O que nos resta é ir levando

por Luis Borges 19 de agosto de 2019   Pensata

As manifestações políticas que sacudiram as ruas do país em 2013 já completaram 6 anos. Naquele ano a inflação anual ficou em 5,91%, a economia cresceu 1,7% ante 3% no ano anterior e o índice de desemprego ficou em 5,3% segundo o IBGE.

De lá para cá a economia passou por uma forte recessão econômica, que durou 2 anos e meio e está chegando agora ao final de 2019 no terceiro ano de estagnação. Neste momento as projeções indicam que a inflação anual ficará em torno de 3,7%, o crescimento da economia deve ser de pífios 0,8% e o índice de desempregados deverá ficar em torno de 12% – 12,8 milhões de pessoas.

Podemos observar no plano macro da economia, retratado pela amostra desses três indicadores, que as coisas pioraram. Sugiro que olhemos também o nível micro da economia ao longo desse mesmo período para que possamos perceber qual foi o impacto de tudo isso no cotidiano das pessoas, nas organizações em que trabalham ou trabalharam. Para facilitar esta avaliação podemos também observar uma amostra de 3 indicadores. Em primeiro lugar é importante saber se a organização para a qual você trabalhava em 2013 se manteve no mercado até o momento ou se encolheu e depois quebrou. O segundo indicador é verificar as condições em que o trabalho foi e está sendo feito, qual o seu nível de resiliência para enfrentar as pressões diárias vindas de chefes comandantes (e não líderes) e como ficou a sua remuneração anual perante todas as alegadas dificuldades enfrentadas pelo seu empregador no mercado. Uma terceira variável pode ser contar nos dedos da mão quantas vezes você teve vontade de ter seu próprio negócio após ouvir “pataquaras” ou falações autoritárias de chefes comandantes no melhor estilo de “manda quem pode e obedece quem tem juízo”.

Mas se é nas dificuldades que a gente se prova o que nos resta é não nos sentirmos vencidos para melhor prosseguir em busca de melhores condições vida e trabalho numa conjuntura que exige estratégias de sobrevivência, mesmo diante de tantas incertezas.

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A observação e análise do cotidiano de indivíduos e famílias deveria ser um exercício feito com mais frequência para ajudar na melhoria contínua das tarefas e atividades que fazem parte de seus processos de vida. Entretanto a realidade nos mostra que a maior parte das pessoas ainda está bem longe de fazer isso se tornar algo inerente ao avanço do curso de suas vidas.

Estou falando sobre isso a propósito de uma situação que vivi na tarde de quinta-feira da semana passada após sair de uma clínica dentária na Rua dos Goitacazes, no Centro da cidade de Belo Horizonte. Logo em frente ao edifício entrei num táxi, cumprimentando o motorista e solicitando a ele que me levasse até o bairro de Santa Tereza. Após retribuir o boa tarde o motorista disse que também era do bairro, onde mora desde que nasceu, há 43 anos, e que é taxista há 20.

Rapidamente o veículo chegou à Avenida Afonso Pena, onde o trânsito estava bem lento. O que começou a deixar o motorista irritadiço e ansioso para entender a causa daquela situação. Foi aí que resolvi perguntar a ele como é o seu cotidiano nesse tipo de trabalho ao longo da semana. Entre um pequeno avanço e outro pela pista ele começou dizendo que acorda por volta das 6h, toma um banho “esperto” e após o café da manhã deixa a esposa no trabalho e a filhinha numa escola municipal de educação infantil. Por volta das 7h30 começa a busca pelos clientes de seu negócio. Se não surgir ninguém pelo caminho ou pelo sistema central da cooperativa da qual faz parte ele segue diretamente para o ponto fixo da Praça Sete ou da Rua dos Goitacazes, onde passa a puxar fila até aparecer um cliente. Ele disse também que por longos anos trabalhou de segunda a sábado e que nos últimos tempos trabalha de segunda a sexta, até as 21h. Excepcionalmente atende alguns clientes fidelizados aos sábados, em situações bastante específicas. Seu almoço é sempre em casa, pois mora bem próximo do centro da cidade, e sempre que possível busca a esposa no trabalho para juntos buscarem a filhinha na escola.

