O Natal e os gafanhotos

por Luis Borges 25 de dezembro de 2014   Pensata

O dia de Natal está terminando. Celebrei a data confraternizando com família e amigos na capital secreta do mundo, Araxá. Se o pré-Natal já foi muito bom, fui presenteado com um dia melhor ainda na amplitude das fraternas relações. E é bom que seja assim, pois precisamos renovar e acumular muitas energias para superar as dificuldades sistêmicas que atingem a nação nesses tempos.

Minha alegria e satisfação inerentes ao micro-mundo familiar não me deixam esconder a tristeza, que não me desmotiva, ao verificar a nuvem de gafanhotos vivendo da corrupção alastrada e impregnada por todo o país. Me lembro de Chico Buarque, em sua música “Vai passar”

Num tempo
Página infeliz da nossa história
Passagem desbotada na memória
Das nossas novas gerações
Dormia
A nossa pátria mãe tão distraída
Sem perceber que era subtraída
Em tenebrosas transações.

Qualquer semelhança não é mera coincidência, simplesmente está na nossa cultura.

Até quando aguentaremos conviver com tamanha indecência, justificada e ancorada em nome de uma democracia representativa na qual os representados não são ouvidos de maneira participativa pelos seus representantes? Para saber falar é preciso saber ouvir e a transparência tem que ir além do discurso.

Ainda que de maneira difusa, como ocorreu em junho de 2013, é evidente que o pote de mágoa prossegue aumentando e que nada está maravilhoso como é insistentemente apregoado. Imagine o dia em que lideranças dos movimentos sociais conseguirem focalizar e unificar tantas insatisfações. Como será que a nuvem de gafanhotos reagirá na tentativa de ceder os anéis para não perder os dedos, se é que isso bastará?

O Natal está chegando ao fim. Vou em frente vivendo e louvando o que merece ser louvado, mas sem me esquecer da tortura que a nuvem de gafanhotos nos traz e com a certeza de que ela vai passar, ainda que o tempo da história seja maior que o nosso. Mas quem sabe esse tempo nos surpreende e se antecipa. Também depende de nós.

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Tia Terezinha foi encontrar Marialva

por Luis Borges 17 de dezembro de 2014   Pensata

Não viemos por teu pranto
Nem viemos pra chorar
Viemos ao teu encontro
E estamos no teu altar
Por seguir nosso caminho
Que é também teu caminhar

Trecho de “Na terra como no céu”, de Geraldo Vandré

Comecei a saber sobre tia Terezinha a partir de conversas com o seu sobrinho. Aquele que andava de patins e passava direto pelos quebra-molas das alamedas do bairro São Luiz, na região da Pampulha, em Belo Horizonte. Ele falava também de sua prima Ana Paula, única filha de sua tia, que era irmã e amiga de sua mãe Marialva, que já estava em outro plano naquele momento. Algum tempo depois, foi tia Terezinha que o conduziu ao altar na cerimônia religiosa de seu casamento.

Há menos de três meses tive uma feliz oportunidade de conversar com ela durante as comemorações do aniversário de nascimento de seu neto Dedé. Entre uma conversa e outra, ela também brincava com o aniversariante e com seu irmão Vini, enquanto seu genro Marcos liderava a churrasqueira. Percebi e confirmei naquele domingo muito do que eu já ficara sabendo.

Tia Terezinha demonstrava ser uma mulher de muita vitalidade, parecendo um foguete em ação, preocupada com a família e com muita disponibilidade para colaborar no que fosse necessário. Ela também mostrou o quanto estava bem informada sobre o que acontecia no Brasil e no mundo, ao mesmo tempo em que deixava clara a certeza de que seu time seria o campeão brasileiro de futebol. A tarde foi muito agradável e, ao nos despedirmos, ficou a combinação de um novo encontro antes do Natal.

