O baile prossegue

por Luis Borges 3 de novembro de 2019   Pensata

Completei 65 anos de idade no dia 24 de outubro, na primavera, com o calor de verão e escassez de chuvas ajudando a desenhar cenários de racionamento de água para o abastecimento domiciliar em Belo Horizonte e Região Metropolitana. Se essa é uma idade emblemática em nossa cultura, o fato é que um novo ano já começou a ser trilhado num caminhar que exige adequação para usufruir da energia existente. Se um tanto bastante representativo do curso de vida já foi cursado, fica a expectativa sobre o que ainda vem por aí diante da certeza definitiva da finitude que essa passagem pela Terra tem.

Essa data do meu aniversário de nascimento me proporcionou receber manifestações de carinho e apreço de muitas pessoas que fazem parte de meu viver e conviver em diferentes dosagens e maneiras. Nas conversas que fui tendo uma pergunta que surgiu com boa frequência foi sobre a hora em que nasci. Respondi a todos que segundo minha mãe Lazinha Borges foi às 4 horas da manhã na Santa Casa de Misericórdia de Araxá, a capital secreta do mundo. Apesar da aleatoriedade da hora de se nascer pelo parto normal eu insisto em dizer que cheguei cedo, antes da alvorada, para aprender que o critério é o trabalho e conforme meu pai Gaspar Borges, “primeiro a obrigação, depois a devoção”. Quem me conhece sabe como essa crença faz parte do meu viver.

Outra abordagem e talvez a mais frequente foi sobre a perspectiva para a continuidade da vida em função das várias variáveis a nos impactar de diversas maneiras e variados graus de risco. Isso estimulou boas conversas à luz de determinadas condições de contorno, sem muitas fantasias, mas com um certo realismo esperançoso no imenso campo das probabilidades. Essencialmente eu disse que espero ter a capacidade de gerenciar para manter o que foi possível construir na trajetória percorrida até o momento, sempre focado e ancorado na família que tenho. Obviamente que, se houver espaços para a melhoria contínua, mesmo que lentamente, ou até mesmo para alguma inovação, tudo poderá ser avaliado de maneira gerenciada seguindo premissas e diretrizes estratégicas que priorizam a manutenção do que se tem e consciente dos riscos inerentes à complexa arte de viver. Também realcei que agradeço por tudo o que foi possível fazer antes de chorar pelo que não deu, mantida a crença no estado de bem-estar social com a paciência, persistência e resiliência que nos testa e desafia a todo instante. Foi aí que alguém perguntou sobre a saúde para prosseguir no baile da vida. Afirmei que minha expectativa é ter condições funcionais adequadas compatíveis com os limites já impostos pela teoria das restrições sem cair na obsessão terapêutica pela cura e muito menos na busca pela plástica juventude eterna.

Então agora é continuar caminhando na esperança de chegar bem ao meu próximo aniversário de nascimento que a cada instante já vai ficando mais próximo. É muita confiança!

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Uma atitude perante a manutenção

por Luis Borges 29 de outubro de 2019   Pensata

São cada vez mais frequentes nos meios de comunicação as notícias que relatam desabamentos e incêndios em casas, edifícios, museus, hospitais, estádios, casas de diversão… Também são frequentes os relatos sobre veículos automotores parados com algum tipo de defeito em ruas, avenidas, praças, muitas das quais fazem parte de grandes corredores de sistemas viários urbanos, bem como nas rodovias de pistas simples, duplas e até triplas, algumas com acostamentos e pistas marginais enquanto outras nem acostamento possuem. De qualquer maneira o veículo parado devido a algum defeito ou até mesmo pegando fogo é sempre um transtorno para todo mundo que busca e precisa de mobilidade.

Obviamente que essas notícias tem seu prazo de validade na mídia e vão rapidamente sendo substituídas por novos acontecimentos que passam a ser prioritários para a divulgação em função do grau de novidade que trazem.

