmide social e sua distância para os poucos que estão em seu nível mais alto.

Por mais realistas e esperançosos que sejamos, fica claro que precisamos unir forças e lutar pela retomada do crescimento da economia estagnada há sete anos, por uma política energética que não se baseie no preço internacional do petróleo, no combate permanente ao desmatamento e à degradação ambiental…

Enfim, é tempo de Natal, mas não dá para ser feliz assim com tantos incômodos, preocupações, incertezas e medos, até de sair às ruas, e ainda tendo de se lembrar dos cuidados obrigatórios para manter a saúde mental. Haja resiliência, mas desistir jamais.

Quem sabe, que tal começar a imaginar os cenários para o próximo Natal no ano eleitoral de 2022? Como canta Gilberto Gil em sua música Viramundo (1967)

“Ainda viro este mundo em festa, trabalho e pão”.

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Uma vendedora sem treinamento

por Luis Borges 10 de novembro de 2021   Pensata

Algumas vezes tenho insistido neste espaço que os clientes esperam receber de seus fornecedores de bens e serviços tudo o que foi solicitado conforme as especificações feitas, com preço justo e que a entrega aconteça no prazo combinado. Imagine a insatisfação de qualquer cliente, por mais complacente que ele seja, quando pelo menos uma dessas três dimensões não é atendida plenamente! Alguns clientes até tentam entender as causas do efeito indesejável, ou seja, do problema gerado. Com certeza o gerente do processo deveria resolver o problema após identificar a suas causas, para estancar as perdas que decorrem dele, inclusive a perda do cliente.

Exemplifica bem essa situação o caso de um cliente de uma loja que comercializa tintas para pintura de paredes de imóveis na região Leste de Belo Horizonte. A construção civil está retomando o crescimento em meio a uma alta inflação, inclusive no setor, e falta de alguns insumos que, quando reaparecem, voltam mais caros. Assim, atrasos de cronogramas tornam-se inevitáveis, até mesmo para fazer o reequilíbrio orçamentário.

Esse cliente comprou duas latas de tinta com a capacidade de 18L, na cor branco neve, e saiu da loja rapidamente sem conferir a especificação do bem adquirido. Como sempre, estava com muita pressa na “correria louca” do seu cotidiano. Tão logo o pintor de paredes recebeu a tinta já foi dizendo que a cor estava errada, pois veio branco gelo. Mesmo diante da falta de tempo e da necessidade da continuidade da pintura, o jeito foi voltar rapidamente à loja para efetuar a troca das latas para a cor branco neve.

A chegada à loja foi o início de um verdadeiro calvário. O estacionamento para veículos dos clientes estava com as três vagas ocupadas e sem previsão de alteração. O jeito foi procurar outro local para estacionamento nas proximidades. Passaram-se 15 minutos até o cliente finalmente entrar na loja. Todas as atendentes do balcão estavam ocupadas e 10 minutos depois é que uma delas ficou disponível. Como se tratava de uma devolução, com geração de crédito no sistema operacional, ela sentiu-se insegura alegando que não conhecia o processo. Estava há menos de um mês trabalhando na loja e o sistema é diferente daquele que ela utilizava em seu trabalho anterior. Só lhe restou pedir ajuda a uma colega, o que foi iniciado após a conclusão do atendimento do cliente que já estava em andamento. Lá se foram mais 10 minutos de espera. Finalmente começou um treinamento no padrão de lançamento de crédito que não era escrito, e cada empregado faz do jeito que entende até conseguir concluir a tarefa. Após mais 10 minutos a vendedora se sentiu em condições de fazer a operação.

Lançado o crédito no sistema foi possível dar saída no estoque das latas de tinta na cor branco neve. Outros 10 minutos se passaram para que um Auxiliar de Serviços Gerais levasse as latas até o carro do cliente, que estava estacionado a dois quarteirões da loja. O cliente acabou gastando quase 1 hora do seu precioso tempo para fazer a troca das latas de tinta, mas poderia ser bem menos se a vendedora da loja tivesse sido treinada no Padrão Operacional do Processo (POP) ou se a mercadoria tivesse sido conferida antes de sair da loja. Obviamente nem teria sido necessária a troca.

O treinamento continua sendo essencial no sistema de gestão de qualquer negócio, seja ele micro, pequeno, médio ou grande, público ou privado. Continuamos longe da excelência, mas não podemos desanimar.