Tia Terezinha / Foto: Thiago Costoli

Foto: Thiago Costoli

O encontro será no próximo domingo, 21/12, mas uma dor abdominal que já se manifestava da outra vez acabou apressando a partida de Tia Terezinha para o outro plano. No dia 04 de dezembro seu espírito deixou o corpo e com certeza foi encontrar Marialva. A dor de sua partida com apenas 69 anos de idade nos deixa de luto, tristes, mas motivados para que tudo vá se transformando em saudades enquanto caminhamos para o dia em que também faremos a travessia para o outro plano.

Sei que tia Terezinha nunca estará só, como sinalizou ao entrar para a UTI do hospital, e que continuaremos cultivando a roseira e as rosas de sua obra, cujo símbolo maior é a sua querida Ana Paula.

Tia Terezinha, se nosso convívio foi pequeno mas de qualidade, a admiração pelo seu modo de ser é maior que o mundo. Prosseguiremos e caminharemos com a sua família, “que é também teu caminhar”.

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Como vai seu pré-Natal?

por Luis Borges 12 de dezembro de 2014   Pensata

Advento é o nome do período que antecede o Natal na liturgia da igreja Católica Apostólica Romana. Nesse período, os fiéis se preparam para o nascimento do filho de Deus. Ainda que tenha significados e motivações diferentes para quem tem outras crenças religiosas, o fato é que esse período mexe muito com as pessoas, de diversas maneiras.

Na semana que passou, aproveitei minhas conversas costumeiras com todo tipo de gente pra perguntar sobre isso. Falei com taxista, secretárias, médicos, consultores, engenheiros. Perguntei como estavam as atividades deles nessas semanas que precedem o Natal. As respostas foram variadas. Encontrei pessoas efusivas, fazendo compras por causa das crianças. E também encontrei quem passará a noite de Natal meditando e contemplando o que merece ser contemplado.

Na minha amostra, quase metade das pessoas já instalou um ou mais enfeites característicos da época em suas residências ou locais de trabalho, inclusive embalados pelas decorações das vias públicas das cidades e dos ambientes comerciais.

Realço também que algo em torno de 30% das pessoas disse que se sente tocado pelo momento, mas que devido ao aumento das pressões por resultados para esse ano e planos para o próximo em seu local de trabalho, ainda não foi possível entrar no pique e na correria típicos da época. Nesse caso, até a confraternização corporativa esta sendo vista como mais uma demanda para estorvar a agenda. Para esses, o que vai ser feito em família e com amigos será definido em cima da hora.

Um grupo pequeno, de menos de 10%, está balançando a roseira para avaliar o que foi solução e o que esta sobrando como problema diante de tudo que foi sonhado ou planejado para acontecer ao longo do ano. Alguns desses até já concluíram nesse pré-Natal que aproveitarão a ocasião para renascer e se reinventar para melhor prosseguir no tempo que não vai parar.

Outro pequeno grupo está focado em novenas preparatórias e em orações para que o país e o mundo consigam dosar o equilíbrio necessário para a sustentabilidade da vida em todas as suas dimensões.

Para alguns, o 13º salário seria o alívio para as dívidas, inclusive do cartão de crédito rotativo que cobra 15% de juros ao mês. Outros, mais planejados, o usariam como reserva para pagar à vista, em janeiro do ano que está chegando, o IPTU, o IPVA, o material escolar e, se sobrar, uma pequena viagem no Carnaval.

Enfim, fiquei a pensar e a desejar que a tônica seja o querer, para acalantar o renascimento e a reinvenção tão citadas por muitos. Que a felicidade seja compatível com as expectativas geradas perante a realidade que estamos vivendo e que exige mudanças consistentes e verdadeiras. O instante existe e pode ser bastante instigante, mas tudo começa com a gente, para prosseguir na família e na sociedade organizada numa democracia participativa.

E você, como vai o seu pré-Natal?