Quando alguém para tudo para tentar compreender quais são as causas desse tipo de problema cada vez mais repetitivo perceberá através de fatos e dados que uma delas é a falta de manutenção desses ativos. Podemos imaginar também a quantidade de problemas causados pela falta de manutenção nas residências, escolas e pequenas empresas, em vilas e bairros que não aparecem com destaque na mídia, e quando muito apenas viram registros nas estatísticas do Corpo de Bombeiros, SAMU, ou pronto-socorro de algum hospital.

Mas o que e como fazer para ajudar a resolver esse problema crônico no médio e longo prazos? Inicialmente é preciso educar e treinar as pessoas para mostrar a essencialidade da manutenção em todos os sistemas, processos e atividades que envolvem e comprometem a vida humana e dos demais componentes do ecossistema. Torna-se extremamente necessário que todos tenham uma atitude perante a manutenção, cada qual no âmbito da autoridade e responsabilidade que tem em relação ao que precisa estar sempre disponível para o uso e, portanto, cumprir plenamente a sua função. Aqui podemos dizer que se tudo começa com a gente, um bom exemplo pode ser dado pela manutenção da nossa própria saúde, expressa pela manutenção do corpo humano que visa mantê-lo na plenitude de suas condições funcionais. Podemos inclusive lembrar que a manutenção em geral pode ser corretiva, preventiva ou preditiva, mas na nossa cultura ainda há um predomínio da manutenção corretiva, que entra em ação só após a manifestação de falhas, defeitos ou quebras. Isso contrasta com o sempre repetido dito popular que prevenir é melhor que remediar, mas há distância entre o que se diz e o que se pratica.

O que nos resta, caro leitor, é avaliar qual tem sido a nossa atitude perante a manutenção em todos os aspectos em que estamos envolvidos no nosso cotidiano. Será que estamos encarando de frente as soluções que o problema exige ou simplesmente ficamos negando, ignorando ou dando desculpas para fugir dele? Quando o edifício cair, a igreja pegar fogo ou o automóvel quebrar no meio da estrada só será possível constatar as consequências da omissão e da falta de comprometimento com a vida nossa e a dos outros.

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De volta a Campinas

por Luis Borges 21 de outubro de 2019   Pensata

Estive na cidade de Campinas (SP) durante o feriado nacional de 12 de outubro, dia de Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil. Nesse dia aconteceu mais um encontro de membros da família Magela, cuja base fica na cidade de Araxá (MG). Dessa vez o encontro ocorreu na residência de meu sobrinho Fernando Henrique, o “Difê”, e de sua esposa Dayane. Foi simplesmente memorável para todos que se fizeram presentes.

Por outro lado esse encontro me fez lembrar inevitavelmente alguns detalhes que marcaram a minha primeira ida à cidade no já longínquo janeiro de 1973, portanto há quase 47 anos. A população da cidade era estimada em 400 mil habitantes e de lá para cá simplesmente triplicou. Cheguei a Campinas pela dor, em busca de alguma solução para os problemas que já vinha enfrentando em Uberaba (MG) decorrentes de um glaucoma cortisônico em ambos os olhos, diagnosticado seis meses antes. A pressão intraocular estava muito elevada, totalmente descontrolada em decorrência da ação nada cuidadosa de um médico oftalmologista que nunca se preocupou com os efeitos colaterais do uso de medicamentos contendo corticoides durante um ano e meio. Minha participação no vestibular de medicina em Uberaba, no início de janeiro, ficou bastante comprometida e a ficha de número 15.005 contendo meu prontuário médico simplesmente desapareceu do consultório do profissional que acompanhava meu caso, que se iniciou com uma alergia persistente. Eu era um paciente, que é diferente de cliente, e como tal seguia sem questionamentos todas as prescrições do médico especialista e catedrático da oftalmologia.

Em Campinas, fui atendido no Instituto Penido Burnier, referência no tratamento de doenças nos olhos, onde compareci mensalmente até o mês de julho. No início de agosto passei a residir em Belo Horizonte, com a indicação para que meu caso fosse acompanhado pela equipe do Hospital São Geraldo, especializado no tratamento dos olhos, anexo ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da UFMG.