O motorista também disse que enfrenta todos os tipos de problemas no trânsito e que se preocupa muito com sua própria segurança e de seus clientes. No futebol, é torcedor do Galo e disse que de vez em quando vai aos jogos no estádio Independência. Ele faz parte da turma que acredita.

Quando o táxi estava entrando no bairro rumo ao destino final o motorista disse que a cada três dias frequenta um bar próximo à sua casa para “bambear os nervos” após a extenuante jornada de trabalho e que faz isso há muitos anos. Lá já é enturmado e as conversas são acompanhadas por quatro guias – doses – de cachaça, seis garrafas de 600 ml de cerveja Brahma – ele é brahmeiro – e diversos tipos de tira gosto. Nessas ocasiões sai do bar quando ele fecha por volta das 23h30 e rapidamente chega em casa “bem arrumado”.

E assim terminou a corrida do táxi. Despedi-me do motorista pensando sobre o meu cotidiano e nas possibilidades de melhoria que sempre existem, mas que precisam ser enxergadas para facilitar os reposicionamentos necessários.

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Você se lembra de quantas vezes visitou ou foi visitado por pessoas amigas do início do ano para cá? Digamos que isso tenha acontecido três ou quatro vezes por iniciativa de um lado ou de outro. Além disso, essas pessoas podem ter diferentes espectros políticos e ideológicos, bem como viver em bolhas distintas, mas tem a capacidade de polir as amizades para renová-las sempre e com o devido cuidado inerente a quem sabe falar e ouvir. Aliás, para muitas pessoas isso pode até parecer uma utopia nesses tempos que estamos atravessando.
 
Estou dizendo tudo isso por causa de um caso que me contaram. Ocorreu com um professor de matemática, 48 anos, que leciona no Ensino Médio da rede privada de Belo Horizonte. Foi no início de julho, no apartamento dele. Fazia um ano que o professor tinha se encontrado pessoalmente com o amigo no inverno passado e estava recebendo uma visita de retribuição. Assim que o amigo – também de 48 anos – chegou, no início da noite, houve uma efusiva troca de abraços pontuada pela lembrança de que o tempo passou muito rápido após o último encontro. 
 
Logo de cara o professor percebeu que o amigo, médico cardiologista, portava na mão direita seu telefone celular. Logo que começaram a conversar o anfitrião ficou pensando quanto tempo levaria para que o amigo passasse da posse para o uso efetivo do aparelho. Para a sua “não surpresa” passaram-se exatos 15 minutos da euforia inicial pelo reencontro e o visitante começou a olhar com maior frequência para a tela do seu dispositivo tecnológico, inclusive ficando atento aos sinais sonoros emitidos. Logo logo o professor e o amigo estavam plenamente divididos entre a conversa e a novidade do último minuto trazida pelo celular. Ficou visível a alta conectividade do cardiologista com seu aparelho e a sua crescente dificuldade para se conectar na conversa com o amigo. O hiato causado pela dispersão era cada vez mais cansativo para o professor, que dedicou seu tempo ao encontro e simplesmente ficou longe de seu próprio telefone celular que foi desligado. O fato é que o encontro ficou prejudicado pela presença de uma inteligência artificial que estava roubando a cena. 
 
Diante da realidade ensejada pelo comportamento do amigo em sua relação com o celular o professor propôs uma pausa para que pudessem tomar um café e que o telefone ficasse desligado, simples assim. Passaram-se exatos 50 minutos de boa conversa quando o professor começou a perceber uma certa inquietação por parte do amigo, que só foi aumentando à medida em que a noite avançava. Não demorou muito e depois de 5 minutos o visitante solicitou ao anfitrião sua compreensão, pois precisava religar seu telefone celular em função principalmente de seus compromissos profissionais. Só restou ao professor acatar a solicitação e conversar mais um pouco com o amigo, sempre que possível, sem deixar de atender aos chamados prioritários do celular. A conversa durou mais uma meia hora e tudo caminhou para o fim do encontro em função de tanta coisa envolvida em pouco espaço de tempo. Nova tentativa de visita ficou marcada para daqui a algum tempo, mas pelo que vai se vendo haverá pouco ou nada para se insistir em ficar com esse tipo de preocupação diante de tanta impaciência e necessidade.
 