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Surpresa agradável no consultório

por Luis Borges 3 de dezembro de 2014   Pensata

Uma brasileira viajou pela Europa durante suas férias, em novembro. Cumpriu todas as exigências de praxe contidas nos regulamentos que tratam das viagens internacionais, entre elas o clássico seguro de saúde. Quase na metade da viagem, que durou exatos 30 dias, ela chegou ao sul da França e começou a ter momentos de mal estar, desconforto estomacal, desânimo e passou a imaginar que poderia estar com uma virose. Achou prudente buscar a orientação de um médico e verificar os procedimentos para usar seu seguro saúde. Diante de tantos entraves colocados pela seguradora, que, é claro, já tinha recebido pelo seu risco ainda no Brasil, a brasileira resolveu procurar um médico particular ainda no final do mesmo dia.

A primeira surpresa agradável foi conseguir um horário para ser atendida às 10h da manhã do dia seguinte. Também foi informada, noutra grata surpresa, que o preço da consulta seria de 22€, algo equivalente a 72 reais no câmbio daquele dia.

O comparativo com o Brasil foi inevitável. Uma consulta particular com um especialista em clínica médica custaria, no mínimo, R$ 350,00 . O atendimento provavelmente seria encaixado entre uma consulta e outra da agenda prévia do médico.

No dia seguinte a brasileira chegou ao consultório 10 minutos antes da hora marcada, na expectativa do tradicional “exercício de paciência” até chegar o seu momento de ser atendida. Ela está acostumada a ser tratada como paciente, e não como cliente, em boa parte dos locais que procura no Brasil para atendimento em serviços da saúde.

De novo, novas surpresas. A consulta iniciou-se apenas 10 minutos após a hora marcada. O próprio médico foi buscá-la na sala de espera e levou-a ao consultório. Após os cumprimentos iniciais, o médico fez uma anamnese bem objetiva e direta. Ele diagnosticou uma virose, como já imaginado, prescreveu alguns medicamentos e fez as orientações finais, se colocando à disposição para quaisquer outras necessidades nos dias subsequentes. Após 25 minutos, a consulta foi encerrada com o próprio médico recebendo os seus honorários, dando o troco, assinando recibos e preenchendo documentos para um possível reembolso do valor na chegada ao Brasil. Novamente, ele acompanhou a paciente até a porta de saída da clínica.

Mais uma vez, a comparação foi inevitável. Pela primeira vez, sentiu-se tratada como cliente e não simplesmente como uma paciente, que deve esperar até a hora que for a sua, como se o atendimento médico fosse quase que um favor. Lembrou-se também de profissionais da saúde que às vezes perguntam muito, falam pouco e sequer informam qual é o valor da pressão arterial do paciente. Isso para não falar daqueles que se sentem muito especialistas, mas não trabalham com a visão sistêmica e, portanto, não atentam para efeitos colaterais e impactos em outras funções orgânicas. Assim seguiu em frente pensando em limites técnicos de planos de saúde, exames laboratoriais para apoio ao diagnóstico, consultas que duram menos de 15 minutos e na postura de alguns profissionais que se pensam proprietários da verdade. Enfim, pensou que gostaria mesmo é de ser tratada como cliente em todos os lugares, sempre com qualidade, preço justo e atendimento digno e respeitoso à condição humana. Ela já esta de volta ao Brasil e prosseguirá buscando seu intento com sua alta resiliência.

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Demissão da pior forma

por Luis Borges 26 de novembro de 2014   Pensata

O ano caminha para o fim enquanto o Natal se aproxima e a economia brasileira ainda não dá sinais de melhoria. É interessante notar como se manifestam no dia-a-dia da vida os reflexos da perda de poder aquisitivo decorrente do galope inflacionário. Também dá para perceber uma maior lentidão nos negócios em função do pessimismo dos empresários e a população em geral mais preocupada com o desemprego, o que deixa muitas pessoas mais cautelosas na hora de fazer dívidas de um modo geral. Nesse cenário, começam a surgir mais notícias de empresas demitindo funcionários, por razões diversas.