Ao longo desses quase 47 anos que já se passaram em meu curso de vida voltei a Campinas diversas vezes. Foram atividades profissionais de consultoria em gestão estratégica de negócios, aulas no curso de pós-graduação em gestão de negócios da academia do grupo Accor e em seminários na Universidade de Campinas. Também passei diversas vezes pelo Aeroporto Internacional de Viracopos, dentro da logística, por exemplo, para chegar à cidade de Paulínia (SP) ou voltando em voos diretos de Fortaleza (CE) para fazer conexões rumo a Belo Horizonte.

Desta vez aproveitei a ida à cidade para visitar Castor e Raquel, visando polir uma amizade que nasceu na militância política de esquerda no movimento estudantil universitário na segunda metade da década de 70 do século passado. Como de outras vezes voltei a encontrá-los, o que foi muito bom por ter sido mais uma vez ao vivo e, como sempre, não faltaram reminiscências de tempos que já se passaram. Vale a pena registrar que atualmente o amigo Castor continua firme em seu ativismo político-partidário e é conhecido em seu bairro como “o comunista de chapéu”.

Como dizia meu finado sogro Geraldo (Lalado) Magela de vez em quando é importante dar uma olhada para trás e verificar o quanto já andamos e como fizemos correções no rumo de nossas vidas devido aos desafios que foram surgindo. Assim, segundo ele, renovamos nossas energias e nos fortalecemos para melhor prosseguir rumo ao futuro que chega a cada instante.

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Cuidar dos cuidadores de idosos

por Luis Borges 14 de outubro de 2019   Pensata

O Presidente da República vetou integralmente a lei que regulamentava a profissão de cuidador de idosos, que tramitou desde 2007 em Brasília. O veto foi mantido pelo Congresso Nacional na sessão de 2 de outubro, em plena Semana Nacional do Idoso. O argumento básico do Presidente para justificar o veto foi que os idosos não precisam de profissionais qualificados para cuidar deles. Outro Projeto de Lei sobre a regulamentação da profissão está tramitando na Câmara dos Deputados após já ter sido aprovado pelo Senado. Será que dessa vez a Lei passará pela sanção presidencial sem vetos?

Enquanto isso a função de cuidador de idoso continua sendo apenas uma ocupação prevista no Código Brasileiro de Ocupações, podendo ser exercida por quem estiver disposto ou necessitando de trabalho independente de qualquer formação. A diferença entre uma ocupação e uma profissão regulamentada é que a profissão exige o cumprimento de determinados requisitos para ser exercida. No caso dos cuidadores de idosos a regulamentação da profissão pode passar a exigir, entre outras coisas, ensino fundamental completo, aprovação em curso de qualificação para formação profissional específica com carga mínima de 180 horas e definição de atribuições profissionais inerentes. Também é importante lembrar que a ocupação de cuidador de idoso é uma função exercida em 90% dos casos por mulheres. Segundo dados do IBGE esta é a atividade que mais cresceu no Brasil nos últimos 10 anos ao dar um salto de 550% no número de vagas abertas.

É muito comum ouvir pessoas falando que para ser cuidador de idoso o pré-requisito é ter amor e paciência ao lidar com as pessoas, mas sabemos que não é só isso, pois a formação profissional devidamente qualificada é fundamental. Também é necessário fazer um contrato de trabalho entre o cuidador e seu cliente ou responsável legal por meio da carteira de trabalho, microempreendedor individual (MEI) ou pessoa jurídica que atua no segmento para a segurança de todos os envolvidos. A pior condição ainda predominante é o trabalho informal não documentado, que traz a precarização da relação de trabalho e insegurança jurídica, além da falta de cobertura previdenciária para o cuidador agora e no futuro.

Mas por que é estratégico cuidar da cuidadora e do cuidador de idosos? Basta verificar no nosso cotidiano quem está disposto, quer e pode cuidar de um familiar como pai, mãe, avô, avó, tio ou tia, por exemplo. É por isso mesmo que o cuidador torna-se essencial em seu trabalho profissional, porém precisa ter as condições necessárias e suficientes para conseguir vencer o desafio que é cuidar de pessoas com diferentes graus de restrições em suas condições funcionais. Em síntese, precisamos lembrar sempre que o cuidador precisa ser cuidado para que ele possa, profissional ou voluntariamente, cuidar dos outros.