Você acha que ainda é possível tentar ficar sem ouvir o celular ou é melhor render-se e adaptar-se diante da atual realidade cada vez mais dominada pela conectividade obrigatória? Pelo visto, é o que é possível nessa mudança de era…
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A Constituição Brasileira assegura a todos nós o direito de ir e vir. Mas como ir e vir à pé, no patinete ou no veículo automotor diante da cada vez maior quantidade de pedras distribuídas de todas as maneiras pelos caminhos que trilhamos?

Moramos na cidade, num bairro, numa determinada rua e, mais especificamente, num lote em que foi construído um barracão, uma casa ou um edifício de apartamentos, por exemplo. Sair de lá e retornar para lá faz parte do processo cotidiano em busca das melhores condições de vida, trabalho e lazer. Acontece que esse ir e vir está ficando cada vez mais complicado, principalmente nos horários de maior demanda para o trânsito.

É o caso do bairro de Santa Tereza, em Belo Horizonte, e também de diversos outros, onde é alto o índice de reclamações por parte dos moradores bem como daqueles que frequentam o bairro a lazer ou a trabalho. Quais seriam as principais causas desse problema cada vez mais crônico? Tomando como exemplo o bairro de Santa Tereza e as três ruas que dão acesso à entrada e à saída do bairro a partir da Avenida do Contorno, no bairro Floresta, para quem está num veículo, veremos que o caminho quase obrigatório – e mais usado – é a Rua Hermílio Alves, com mão direcional nos dois sentidos. Ela dá acesso ao interior do bairro pela Rua Mármore, a mais importante do ponto de vista comercial, enquanto a principal saída se dá pela Rua Salinas, que tem mão única até se encontrar com o final da Rua Hermílio Alves para daí prosseguir até o início dessa rua na esquina com a Avenida do Contorno.

Mapa de parte do bairro de Santa Tereza. | Fonte: Google Maps

É claro que uma coisa é chegar de automóvel com uma ou duas pessoas, motocicleta, bicicleta, ônibus, táxi, cada um com as suas especificidades e atitudes perante as regras do trânsito. Outra coisa é andar em qualquer das calçadas pouco amigáveis e muitas vezes ocupadas em desacordo com o código de posturas municipais. Como acredito que tudo começa com a gente vou citar inicialmente algumas causas do problema que são devidas às atitudes das pessoas.

A observação e análise dos acontecimentos mostra que o não cumprimento dos padrões definidos pela legislação de trânsito por parte de uma parcela dos condutores de veículos atrapalha muita gente de diversas maneiras. Isso vai desde a velocidade acima do limite, passa pela falta de sinalização de intenção dos condutores de veículos através de seta, farol e vai até estacionar um carro sem observar se é preciso ficar afastado pelo menos 5 metros da esquina. Também são notórios dispositivos colocados ao longo das calçadas, notadamente nas esquinas, que tiram a visão de quem vai fazer conversões à esquerda ou à direita, como acontece na Rua Mármore nas esquinas com as ruas Gabro e Ângelo Rabelo. Existem também aqueles que param seus veículos em fila dupla, com ou sem pisca-alerta ligado, os que estacionam de qualquer jeito, longe do meio-fio e abrem a porta no sentido da pista de rolamento sem olhar o fluxo do trânsito bem como aqueles que buzinam para quem está à frente ou fazem uma irritante pressão silenciosa tentando abrir passagem. Tem também os motoqueiros ultrapassando os automóveis de qualquer maneira, pela esquerda ou direita, em atos imprudentes que geram insegurança, quase acidentes e também acidentes.

Olhando pelo lado do poder público, que também é exercido por pessoas em suas diversas instâncias, é importante observar como são feitos o planejamento e a gestão do trânsito no bairro de Santa Tereza e em outros bairros da cidade. Percebo que a empresa municipal BHTRANS, gerenciadora do sistema viário, prioriza a região centro-sul da cidade e os grandes corredores, mas dá pouca atenção ao interior dos bairros. No caso do bairro de Santa Tereza várias perguntas poderiam ser feitas e melhor estudadas a partir dos fatos e dados do trânsito. Será que a atual configuração das vias do bairro, com mão única, mão dupla, estacionamento de veículos nos dois lados das pistas… ainda é a mais adequada diante da quantidade de veículos em circulação? Como estão as sinalizações nas pistas por meio de placas ou de semáforos orientadores para a circulação de pessoas que andam a pé ou nos veículos? É possível uma fiscalização presencial aleatória, ainda que por amostragem, que vá além da blitz da Lei Seca ou por meio eletrônico?