Enquanto pensava no estado emocional das pessoas que estão sendo demitidas e nas dificuldades para se recolocar rapidamente no mercado de trabalho nesse difícil momento da economia, fiquei sabendo de um caso desrespeitoso com a pessoa e indigno de seres humanos. Aconteceu com uma funcionária que trabalhava há 22 anos numa agência de um grande banco privado em Belo Horizonte. Logo nesse segmento, que acumula lucros de bilhões de reais a cada trimestre e que não aceita resultados com nenhum centavo abaixo da meta estipulada.

A funcionária, que exercia a função de assistente administrativa, chegou ao seu setor de trabalho às 8 horas da sexta-feira passada, como de costume. Antecipando-se aos seus colegas de trabalho, ela colocou a vasilha de água para ferver, na expectativa de que alguns minutos depois um gostoso café estaria à disposição de todos. Entretanto, a gerente de recursos humanos chegou ao local inesperadamente e a convocou para uma reunião na sala ao lado. A funcionária argumentou que a água logo estaria fervendo, mas recebeu a determinação de que deveria deixar isso pra lá.

Iniciada a conversa e diante dos rodeios e “me-me-més” da gerente, a funcionária perguntou a ela se tudo aquilo era para demiti-la e também o que tinha feito para merecer tal situação. Aliviada e sem graça diante das perguntas que atalharam seu caminho, a explicação da gerante foi seca e direta. Disse que a funcionária estava no banco há muito tempo e tornou-se cara para a instituição. A política da instituição, segundo explicou a gerente de RH, é evitar ao máximo que pessoas permaneçam trabalhando na empresa por mais de duas décadas. Para que isso aconteça, a tecnologia da informação será cada vez mais incrementada para aumentar a competitividade.

A funcionária, ainda se refazendo do susto, perguntou sobre o cumprimento de aviso prévio e sobre seus direitos trabalhistas, mas foi logo interrompida pela gerente. Não seria necessário cumprir aviso, todos os direitos já estavam calculados e bastava apenas homologar a demissão no Sindicato dos Bancários. A gerente arrematou a conversa informando à funcionária que, saindo da sala, ela já deveria voltar para casa. Não permitiu o cafezinho do juízo final junto aos colegas do setor.

Forma e conteúdo caminham lado a lado, e o ser humano merece mais respeito. É lamentável que ainda aconteçam fatos como esse em pleno ano de 2014 na República Federativa do Brasil.

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Autêntica Minas

por Convidado 24 de novembro de 2014   Pensata

por Benício Rocha

A minha cidade, autêntica Minas, de ruas amorosas aos pés de seus montes eternos, cuja eternidade só finda com a extração de minérios, primeiros mineiros, vive na paz e aconchego do clima de montanhas.

Pastos verdes, cachoeiras, ilhas de Mata Atlântica, gado, cafezais e nós, um aqui, outro ali, o Sol, um cachorro a latir amigavelmente, na estrada um carro apressado passa. Saudades da terra, poeira, charretes, carros de bois, tropas e tropeiros, paisagem mineira abraçando minha terrinha, mais que povoado, menos que cidade grande. Cidadão ali vive muito bem.

Igual a quase mil cidades, conjunto de poesias, com rimas perfeitas, e junto às mais lindas pessoas do mundo, Caratinga faz-se diferente somente porque os olhos que a vêem são os do meu coração, amante amolecido, saciado, que conhece de memória de menino cada centímetro daquele rincão, e sente seus cheiros pelo mundo afora.

Na cidade grande eu moro, mas naquele cantinho vivo, lembrando daquele menino que engenhava formas de tirar os morros que dividem a cidade em três para, na planura surgida, ver a cidade crescer, progredir…

Ainda bem que o empreendimento não aconteceu, o pouco progresso e o ainda menos ar de ontem me fazem lembrar de onde sou, como fui formado e como se desenvolveu em mim essa capacidade de, nem sempre, romper mas, contornar os obstáculos e, às vezes dividido, compreender, aceitar e ser feliz.