E você, caro leitor, o que tem para contar sobre os cuidados que dedica às pessoas idosas que fazem parte do seu cotidiano na vida familiar e no universo de suas amizades? Vale também pensar no trabalho voluntário que algumas pessoas prestam a organizações da sociedade civil de natureza filantrópica que atuam em Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI). Será que você se engajaria nessa modalidade de atuação social?

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O tempo não para e prossegue passando de maneira indelével. Por isso mesmo completou-se mais um ciclo que trouxe à tona o Dia Internacional da Pessoa Idosa, comemorado em primeiro de outubro.

Embora eu continue pensando e tentando agir como se todo dia devesse também ser da pessoa idosa na pauta da sociedade, o fato é que existem vários tipos de posturas em relação ao tema, tanto no que tange à preocupação e ao planejamento para se chegar lá quanto à postura oposta, bastante descompromissada.

Cada postura tem as suas justificativas para as escolhas feitas seguindo uma visão do curso de vida de cada pessoa que poderá se tornar idosa sob determinadas condições de contorno. Mas “a gente vai contra a corrente até não poder resistir/ Na volta do barco é que sente o quanto deixou de cumprir”, inclusive por não perceber todas as variáveis do jogo de xadrez que se joga. Digo isso em função da cena vista e percebida em detalhes por quem estava na padaria Samarone por volta das 7 horas do domingo, 29 de setembro, num bairro da ainda existente classe média na zona leste de Belo Horizonte.

No balcão da padaria dois idosos tomavam café enquanto outros três faziam seus pedidos em diferentes níveis de detalhes e tons de ansiedade. Todos estavam sozinhos, moram nas redondezas, vão à padaria diariamente e estão na faixa etária de 65 a 75 anos. Ao especificar os pedidos quase simultaneamente um deles pediu um pão francês sem o miolo, mas com manteiga de leite, outro quis do mesmo pão, mas com queijo, enquanto o terceiro realçou que seu pão seria com muita manteiga de leite. O café variou da xícara de cafezinho puro ou pingado de leite até a média de café com leite.

Mas qual é o preço que idosos e não idosos pagam pelo café da manhã na padaria Samarone? A xícara de café puro ou pingado custa R$1,40, o pão com ou sem miolo e manteiga de leite R$1,80, a média de café com leite R$ 2,50, o pão com queijo tipo mozarela R$ 5,45 e o misto-quente também R$ 5,45. Como se vê a modalidade mais simples composta por uma xícara de café e pão com manteiga fica em R$ 3,20 e ao final de 30 dias chega a 96 reais. Por outro lado a modalidade composta por uma xícara de café e pão com queijo tipo mozarela fica em R$6,85 e em 30 dias chega a R$205,50. Se imaginarmos outros gastos que os idosos têm com alimentação, saúde, moradia, lazer… fica evidente que a fase idosa da vida traz para todos um desafio que deveria ser pensado o mais cedo possível, apesar de todas as dificuldades e pedras que existem pelo caminho. Segundo o IBGE a população de idosos do Brasil, aqueles com idade superior a 60 anos, já está em torno dos 30 milhões pessoas.

Caro leitor você já faz parte desse contingente de idosos ou está caminhando firme para ingressar nele? Você já se sente preparado para enfrentar o café da manhã na padaria de seu bairro todos os dias, inclusive com a devida sustentabilidade financeira? É o que temos para hoje com o devido realismo esperançoso.

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Caminhando para o fim do ano

por Luis Borges 30 de setembro de 2019   Pensata

Você já deve ter ouvido diversas vezes em tom de exclamação que “o tempo não para” ou “o ano está voando, passando rápido demais”. O mínimo que se pode esperar é que as pessoas consigam fazer uma melhor gestão de seu próprio tempo, que conheçam o básico de um método de gestão e o coloquem em prática no dia-a-dia. De repente quem planejou o próprio ano em curso pode e deve encontrar um tempo na agenda para avaliar o que foi planejado, o que foi executado, quais os resultados alcançados, as pendências existentes e os próximos passos com os devidos reposicionamentos. Afinal de contas já estamos na primavera, cujas características se manifestaram bem antes do fim do inverno que bateu recorde de altas temperaturas, baixa umidade relativa do ar e queimadas de diversas dimensões.