Enquanto cada um cuida de si só nos resta considerar que isso é o que temos para hoje.

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Essa pergunta pode ser respondida com um “depende”. O pode ser classificada como inoportuna ou de difícil resposta nesses tempos de muita polarização em torno da visão de mundo que cada um tem.  Quem quer conservar energia deve estar atento ao que se fala ou se posta, pois qualquer interpretação enviesada pode levar à intolerância, à raiva e ao ódio, deixando de lado o respeito às pessoas de uma sociedade que se quer civilizada em seu convívio. Se as coisas estão assim no plano macro da vida ao longo do país, fico tentando observar e analisar como estão as relações entre as pessoas no nível micro do cotidiano nas ruas em que moram cercadas por vizinhos.

Para ilustrar a situação sugiro que imaginemos uma rua de apenas um quarteirão, que tem comprimento de 100 metros e é perpendicular à duas outras ruas que lhe dão acesso numa cidade como Belo Horizonte. Suponhamos também que nela existam mais casas e barracões no fundo da horta do que edifícios de pequeno porte contendo de 4 a 8 apartamentos e apenas um lote vago. É possível também imaginar que nessa rua existem moradores bem antigos, outros mais recentes que são proprietários de seus próprios imóveis bem como pessoas que moram de aluguel e que geram uma maior rotatividade em função da transitoriedade da maior parte deles. Isso faz com que frequentemente apareçam caras novas pela rua enquanto algumas outras saem de cena.

Então podemos nos colocar na condição de moradores dessa rua imaginária para avaliar alguns aspectos que podem chamar a atenção sobre o convívio cotidiano das pessoas do local. Quantos se cumprimentam com um “bom dia” ou apenas trocam um olhar com o rabo do olho ou ainda até balbuciam algumas palavras? E quantos baixam a cabeça ou fingem que não estão vendo ninguém e se tornam invisíveis? Existem também aqueles que só andam em algum veículo automotor e já saem da garagem com os vidros fechados e bastante atentos ao pequeno trânsito, o que não lhes permite ficar olhando para alguém que esteja na calçada. Dá até para pensar se existem vizinhos que se frequentam ou se aqueles que conversam preferem fazer isso nas calçadas ou mesmo falar com voz um pouco mais alta com quem está na janela da casa do outro lado da rua.

Outro aspecto que mexe com muitos moradores é a coleta do lixo domiciliar. Nem todos observam o horário de coleta nem os dias. Acabam por colocá-lo na calçada a qualquer momento, inclusive nos finais de semana em que não há coleta e, algumas vezes, o lixo doméstico é acompanhado por bens que o caminhão de lixo não recolhe. Se alguém tentar educar o vizinho indisciplinado fica difícil prever a sua reação e até mesmo a animosidade que poderá ser gerada.

E qual é a sua reação quando o visitante do seu vizinho para o carro na porta de sua garagem? Como fica sua paciência quando o alarme do carro ou da casa/prédio de vizinhos começa a disparar? E quando o cachorro de alguém começa a latir insistentemente ou o gato de algum vizinho pula o muro de sua casa para miar no seu jardim? Tem também o galo de outro vizinho que canta a partir das 4h da madrugada ou os pombos batendo asas em busca do alimento colocado na calçada por um outro vizinho. Também é inesquecível o vizinho que começa a lavar o carro todo sábado às 7 horas ouvindo música com o som nas alturas.

A segurança de pessoas e bens é sempre uma preocupação, mas formar uma rede de vizinhos protegidos é muito desafiante e mantê-la funcionando é um desafio ainda maior. Não sei se você ou algum vizinho já pensou em fazer algo semelhante em sua rua. Ao mesmo tempo fico me perguntando que vizinhos tem o número do telefone, e-mail ou WhatsApp daqueles que estão mais próximos e quantos ficam sabendo em tempo quase real se algo mais preocupante aconteceu com algum morador.  Pode ser um ato de violência, um roubo, um problema grave de saúde ou até mesmo um caso de morte que vai se descobrindo aos poucos, por exemplo.