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A sobrinha e a tia idosa

por Luis Borges 26 de outubro de 2021   Pensata

Todo dia é dedicado à lembrança de uma ou mais coisas de natureza variada e foi assim que passamos pelo primeiro de outubro, Dia do Idoso. Vale lembrar que a lei brasileira considera idosas as pessoas com idade a partir dos 60 anos. Estima-se que o Brasil tem, hoje, aproximadamente 28 milhões de idosos e que esse número chegará a 43 milhões em 2031. Diante de tantas consequências políticas, econômicas, sociais e culturais que isso tem, de vez em quando surge alguém propondo que a idade limite seja elevada para 65 anos devido ao aumento da expectativa de vida. Apesar desse tipo de proposição, é importante conhecer onde, como (com quais condições?) e com quem (ou sozinhos?) vivem os idosos brasileiros.

Ajuda-nos a tentar encontrar respostas para essas perguntas, ainda que a título de ilustração, um caso do qual tomei conhecimento recentemente. Trata-se de uma senhora de 86 anos, solteira, servidora pública aposentada e sempre muito determinada em seus propósitos. Faz tempo que ela mora num apartamento de 100 m², com 3 quartos, numa movimentada rua no Centro de Belo Horizonte. Há seis anos ela teve importantes perdas em suas condições funcionais e passou a viver – ou sobreviver – numa configuração bem diferente do que era até então.

Uma sobrinha, hoje com 50 anos, passou a ser sua procuradora e resolve monocraticamente todas as questões relativas às coisas de sua vida. Ela montou uma estrutura operacional que conta com uma empregada doméstica, uma cuidadora de idosos para as noites de segunda a sexta-feira e outra para os finais de semana. A sobrinha também recebe os proventos da aposentadoria e dos aluguéis de dois apartamentos que a tia possui no bairro dos Funcionários. Acontece que a sobrinha resolve praticamente tudo a distância. Conta essencialmente com a empregada doméstica para as compras diárias, inclusive de medicamentos e itens de higiene pessoal, e assim chega a ficar até três semanas sem visitar a tia. Quando ela aparece por lá, a tia começa a reclamar das coisas e logo recebe réplicas em tom de ameaça por parte da sobrinha, que diz que ela será encaminhada para uma Instituição de Longa Permanência para Idosos- ILPI.

A tia, em seus tempos áureos, sempre esconjurava essa alternativa de moradia e, portanto, logo fica em silêncio diante da ameaça. Instantes depois a sobrinha dá um jeito de ir embora alegando que tem muitos outros afazeres.

Dessa história, gostaria de chamar atenção para o pré-conceito em relação às moradias para idosos e proponho uma reflexão.

É claro que existem instituições privadas de variados modelos, em função do poder aquisitivo de cada cliente, e também as filantrópicas, com as contribuições possíveis de cada morador, caso ele tenha condições. Melhor seria que as pessoas em geral tentassem conhecer melhor as moradias e centros de convivência para idosos, pois muitos de nós também poderemos precisar delas num futuro que se avizinha a cada dia. Até mesmo a sobrinha da tia idosa de hoje, que alias será a sua herdeira .

Nunca nos esqueçamos que o idoso quer carinho, atenção e tratamento digno, sem essa de ser infantilizado ou iludido com a lembrança de que está na “melhor idade”.

E você, caro leitor, o que acha de tudo isso? Será que isso só acontece com os outros que chegaram à fase idosa da vida?

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“Se muito vale o já feito, mas vale o que será. E o que foi feito é preciso conhecer, para melhor prosseguir”

É o que dizem Milton Nascimento e Fernando Brant na música O Que Foi Feito Devera, de 1978. Eles nos inspiram a pensar e agir neste momento em que o processo de vacinação contra a Covid-19 e suas mutações ganha velocidade.

As pessoas imunizadas com a primeira dose da vacina já passam de 152,32 milhões e as com a segunda dose ou dose única superam 106,87 milhões. Sem contar a dose de reforço, que chega a cada vez mais pessoas.

Diante disso passamos pela flexibilização das medidas de segurança sanitária que foram fundamentais para o combate ao vírus e a sua disseminação. São visíveis os resultados alcançados, apesar de todos os pesares e perdas. Mas a pandemia ainda não acabou e a Organização Mundial da Saúde nada disse em contrário até o momento. Inegavelmente existem diferentes situações na terra globalizada e também diferentes atitudes perante a pandemia, inclusive a de não se vacinar.

O avanço da vacinação mostra seus reflexos na redução das internações nas enfermarias e UTIs dos hospitais bem como na redução da velocidade de transmissão do vírus. Assim, estados e municípios começam a flexibilizar as regras de segurança. Apesar de alguns balões de ensaio pra suspender uso de máscaras e higienização das mãos, os infectologistas e demais especialistas recomendam que seu uso siga permanente, sobretudo em locais fechados e pouco ventilados.

Diante disso o que esperar do comportamento das pessoas que cumpriram disciplinadamente as medidas de segurança sanitária e ficaram em casa sempre que puderam? Será que quem passou pela incerteza, insegurança e medo diante de tantas perdas materiais e humanas, estaria agora com muita ansiedade para rapidamente tirar o atraso em relação ao que deixou de fazer anteriormente? Nesse sentido ainda continua válido pensar em como as nossas escolhas individuais terão consequências para a coletividade. Mas são perceptíveis muitos sinais de pessoas que estão indo com muita “sede ao pote” depois de terem feito tudo conforme os padrões sanitários.