O que ainda resta ou é possível fazer nesses últimos três meses do ano em que  teremos pela frente a festa da padroeira nacional, o dia dos nossos finados, a lembrança da Proclamação da República – nem tão republicana assim, a festa de Natal e a virada do ano. Nesse sentido vale a pena focar no planejamento e execução de ações relativas ao indivíduo, à família, ao trabalho profissional e à inserção na sociedade. É obvio que são muitas as variáveis e as dimensões envolvidas em função das especificidades e contextos vividos, de modo que cada caso é um caso.

Entretanto, de qualquer maneira, se muitas são as necessidades diante de recursos nem tão abundantes assim, inclusive financeiros, torna-se essencial estabelecer as prioridades a serem atendidas em função das restrições existentes. Pelo visto surgirão muitas coisas que serão transferidas para o planejamento de 2020, que também precisa começar a ser pensado. Partindo pelo lado individual e familiar, a título de exemplo, seria importante relembrar o que é preciso fazer ainda esse ano no que tange às condições de saúde em relação a indicadores acompanhados por médicos, dentistas, nutrólogos, fisioterapeutas…

Outro exemplo a ser usado para ilustrar o que estou propondo é verificar o que ainda pode ser feito nesse ano em relação à meta hipotética, digamos, de visitar 10 amigos ou famílias amigas até a virada do ano, mas sem deixar tudo para o último dia. De repente fico imaginando que uma provável avaliação do resultado dessa meta pode ter mostrado que até agora só três foram visitados. É claro que não valem o bom dia, boa tarde e boa noite do WhatsaApp.

Caminhando para o último exemplo ilustrativo sugiro uma análise do orçamento familiar anual para verificar a distância que existe até o momento entre o que foi orçado e o que foi gasto, para enxergar o que realmente está acontecendo. Será possível terminar o ano sem aumentar o endividamento ou simplesmente quebrado?

Essa é uma possibilidade que temos para testar a nossa capacidade de intervir nos processos do dia-a-dia de nossas vidas, nos implicando neles como parte essencial de seu desenrolar. Tudo começa com a gente e depende também de nós. Tomemos os cuidados necessários para agir, pois o tempo não vai parar.

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O filho só pensa na França

por Luis Borges 23 de setembro de 2019   Pensata

A senhora Nirmatele Barros trabalha como vendedora numa loja especializada em roupas e calçados para crianças no bairro Funcionáriosm em Belo Horizonte. Ela é separada do marido há 13 anos, mas dessa relação resultaram três filhos que hoje estão com 19,17 e 15 anos de idade, sendo um rapaz e duas mocinhas respectivamente. A configuração gerada pela separação do casal resultou na permanência dos filhos com a mãe, no pagamento mensal de pensão básica por parte do pai para ajudar no sustento dos filhos e na cessão, pela avó paterna, de um apartamento para moradia dos netos com a mãe por tempo indeterminado. A descrição básica do imóvel mostra que ele possui três quartos, uma vaga de garagem – o que nem todos os apartamentos do local possuem – e fica no terceiro andar de um edifício de 12 apartamentos, sendo quatro por andar.

A vida prosseguiu o seu curso marcada pelos desafios cotidianos para a mãe, que optou por viver e lutar obsessivamente em prol dos filhos e contando com a ajuda sempre decisiva da avó naqueles momentos em que tudo parece sem saída para os problemas mais difíceis. Por sua vez, o ex-marido encontrou outro relacionamento do qual vieram mais três filhos, mas cumpre religiosamente o acordo feito na época da separação.

Agora os filhos de Nirmatele prosseguem suas trajetórias cheias de sonhos de melhorar continuamente a qualidade de vida com todas as pressões trazidas pelos diversos tipos de consumo numa conjuntura pouco favorável aos jovens, que vão se colocando à disposição do mercado na busca de oportunidades.