Não tenho a pretensão de citar aqui tudo o que pode acontecer num quarteirão de uma rua e nem seria possível. Mas você teria outras situações para narrar que podem impactar o convívio entre vizinhos?

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A moradia é uma das necessidades básicas do ser humano segundo Abraham Maslow (1908-1970) e não é para menos. Se é grande a luta de quem busca conseguir ter a sua própria moradia e ficar livre do imóvel alugado dá para imaginar o que é a dor e a delícia de residir num espaço próprio, mesmo financiado, num edifício com 6, 12, 24, 50 ou 100 apartamentos de tamanho médio, variando na faixa de 40 a 80 m².

Ainda que exista toda uma legislação e um regimento próprio de cada condomínio é muito comum ouvirmos narrativas de acontecimentos de todos os tipos envolvendo pessoas que moram ou circulam nesses espaços. Na maior parte das vezes as causas dos problemas gerados, inclusive os mais bizarros, estão no desconhecimento e descumprimento dos padrões que regem os edifícios e na falta de disciplina de boa parte dos moradores para respeitar as regras do jogo. Tudo pode começar na Assembleia geral do condomínio, com baixo comparecimento dos interessados na maioria das vezes, ocasião em que são tratados os assuntos de interesse dos moradores, entre eles a eleição do síndico e subsíndico. É comum quase ninguém querer assumir o papel de síndico e é também comum que muitos moradores se posicionem contra a contratação de um síndico profissional para não aumentar ainda mais a taxa de condomínio.

Recentemente tomei conhecimento do caso de uma assembleia geral de um edifício à qual compareceram representantes de 7 dos 12 apartamentos existentes, fato que foi considerado uma grande vitória e um alento para os que acreditam na possibilidade de uma vida civilizada e respeitosa no espaço comum. Como também já passei pela experiência de ser síndico de um edifício residencial em outros tempos percebo hoje que as dificuldades ainda são muitas principalmente nesses tempos de intensa polarização da sociedade. Nesse sentido não é raro constatar que existem moradores dos edifícios, seja em apartamentos próprios, alugados de acordo com a lei do inquilinato ou mesmo para curtas temporadas, que se comportam de maneira desrespeitosa e deixando a sensação que podem fazer o que quiserem no espaço em que estão morando e nas áreas comuns. Cabe aos vizinhos se acostumarem com a balbúrdia gerada.

Podemos até fazer uma lista contendo diversos outros acontecimentos que surpreendem e incomodam ao longo do dia, da semana ou do mês. A lista poderia começar pelos moradores de um apartamento que ouvem música de qualquer gênero num alto volume. Continua no desrespeito aos limites demarcatórios das vagas para veículos nas garagens, nos animais soltos que deixam suas “marcas” nas áreas comuns desacompanhados dos donos, nos visitantes barulhentos, nas festas igualmente barulhentas até altas horas, nos prolongados churrascos espalhando cheiro e fumaça para os vizinhos, no portão da garagem e da entrada social destrancados ou simplesmente abertos demonstrando desatenção e despreocupação com a segurança… Você pode se lembrar de outras coisas que incomodam e surpreendem.

Alguns destaques especiais merecem ser citados com mais ênfase. Podemos começar pelos moradores reclamões, que se queixam de tudo, a começar pelo mau cheiro da garagem causado pelo lixo que eles mesmos deixaram lá por não observarem os dias em que a coleta é feita no local. Também não dá para esquecer os condôminos que não pagam a taxa de condomínio no dia marcado e aqueles que prolongam esse atraso por meses e ainda fazem cara feia quando são cobrados, mas provavelmente reclamarão com o síndico se faltar água, se o portão eletrônico estragado não for consertado, se houver lâmpada queimada, se o prédio estiver sujo… O último destaque pode ser dado ao grupo de WhatsApp que existe em muitos condomínios onde são feitos os comunicados do síndico sobre os assuntos de interesse comum a todos os moradores que, aliás, também postam perguntas, reclamações e temas diversos que nem sempre interessam a todos.

Diante de tudo que foi falado pode até surgir a clássica dúvida sobre se é melhor morar num apartamento ou numa casa e até mesmo se existem condições que nos permitem fazer tal escolha. Mas de qualquer maneira cada caso é um caso.