Nas lembranças me encontro quando me perco, e recomeço minha marcha caminhando para suas entranhas um dia.

Minha cidade e meu coração ainda pulsam… lentos, comedidos. E minha felicidade, eterna saudade, sem pressa os acompanha.

Catedral de São João Batista, em Caratinga. / Fonte: Site da Prefeitura Municipal

Catedral de São João Batista, em Caratinga. / Fonte: Site da Prefeitura Municipal

Benício Rocha é caratinguense ausente e saudoso, mineiro da gema, amante da boa prosa, sócio da MGerais Seguros, aprendiz de servo do Senhor.

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Festa no retorno das férias

por Luis Borges 19 de novembro de 2014   Pensata

Na semana passada, depois de muito tempo adormecida na casa, a regulamentação da PEC das Domésticas voltou a ser discutida no Senado da República. No último dia 11, a comissão do Senado rejeitou diversas emendas. O texto, agora, volta para apreciação na Câmara dos Deputados. Enquanto isso, 7,2 milhões de empregados domésticos continuam aguardando as regras para a operacionalização de vários direitos, entre os quais o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

Pelo visto dificilmente essa matéria ficará resolvida ainda nesse ano. No entanto, o Brasil continuará sendo o maior mercado mundial na contratação desse tipo de trabalho, com ou sem carteira profissional assinada, mesmo já sendo uma exigência legal.

Diante desse quadro, passam pela minha cabeça narrativas das mais diversas situações envolvendo as relações de trabalho entre contratantes e contratadas. Nas últimas 4 décadas ouvi muitas reclamações e poucos elogios, principalmente da parte contratante. Já pelo lado das  contratadas é claro que vi também muitas pessoas profissionais e comprometidas, convivendo com outras cheias de soluções “criativas” e muito descompromisso com o que foi combinado.

No início dessa semana, fiquei sabendo de um caso muito interessante, para não dizer inusitado, envolvendo o trabalho doméstico. Na segunda feira por volta de 10:00 horas, fiz uma visita telefônica a um casal de amigos. Ambos já são aposentados pelo INSS, possuem previdência complementar, têm os filhos criados, convivem com idosos na família  e estão na faixa de 60 a 65 anos de idade. Quando o amigo atendeu à chamada, ouvi um alarido com sintomas de felicidade plenamente audível em sua residência. Ele me disse que estavam fazendo uma festa singela pelo retorno da empregada doméstica, após 30 dias de férias. Eu não quis atrapalhar a festa e educadamente me despedi do amigo propondo concluir a visita numa outra ocasião mais oportuna. Mas minha amiga retornou minha ligação ainda antes do almoço e me fez um depoimento explicando o contexto da festa. Ela foi clara e falou na lata.

“Não vou mais reclamar de minha empregada doméstica que trabalha comigo há 5 anos, mesmo que ela chegue tarde e saia cedo. Nesse período de suas férias não dei conta de fazer todo o serviço necessário e só consegui contratar uma diarista uma vez. Além disso, minha residência é grande, cuido de minha mãe e tenho outros diversos afazeres familiares, que exigem muito de mim. Ficou claro que estou gerando trabalho conforme a lei  e que preciso de alguém que atua nesse segmento em que a confiança é um requisito essencial”.

Diante disso reafirmei a minha crença de que “ruim com ela, pior sem ela”. E você, caro leitor como tem sido as suas experiências e conclusões nas relações de trabalho doméstico? Será que esse mercado tende a se estreitar?