Sem conseguir trabalhar a frustração por não ter obtido a pontuação necessária para ingressar no curso de Engenharia Mecânica de uma Universidade Federal no último Enem, o filho primogênito decidiu passar um tempo com a namorada na França para conhecer outra cultura e aprender um pouco da língua francesa. Esse projeto virou uma grande obsessão e gerou expectativas bem maiores que a realidade. A mãe não conseguiu mostrar ao filho os limites para a realização de sua vontade e, ao mesmo tempo, ele se manteve irredutível em seu intento, alegando que se não fosse assim melhor seria encurtar o tempo de sua passagem pela Terra nessa encarnação.

A mãe entrou em pânico e começou a buscar uma solução para o novo problema. Procurou o ex-marido, que após muito discurso sobre a sua atual condição financeira concordou em pagar a semestralidade de um curso intensivo de francês só para o filho. Também procurada, como sempre acontece nas horas mais problemáticas, a avó deu a passagem aérea de ida e volta e o dinheiro para a emissão do passaporte do neto. Sobrou para a mãe a tarefa de conseguir dinheiro para bancar as despesas do filho com moradia, alimentação, transporte… lá em Paris contando com o fato de que a parte da nora será toda custeada pela família dela. Diante da necessidade urgente de fazer dinheiro, Nirmatele, que já é isenta da taxa condomínio de R$300,00 por ser síndica do prédio onde reside, tentou alugar sua vaga de garagem para um casal vizinho por R$2.400,oo por um ano, pagos na data de assinatura do contrato. A proposta “deu ruim” na negociação e o casal acabou alugando outra vaga por R$150,00 pagos mensalmente no último dia do mês. Ao mesmo tempo a mãe do rapaz tentou vender seu automóvel usado, mas sem sucesso. Chegada a hora da partida o jeito foi fazer um empréstimo numa cooperativa financeira enquanto prosseguem as tentativas de vender o velho automóvel.

Finalmente o filho partiu antes da chegada da primavera no Brasil dizendo que só no próximo ano voltará a pensar no Enem e no curso de Engenharia Mecânica enquanto a mãe ficou em prantos amparada pelas duas filhas e a sogra.

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Seu município também pode quebrar

por Luis Borges 16 de setembro de 2019   Pensata

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística divulgou no dia 28 de agosto os dados contendo as suas mais importantes estimativas sobre os números que fotografam a população brasileira na data base de 1 de julho de 2019. Foi mostrado que o país tem uma população de 210,1 milhões de habitantes vivendo em 5.570 municípios que formam os 27 estados constituintes da União Federal. O município mais populoso é São Paulo, capital que conta com 12,2 milhões de habitantes distribuídos numa área de 1.521 km². O de menor população é Serra da Saudade, com 781 habitantes distribuídos em 335,7 km² na região do Alto Paranaíba em Minas Gerais.

Uma preocupação permanente dos municípios de todos os portes está na capacidade de se sustentarem diante de tantas atribuições que cada um tem, muitas das quais transferidas pela União ou estados sem necessariamente estarem acompanhadas dos recursos financeiros. Em suma, existe uma grande centralização da arrecadação de tributos nos planos federal e estaduais, que destinam aos municípios percentuais sempre questionados por eles devido à sua pequena magnitude. Também é bem lembrado que as pessoas moram nos municípios e muito mais na área urbana do que na rural.

Na atual conjuntura, o país prossegue em sua polarização político-partidária sem conseguir soluções para a crise econômica marcada pela aguda recessão de julho/2014 a dezembro/2016, pela pífia recuperação de 2017 a 2019 e pelas perspectivas nada animadoras até o final de 2022. Enquanto isso, o social grita.