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Só resta a outra metade do ano

por Luis Borges 30 de junho de 2019   Pensata

Os primeiros seis meses do ano já se foram, deixando no rastro um legado de incertezas e desconfianças que não nos ajuda a saber com alguma clareza para onde vamos. Mas ainda assim é preciso parar ligeiramente, mesmo que no ar, para avaliarmos nossas percepções em relação às expectativas até então existentes para o semestre que está se findando.

Isso deve ser feito para os mandatos do Presidente da República e dos Governadores dos estados, eleitos em outubro do ano passado, com a certeza de que quanto mais o tempo avança fica mais difícil de encontrar culpados para justificar o não encaminhamento de soluções sustentáveis para resolver os problemas crônicos existentes. Tenho a sensação de que o tempo continua passando indelevelmente, como é da sua natureza, enquanto os eleitos ainda não conseguiram mostrar a que vieram e que planejamento estratégico formularam para nortear seus mandatos. Não basta dizer que foram eleitos pelas urnas, como se isso fosse um passaporte automático para ficarem sentados na cadeira até o último dia do mandato fazendo o que dá na cabeça.

Podemos e devemos estabelecer parâmetros para avaliar e medir o desempenho dos governantes, que devem gerenciar pela liderança e não pelo comando. É claro que todos precisam ter uma capacitada equipe de assessores para trabalhar na formulação consistente de suas propostas, sem revogar a lei da gravidade e com o devido respeito à Constituição do país e dos estados.

Só para ilustrar a importância da avaliação de desempenho para impulsionar a busca da melhoria contínua vou citar aqui uma pesquisa de opinião sobre a atuação Governo Federal feita pelo Ibope para atender uma encomenda da Confederação Nacional da Indústria (CNI) cujos resultados foram divulgados no dia 27 de junho. Por mais que se fale e se questione resultados de pesquisas dessa natureza é forçoso reconhecer que eles trazem parâmetros que podem ajudar a melhor compreender a distância entre o sucesso e o fracasso na visão dos participantes da amostragem feita. Nessa pesquisa, realizada entre os dias 20 e 23 de junho com 2.000 pessoas em 126 municípios, o governo do Presidente da República foi considerado Bom/Ótimo por 32% dos entrevistados, Regular também por 32% e Ruim/Péssimo por outros 32%. A margem de erro é de 2%. A comparação com a pesquisa anterior realizada pelo Ibope em abril mostra uma piora na avaliação, já que o índice de Bom/Ótimo era de 35%, Regular 31% e o de Ruim/Péssimo era de 27%.

A pesquisa também mediu a reação dos entrevistados à maneira de governar do Presidente e mostrou que o percentual de desaprovação cresceu de 40% para 48%, enquanto a aprovação recuou de 51% para 46%. A confiança no Presidente também diminuiu. O percentual dos que confiam nele passou de 51% para 46% e os que não confiam aumentou de 45% para 51%.

Como se vê, a observação e análise desses dados e de outros recortes da pesquisa podem trazer mais informações para quem quer melhor compreender o que está acontecendo no plano federal. O mesmo pode ser feito para os governos estaduais.

Pessoalmente percebo que entre erros, acertos, “bateção” de cabeças, polarização da sociedade, fake news no varejo e no atacado, 13 milhões de desempregados e 4,9 milhões de desalentados, projeção de crescimento do PIB de apenas 0,8% até o momento, reforma da previdência deixando de fora os militares, anúncio de uma barulhenta novidade a cada dia… se a economia não retomar um crescimento sustentável as incerteza e desconfianças prosseguirão cada vez maiores. Até quando será possível aliviar as tensões crescentes do barril de pólvora do país, que é tão desigual e injusto? Os fatos não deixam de existir só porque são ignorados, negados ou justificados por causa de culpados.

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O professor é aquele que ensina ao doutor num processo que começa na mais tenra idade e vai até onde as pessoas conseguem ir na educação continuada. O que todos esperam é que os professores estejam sempre preparados para cumprir a nobre missão de ensinar e aprender na interação com seus alunos. Tudo deve partir das premissas de que não existe substituto para o conhecimento e de que a educação é a base de tudo. A crença é de que devemos partir dos fundamentos para os conceitos, suas aplicações e o atingimento dos resultados esperados. Mas como todos estamos cansados de saber e denunciar, nem tudo são flores para o professor em todos os níveis educacionais. É só parar um pouco e começar a fazer a lista de dificuldades de todos os modos que existem ao longo do caminho.