Lembrei-me de um casamento ocorrido numa cidade do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais no sábado em que começou o feriadão comemorativo da padroeira do Brasil. O casamento havia sido adiado duas vezes e a empresa contratada para fazer a festa deu um ultimato, dizendo que não negociaria um novo adiamento. A festa acabou sendo feita para 200 participantes, a metade do que era previsto inicialmente.

Em torno de 20% dos participantes entraram no local usando máscaras. Quatro deles relataram olhares atravessados dos que dispensavam o equipamento de segurança, como que a questionar o uso da máscara no local da festa com aglomeração livre. Muitos também foram os abraços calorosos trocados por algumas pessoas falando em saudades.

Quem me contou esses fatos deu um jeito de sair logo do ambiente após cumprir um protocolo para não abalar uma antiga amizade. Fiquei sabendo de gente que está fazendo uma lista de pessoas a serem visitadas daqui para frente e que estão se perguntando se estarão na lista de alguém.

Será que já dá para ficar durante duas horas numa sala de cinema ou num teatro na configuração clássica das cadeiras, mesmo com uso de máscaras? E ir a um estádio com lotação permitida cada vez maior? A decisão é de cada um e o risco é para todos.  Estão vindo aí os feriados de Finados e Proclamação da República, o Natal, a virada do ano, as férias de verão, o Carnaval…

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A cansativa reforma de uma casa

por Luis Borges 14 de outubro de 2021   Pensata

Ter uma casa própria faz parte dos sonhos da vida de muita gente. A moradia é uma das necessidades do ser humano segundo a pirâmide de Abraham Maslow (1908-1970) como parte do quesito segurança.

Vou contar aqui o caso de um casal amigo – que também acontece com outras pessoas – que resolveu recentemente fazer uma pequena reforma em sua casa própria, com 150 m² de área construída, numa verdadeira demonstração de autoestima, de renovação e energização do ambiente do viver cotidiano. A meta estabelecida foi pintar a casa e os muros, bem como revisar o telhado (antes do período chuvoso), em seis semanas contínuas de trabalho, de segunda a sexta.

Todo o planejamento foi detalhado num plano de ação cuja primeira medida era a especificação dos serviços a serem feitos. Logo em seguida vinha a contratação de um prestador de serviços da modalidade Microempreendedor Individual (MEI), com dois ajudantes e com referências de qualidade na prestação de serviços a dois clientes. Essa fase foi bem difícil e demorou três semanas para ser concluída. Foram consultados 4 fornecedores, dos quais 1 estava com a agenda cheia e outro combinou uma reunião para conhecer o que seria feito, não compareceu, remarcou para a semana seguinte e, de novo, não apareceu e nem deu satisfação. Um terceiro que foi procurado ficou de apresentar uma proposta, foi cobrado algumas vezes para que a enviasse e até hoje nada, também não deu nenhuma satisfação. Acabou sendo contratado o único que apresentou proposta, por sinal compatível com a capacidade financeira do casal prevista no planejamento.

Assim os serviços se iniciaram na primeira semana de agosto para serem concluídos em meados de setembro. Dentro das condições gerais do contrato ficou estabelecido que caberia ao contratante – cliente – a compra de insumos e materiais necessários, mas que deveriam ser especificados e apresentados pelo contratado – fornecedor – com antecedência mínima de 24 horas. Na prática isso acabou gerando fadiga entre as partes, pois quase todos os dias se solicitava alguma quantidade de algum item que estava acabando, ou seja, a previsão inicial falhou.

Outros aspectos que incomodaram muito aos contratantes foram a limpeza do ambiente, bastante descuidada, a organização em geral (muita bagunça) e um certo desperdício de materiais, inclusive de tempo. Ainda bem que o casal se hospedou na casa de uma filha durante a prestação do serviço.

Outra percepção clara foi sobre o ritmo de trabalho no dia-a-dia, notadamente na segunda, “pegando no tranco”, e na sexta, com muita ansiedade pela chegada do fim de semana. Houve também pouca pontualidade em relação ao horário de início dos trabalhos pela manhã e na retomada após o almoço, mas a assiduidade foi plena. Diante de tudo que aconteceu, acabou sendo inevitável um atraso de duas semanas e os serviços foram concluídos no dia primeiro de outubro, data limite para o início do período chuvoso.

Qualquer semelhança com alguma experiência já vivida por você, caro leitor, pode nos permitir a repetição de um dito popular afirmando que isso “só muda de endereço”. É isso mesmo?

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