A reforma trabalhista não combateu o desemprego, mas precarizou o trabalho. A reforma da previdência social se arrasta no processo de ser quase que carimbada pelo Senado. A reforma tributária pula que nem sapo para trazer de volta a CPMF enquanto o desmatamento das florestas e as queimadas agravam as condições vividas pelos municípios. A arrecadação de tributos em queda e os gastos sempre crescentes só acentuam o desequilíbrio das contas públicas dos municípios, dos estados e da União Federal. Tudo piora ainda mais diante do pouco apreço que se tem pelos modelos de gestão que podem ser utilizados na solução de problemas. Se a quebradeira de estados como Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Paraná, por exemplo, tem sido bastante divulgada, agora também está chegando a vez de muitos municípios começarem a mostrar seus níveis de quebradeira no exato momento em que todos preparam seus orçamentos para o ano de 2020. Será que o município em que residimos está bem das pernas e isso está demonstrado no Portal da Transparência das contas públicas? Ou será que seremos surpreendidos, como aconteceu com os 5.497 habitantes da cidade de Bento Fernandes, no Rio Grande do Norte, que dista 97 Km de Natal, onde o prefeito decretou calamidade financeira e suspendeu maioria dos pagamentos devidos pela prefeitura?

Apesar de todos os discursos sobre direitos adquiridos, do liberalismo econômico dos liberais sinceros – se é que existem – e da pressa dos que sonham em encurtar os caminhos da democracia real em nome de soluções mais rápidas para os crônicos problemas não resolvidos, o fato é que as coisas estão bastante difíceis para os municípios que, volto a repetir, são o local em que as pessoas moram.

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As cobranças desnorteantes

por Luis Borges 11 de setembro de 2019   Pensata

“Cada dia com sua agonia” é uma frase bastante repetida em alguns estados do Nordeste brasileiro como Sergipe, Alagoas e Pernambuco. Tudo fica mais difícil quando a mesma agonia surge repetidas vezes ao longo de um período de tempo. É o caso da agonia causada pela cobrança de uma dívida financeira, por exemplo. Como amola! Ela pode começar numa segunda-feira pela manhã, prosseguir à tarde e se estender pelos dias subsequentes sem dar trégua na ânsia de alguém que busca alcançar um resultado sob intensa pressão. Essa agonia que tanto incomoda pela forma, conteúdo e momento vivido tira o sossego de quem começa a receber por diversos meios de comunicação – WhatsApp, e-mail, mensagens de texto… – insistentes cobranças pelo atraso no pagamento da prestação de uma dívida que acabou de vencer.

Ilustra bem a situação o caso vivido desde a segunda-feira passada pela senhora Miroca Silva, viúva, 57 anos de idade, empregada doméstica que trabalha há oito anos numa casa de família situada na zona sul de Belo Horizonte, onde recebe um salário mínimo e meio por mês numa jornada de 44 horas semanais. Ela tem três filhos na faixa etária de 30 a 35 anos, todos casados e com um filho cada. Aconteceu que a persistente crise econômica de seis anos para cá, que não dá sinais de recuperação, pegou em cheio o seu filho do meio, que ficou desempregado no início de 2017. Após seis meses de uma procura insana por nova oportunidade de trabalho e queimando o mínimo possível do saldo recebido do fundo de garantia pela demissão sem justa causa, surgiu um novo alento quando foi enxergada a possibilidade de comprar um automóvel popular seminovo, tipo Ford Ka básico, para trabalhar no transporte de passageiros por aplicativos.

Devido ao desemprego coube à mãe “tirar”(ou seja, comprar) o automóvel, financiado em seu nome, mediante uma entrada de R$9.000,00 e o pagamento de 48 parcelas mensais fixas de R$930,00. Tudo caminhava a duras penas em longas jornadas diárias de trabalho e com os diversos riscos inerentes à atividade até o automóvel sofrer um “atropelamento” na traseira advindo de um caminhão baú, que causou sua perda total. Até conseguir receber o seguro feito pela empresa proprietária do caminhão por danos causados a terceiros, o tempo foi passando e o motorista entrou no lucro cessante devido à paralisação de sua atividade e ausência de seguro do seu veículo.