O que quero contar aqui se refere a pedras não imaginadas que surgiram no caminho de um professor de um curso de pós-graduação, nível de especialização – sentido amplo, em Gestão Estratégica de Negócios ofertado ao mercado por uma fundação sem fins lucrativos, mas não filantrópica, cuja sede fica na cidade de São Paulo. O fato é que a crise econômica atingiu em cheio o curso, que respondia por 70% do faturamento da fundação, e o número de turmas vendidas por semestre em todo o país, principalmente nas regiões Sul e Sudeste, caiu em torno de 50% nos últimos 2 anos.

O reposicionamento estratégico indicou a necessidade de uma inovação na estrutura curricular para aumentar a qualidade atrativa do produto, que era o mesmo desde o seu lançamento há 9 anos. De cara, foi admitido um novo coordenador para o curso, que exigiu a contratação de um assistente operacional de sua confiança. A primeira medida tomada foi redesenhar o curso em nome da inovação, sem pesquisar o mercado para verificar qual era a necessidade que seria atendida pelo curso “inovado” e de quem era essa necessidade. Ao começar a agir direto pelo “como fazer”, na ansiedade de alcançar resultados rápidos, a primeira medida foi cancelar algumas disciplinas e criar outras denominações que estão na moda, numa mudança muito mais cosmética do que consistente. O assistente do novo coordenador implementou as mudanças como um trator e sem coragem para conversar com os professores que tiveram suas disciplinas extintas, todos lecionando na fundação como pessoas jurídicas. Só afirmou que eles continuariam na lista de fornecedores da fundação caso surgisse alguma necessidade num momento futuro.

Então, sentindo na pele uma espécie de “demissão branca”, o professor que era o melhor avaliado pelos alunos numa série histórica de nove anos quis entender os parâmetros que foram utilizados para justificar as decisões tomadas pela nova coordenação. O assistente operacional tentou justificar dizendo que o professor questionador foi mal avaliado por uma turma, com a nota 8,2 numa escala de 0 a 10. O professor rebateu o assistente perguntando se ele havia lido suas outras 26 avaliações em que suas notas variaram de 9,3 e 9,8 em função da avaliação de quesitos como domínio e conhecimento do assunto, clareza e objetividade na exposição, capacidade de prender a atenção da turma, esclarecimento de dúvidas e cumprimento do programa. Sem argumentos para contestar o melhor professor segundo a avaliação dos alunos só restou ao assistente encerrar a conversa bruscamente, dizendo que as mudanças foram feitas para atender as exigências do mercado e recuperar a fatia perdida pela fundação. Arrematou dizendo que, infelizmente, aconteceu a dança das cadeiras e ele ficou sem espaço na nova configuração e que o passado glorioso não garante nada no presente.

Você já passou por uma situação desrespeitosa como esta em que os que deveriam ser líderes atuam como feitores correndo atrás do atingimento de metas malucas que jamais serão alcançadas?

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O senhor Candinho Rabelo, solteiro, 76 anos, aposentado pelo INSS, voltou a residir em sua cidade natal no interior de Minas há cerca de 2 anos. Ele deixou sua “terrinha”, que hoje tem em torno de 9 mil habitantes, com apenas 20 anos de idade, em busca de melhores condições de vida. Periodicamente voltava lá para visitar toda a família e seus descendentes, no melhor estilo dos mineiros. Com o passar dos tempos quatro dos seus irmãos se casaram e sua irmã mais nova, Dete Rabelo, hoje com 74 anos e solteira, também aposentada pelo INSS, ficou morando com os pais na casa da família e cuidando sempre deles com seu modo intransigente de ser.

Quem primeiro veio a óbito foi a mãe e Dete prosseguiu cuidando do pai, que algum tempo depois também partiu para outro plano. O luto passou e ela continuou morando sozinha na casa da família, onde tudo acontecia conforme o seu querer. Suas manias se acentuaram ao longo de três décadas, nas quais perdeu dois irmãos e viu os sobrinhos crescerem.