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Renovar as alianças é preciso

por Luis Borges 14 de novembro de 2014   Pensata

Na semana passada me encontrei com Azarias Pedro, um antigo colega do início da minha carreira, que eu não via há muito tempo. Fizemos o clássico cumprimento, carregado de satisfação pelo reencontro. Depois dele, Azarias disparou a falar. Em resumo, seu casamento de 30 anos com Ana Telma acabou. Foi ela quem pediu a separação, irrevogável, alegando que não aguentaria mais esperar pelo dia em que a morte os separaria. Meu colega estava queixoso. Contou que hoje mora num pequeno barracão, nos fundos da casa do filho mais velho, vive do salário de professor aposentado pelo INSS.

Foram muitas informações em poucos minutos. Tentei respirar, perguntei pelas causas. Ele disse que era complicado, que fora engolido pela mesmice, pela escassez de diálogo, acentuada com a passagem do tempo. Tentei continuar a conversa, compartilhar algo sobre a minha trajetória, mas meu colega estava sem tempo e partiu.

Azarias me deixou pensando na história dele, no conjunto de causas que fizeram parte do processo que levou o casal àquele resultado. Me indagava quais poderiam ser as causas fundamentais, mesmo não tendo fatos e dados para alimentar minhas ilações.

Interior da Catedral da Boa Viagem, em Belo Horizonte / Foto: Marina Borges

Interior da Catedral da Boa Viagem, em Belo Horizonte / Foto: Marina Borges

Foi aí que me lembrei do sermão feito pelo padre durante a cerimônia religiosa do casamento de Thais e Thiago, em setembro, na Catedral da Boa Viagem, em Belo Horizonte. Essencialmente, o padre se referiu ao tema do Evangelho, que tratava da transformação da água em vinho nas Bodas de Caná. O padre aproveitou para reiterar que, atualmente, vivemos numa sociedade epidérmica onde a profundidade está fora de moda. Arrematou lembrando a importância das alianças entre as pessoas e a essencialidade da sua permanente renovação.

Se é bom aprendermos com os erros e acertos, de preferência dos outros, me pergunto e te pergunto, caro leitor: como estão as nossas alianças? Será que estamos praticando verdadeiramente o que significa uma aliança para fazer a união harmoniosa de seres e coisas diferentes entre si e que são muito valiosas para todos os envolvidos no processo?

Surge aqui uma oportunidade para a reflexão, que deve ser seguida pela ação, tendo como foco as alianças no amor, na família, nos negócios, no associativismo… sempre lembrando que não existe processo sem cooperação e sem participação.

Infelizmente, se as nossas conclusões nos informarem que estamos omissos e que nossas alianças estão perdendo o sabor, fica o desafio da mudança de atitude enquanto há tempo. Espero que, doravante, os gestos sejam maiores que as intenções, pois o isolamento é tão triste no palacete quanto no barracão.

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O feijão e o sonho

por Convidado 10 de novembro de 2014   Pensata

Por Sérgio Marchetti

Quando era criança li um livro chamado “O feijão e o sonho”, de Orígenes Lessa. Eu já possuía uma queda para a poesia e também para a licenciatura. Mas confesso que aquele romance mexeu comigo profundamente, balançou minhas convicções e me entristeceu. Eu não queria aceitar, porém sabia que havia razão na personagem da esposa do professor. Maria Rosa era racional, prática e com os pés no chão. Já o professor Campos Lara, o marido, amava a literatura, vibrava com suas aulas e vivia mais perto das nuvens.

Havia naquela personagem uma pureza e uma obstinada busca por fazer o melhor por seus alunos. Faria, se pudesse aquele professor, um implante de uma parte de sua memória na cabeça de cada aluno. Com sua conduta irreprovável representava o profissional dedicado, que vestia a camisa e defendia os interesses da organização a que servia. Naquele momento, eu torci para que o sonhador realizasse seus objetivos e que pudesse vencer na vida acreditando em seu sonho. Não aconteceu e me frustrei. Faltou o feijão e o casamento passou a ter problemas. Ainda assim, Campos Lara continuou acreditando que a felicidade estava na realização do sonho, e no amor pelo trabalho que fazia.