O atraso no pagamento das parcelas mensais foi inevitável e a cobrança insistente, agressiva e desrespeitosa por parte da financeira começou no dia seguinte ao vencimento. A mãe do rapaz foi acessada em seu próprio celular, em ligação direta, e pelo WhatsApp, além de diversos outros contatos pelo telefone fixo da casa onde trabalha. Por diversas vezes ela tentou explicar que apenas fez a dívida em seu nome para ajudar o filho desempregado e que ele estava com o pagamento atrasado devido a um violento acidente sofrido pelo automóvel. A situação prosseguiu na mesma toada ao longo da semana, com ameaças de recolhimento do automóvel independente de tudo o que já havia sido pago e também com lembranças de que a parcela atrasada deveria ser paga o quanto antes com juros e multa pelo período em atraso.

E assim os dias prosseguem na mesma agonia para a mãe e o filho, que agora evitam ser aproximar de qualquer meio de comunicação que lembre as cobranças e o mal estar que elas geram enquanto cresce a sensação expressa pelo dito popular “o que não tem remédio, remediado está”, mas as perspectivas são muito sombrias.

Vale lembrar que segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e o SPC Brasil cerca de 63% das famílias possuem dívidas em atraso e cada vez mais crescentes nos últimos anos. Entre as diversas causas desse fenômeno estão os altíssimos níveis de desemprego, a perda de poder aquisitivo de diversas categorias e também a falta de educação financeira das pessoas em geral.

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Todo dia tem novos idosos

por Luis Borges 25 de agosto de 2019   Pensata

Em fevereiro de 1962 comecei minha trajetória de estudante no curso primário do grupo escolar Pio XII na capital secreta do mundo, a cidade eterna de Araxá (Minas Gerais). Eu tinha sete anos de idade e a minha mãe 28. Na parede da memória, como diz o cantor e compositor Belchior em sua música “Como nossos pais”, está registrada uma fala de minha mãe sobre uma visita feita por ela a seu tio, que era considerado um velho de 56 anos de idade. Naquela época, dados do IBGE registraram que a expectativa de vida das pessoas era 52,5 anos e o censo de 1960 mostrava uma população de 76,57 milhões de habitantes no país.

Agora em 2019, 57 anos depois, tenho encontrado ou conversado com pessoas que estão completando 60 anos de idade ao longo dos meses deste ano. As manifestações de alegria e agradecimentos por tudo que já foi vivido e também preocupações com o ciclo idoso da vida, que é finita, sempre tem permeado as conversas. Vale lembrar que a lei brasileira nº10.741 de 01/10/2003 criou o Estatuto do Idoso, definindo que esta condição passa a existir quando a pessoa completa 60 anos de idade. Também segundo o IBGE a expectativa média de vida hoje está em 76,5 anos, sendo que as mulheres chegam aos 80 anos e os homens aos 73. Já a população brasileira está estimada em 210,3 milhões de habitantes dos quais em torno de 30 milhões tem acima de 60 anos de idade, número que deverá dobrar ao final das próximas três décadas.

Existem estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) do Ministério da Economia sugerindo que a idade limite para que a pessoa seja considerada idosa passe para 65 anos devido aos níveis de longevidade alcançados atualmente. Podemos considerar que mais dias, menos dias essa mudança ocorrerá fundamentada em argumentos semelhantes aos utilizados para justificar a necessidade da Reforma da Previdência Social.

Sem querer fazer nenhum alarme, mas sendo bastante realista e pragmático, reitero que quem já chegou à condição de idoso legal precisa repensar e se reposicionar estrategicamente em função de várias variáveis que poderão impactar desfavoravelmente o seu curso de vida até o dia em que o espírito deixar o corpo. Às vezes nessa idade já se pode sentir arrepios e calafrios ao se pensar sobre onde, como e com quem morar, com que nível de saúde (condições funcionais), com quais condições financeiras, com que grau de dependência de filhos – se existirem- e do Estado liberal, com que níveis de autonomia e independência… O futuro chega a todo instante e nos desafia permanentemente com suas ameaças e oportunidades que desafiam nossas fraquezas e forças. Só chorar e se vitimizar enquanto os governantes se sucedem no poder acaba sendo muito pouco e quanto pior para os idosos, pior mesmo.

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