Em Belo Horizonte, Candinho seguia no seu baile da vida. Até que perto de completar 74 anos se viu sem emprego e doente. Depois de doze dias de internação, participação efetiva de alguns sobrinhos em sua recuperação e prognóstico de que não poderia mais viver sozinho, só foi possível uma saída. A solução foi voltar para a cidade natal e tentar se reintegrar à família, contando com a irmã, as sobrinhas e um sobrinho.

Passados dois anos morando com a irmã na casa herdada dos pais, agora ele toma uma pequena dose diária de cachaça para bambear os nervos e aguentar o duro convívio marcado pelas manias da “mana”. Candinho Rabelo diz que tem passado por grandes provações, que nos momentos mais conflitantes tem vontade de “voar no pescoço” da irmã, que ele considera louca, e que só vai levando a vida por não ter coragem de se suicidar. Entretanto ele lamenta não ter se preparado para a aposentadoria e a cada dia sente falta dos projetos que não fez para essa fase da vida. Ele chega até a tentar compreender o sistemático e ditatorial jeito de ser da irmã, também idosa como ele, mas o que ele nunca imaginou é que um dia voltariam a morar cotidianamente na mesma casa. E após as raivas de todos os dias acaba por se conformar com o dito popular que diz que “o que não tem remédio, remediado está”.

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O IBGE divulga no final de cada mês o resultado da Pnad Contínua do trimestre formado pelos três meses anteriores. A que foi divulgada no dia 31 de maio mostrou que, de fevereiro a abril, a taxa de desocupação da população economicamente ativa chegou a 12,5%, o que equivale a 13,2 milhões de pessoas desempregadas, e que as pessoas desalentadas, que desistiram de procurar trabalho, chegaram a 4,9 milhões. Esses números tem se mantido em torno do mesmo patamar desde o último trimestre de 2017 e, até o momento, a economia não dá sinais de recuperação capaz de reverter esse quadro.

Um ponto aqui é verificar ou imaginar como tem sido a estratégia de sobrevivência para quem não está conseguindo trabalhar, ainda mais que, quanto pior a situação, pior mesmo. Será que alguma reserva financeira ou patrimonial já foi usada nesse período recente ou as dívidas aumentaram? Como será que está a capacidade de familiares e amigos para ajudar solidariamente na travessia tão difícil nesse tipo de situação, em todos os seus aspectos? O que esperar das organizações de ajuda humanitária, já que do poder público não há muito do que se obter?

Outro ponto é pensar um pouco nos 92,4 milhões de pessoas que estão trabalhando, segundo a Pnad Continua, número que obviamente também tem se mantido estável após sucessivas quedas, ou seja, caiu para pior. Para esses também é bastante visível que o poder aquisitivo está caindo em função da inflação medida pelo IPCA, que é diferente conforme o perfil familiar, dificuldades nas negociações de reajustes salariais anuais, além de reajuste zero, em geral, para servidores públicos do Poder Executivo da União, estados e municípios, isso para citar apenas algumas causas. Para agravar a situação a energia elétrica aumenta em 6,93%, o plano de saúde suplementar aumenta 21%, a gasolina, o óleo diesel e o gás de cozinha aumentam seus preços em função da cotação internacional do petróleo e da variação do dólar enquanto os alimentos em geral, medicamentos e a prestação de serviços também dão seus pulos, apesar da sazonalidade da oferta e da procura específica de alguns deles. O que é possível fazer diante de tantas restrições e piora de condições, principalmente para quem não quer se endividar com juros tão altos ou mesmo queimar reservas ainda existentes? Provavelmente terá chegado a hora de rever o perfil de consumo elegendo novas prioridades que, no mínimo, abrem mão dos supérfluos e combatem fortemente os desperdícios de qualquer natureza. Ainda é preciso pensar em poupar um certo percentual da renda para que, num futuro não muito distante, essa mesma reserva venha se somar aos proventos recebidos de uma aposentadoria.

O fato é que estamos passando por uma conjuntura em que a estratégia continua sendo de sobrevivência que já vem de um bom tempo atrás e que ainda persistirá por mais um bom tempo, pois os cenários que se desenham não nos permitem enxergar de outra forma. É por isso mesmo que não dá para abrir mão da gestão orçamentária e tomar sempre as medidas necessárias em prol da sobrevivência, por mais difícil e desafiante que seja tudo isso. Haja resiliência!

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