Naquele tempo, os valores eram completamente diferentes de hoje. E muita gente era feliz, mesmo que não houvesse muito “feijão”. O sonho valia muito, pois as pessoas eram respeitadas pela honestidade, dignidade e capacidade. E a figura do professor daquela época? Era muito diferente dos dias atuais. Os alunos respeitavam sua autoridade. Hoje, tudo mudou, e não há como viver no presente com os mapas do passado. Contudo, isso não significa que todos os mapas atuais estejam corretos. Um país que não se preocupa com a educação, entre tantas outras coisas básicas, não terá cidadania jamais.

Bem, de lá até os dias de hoje, o tempo passou e o mundo ficou ainda mais prático. Mas não é só o “feijão” que as pessoas desejam. “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”. Assim cantaram os Titãs, e sua música retratou uma necessidade de todos. Do passado, vêm experiências, fatos que nos servem como marco, parâmetros e exemplos do que deu certo e também do que não deu. Sem passado não há como saber se evoluímos, pois ele nos fornece dados e parâmetros. O presente vem recheado de transformações e novidades. Somos passageiros de um mundo em movimento frenético de mudanças. “Para o mundo que eu quero descer”, gritaria o maluco beleza, grande Raul Seixas. Mas não há como parar a roda viva e, infelizmente, estamos sem condições de diminuir a velocidade do seu giro.

O atual cenário é marcado pela inversão, destruição e criação de valores num mundo que se tornou um só, graças à evolução da tecnologia. O planeta é único. Povos e culturas, ainda que distintos, se aproximaram. Palavras novas, expressões diferentes, atitudes insólitas surgem e se propagam como a luz pelo mundo afora e, em alguns casos, não temos como identificar de onde surgiram. Termos atuais como TOC, síndromes, aplicativos, combos, confirmam as constantes mudanças de hábitos, de linguagem e descrevem doenças, códigos e estratégias que formam uma nova maneira de viver.

Goleman, um dos psicólogos mais respeitados do mundo, em contrapartida, enfatizou que temos uma geração sem foco, com muitos déficits para tratar. A nomofobia faz parte do pacote, compõe o kit do desenvolvimento. Talvez seja um combo. Mas falando sério, trata-se de desconforto causado pela falta de acesso a aparelhos celulares e outros equipamentos tecnológicos, e surgiu como consequência de um mundo virtual em que pessoas não conseguem ficar desconectadas de seus aparelhos eletrônicos. Muitos não acreditam que estão se alienando, mas a doença tem sintomas como tremor, suor excessivo, falta de ar, vertigem, náuseas, taquicardia, dor de cabeça e, em casos mais extremos, depressão e síndrome do pânico.

Essa é a proposta de vida para um novo tempo, mas, convenhamos, haja “feijão” para surfar nas novas ondas. A vida ficou mais cara, com mais recursos, mais conforto, mais grifes, porém mais vazia e mais cansativa. Possivelmente a expressão “vazia” não seja a mais acertada, já que alguns vão discordar. Talvez pudesse dizer que vivemos no piloto automático e que o tempo ficou escasso para todos, devido justamente ao enorme número de opções que temos. É bem provável que o vazio possa vir da incerteza que o provisório nos trouxe. Os empregos, antes carreiras de trinta anos, hoje duram em torno de três anos ou menos, conforme algumas pesquisas nos informam. O ser humano se tornou imediatista e a impaciência é uma característica do novo cidadão. Quando alguém deixa a bateria do telefone acabar, ouve broncas, reclamações, como se tivesse cometido algum crime. A escravidão em tempos de amor virtual também não é visível, mas aprisiona a humanidade. Hoje, temos muitos feitores artificiais nos controlando durante vinte quatro horas. Basta olhar no saguão de espera dos aeroportos. Pior, quando a comissária, em pleno voo, anuncia que podem ser ligados os aparelhos eletrônicos, mesmo numa viagem de trinta minutos, todos os dependentes virtuais, parecendo ter longo período de abstinência, imediatamente ligam seus aparelhos.

Mas eu falava sobre “O Feijão e o Sonho”? Será que me distrai e perdi o foco? Falava da ideologia do professor e da praticidade de sua esposa. Mas isso já faz tanto tempo. As novas gerações não entenderiam o que se passava na cabeça de Campos Lara. Pensando melhor, creio que entenderiam sim, contudo o veriam como um tolo. Perdão, tolo é palavra do passado, agora o certo é “mané”.

Como vimos, o mundo não mudou – o mundo se transformou. Mas para não perder o foco, quero lembrar que as mulheres, representadas pela Maria Rosa (a personagem de “O Feijão e o Sonho”), já sabiam da importância do “feijão” e já demonstravam uma predileção especial por aquela hortaliça. Prova de que são bem práticas e proativas e, não por acaso, se adaptaram melhor do que os homens ao mundo contemporâneo.

Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui Licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br 

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Os primeiros enfeites de Natal

por Luis Borges 7 de novembro de 2014   Pensata

Chegaram às casas comerciais os primeiros enfeites para o Natal deste ano, quando faltam menos de 50 dias para a data magna do cristianismo. A primeira sensação que tenho é de que o ano praticamente acabou. Ainda assim, fico me indagando sobre o que ainda é possível fazer diante do clima de festas que só crescerá a cada dia. Penso também naquilo que poderia ter sido feito mas não o foi. Aí a sensação é de perda, mesmo sabendo que algumas metas eram extremamente desafiadoras num ano de Copa, eleições presidenciais, baixo crescimento econômico e inflação dando sinais de vitalidade.

Tenho também a sensação que em breve surgirão os enfeites que embelezarão ambientes públicos das cidades, ainda que as prefeituras estejam chorando a falta de recursos do orçamento para tal fim. Sei também que árvores de natal cheias de bolinhas coloridas, guirlandas, Papai Noel e até presépios chegarão às nossas residências, principalmente no inicio de dezembro. É claro que em muitos lugares tudo chegará na última hora junto com as mensagens impressas ou pelas redes sociais, muitas delas cheias de si mesmas.

árvore de natal pendurada na cúpula das Galeries Lafayette em Paris

Um dos primeiros sinais do Natal, fotografado nas Galeries Lafayette, no fim de outubro deste ano. /Foto: Marina Borges

Mas qual será o significado que o Natal terá para nós neste ano de 2014, após os resultados das urnas no segundo turno das eleições presidenciais? Se tudo começa com a gente, o que efetivamente significará nascer, renascer ou se reinventar com sabedoria numa sociedade que se diz plural e republicana? Outra sensação forte que tenho é de que mais uma vez se travará um embate entre a educação financeira das pessoas e o “consumo, logo existo”. Crédito de todas as modalidades é o que não faltará, inclusive para quem limpou o nome na praça. E não é demais lembrar que o 13º salário injetará R$ 158 bilhões no mercado. Como já é de nossa cultura, presentes serão trocados, inclusive nas modalidades de amigo secreto ou de inimigos ocultos com valores mínimos ou não, previamente estabelecidos.

Muitas pessoas também estarão com a sensação de que não escaparão da confraternização corporativa, mesmo nos ambientes em que não existe clima organizacional para tantos abraços e beijinhos. Mas como são muitas as cobranças para que todos compareçam, talvez seja necessário uma “dublagem” amparada pela frase da sobrevivência a nos dizer que “um pouco de hipocrisia não faz mal a ninguém”.

É, realmente parece que o ano já acabou. Mas ainda dá tempo de se preparar para um Natal que tenha mais significados e consequências para homens e mulheres de boa vontade e de livre arbítrio.

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