Paradoxos

por Convidado 31 de agosto de 2015   Convidado

por Benício Rocha*

A chuva mais rala do que a cabeleira do meu pai insistia em cair, como os sonhos dele.

Isso era mais um paradoxo em sua vida, pois se de um lado as plantas agradeciam, e ele dependia delas para viver, do outro a estrada tornava impraticável a distribuição e a venda delas.

Mas, para ele, a vida era mesmo um paradoxo. A bela idade sobre os ombros, tão desejada e defendida ao longo dos anos com uma alimentação ajuizada, noites bem dormidas e vida com muitos movimentos ao ar livre, trazia em si a lembrança, diariamente, às vezes através de pequenas dores, às vezes através de exames laboratoriais feitos lá na cidade e interpretados pelo médico sempre sorridente e condescendente. Era a certeza de que o fim se aproximava, inexoravelmente.

E seus poucos cabelos se eriçavam ao olhar aquela estrada lamacenta rodeada por uma vegetação sorridentemente verde…

Vista aérea de viagem entre Araxá e Belo Horizonte. / Foto: Marina Borges

Vista aérea de viagem entre Araxá e Belo Horizonte. / Foto: Marina Borges

O longo caminho o trouxera ao nunca querido e sempre sonhado tempo dos poucos sonhos e muitas apreensões, das despedidas diárias e da lembrança de que o verde passa rápido e tudo fica seco, sem vida. E tudo se transforma em parte da história, que é eterna.

A vida do meu pai foi longa e rápida, seus ensinamentos curtos e eternos.

Ao longe ainda posso ver um Jeep, café-com-leite, pequenino, lutando e sendo vencido pela estrada gigantesca e lamacenta.

Combate entre a morte e a vida.

*Benício Rocha é caratinguense ausente e saudoso, mineiro da gema, amante da boa prosa, sócio da MGerais Seguros, aprendiz de servo do Senhor.

  Comentários
 

por Sérgio Marchetti *

Tenho reparado que no dia a dia utilizamos frases prontas numa proporção muito maior do que imaginava. Tem provérbios para todas as ocasiões e gostos. Constato que nessa liberdade semântica há muitas lições soltas no ar – verdadeiras sabedorias – que, por pura humildade, vêm fantasiadas de ditos populares, mas trazem, sob trajes simples, autênticas filosofias. Alguns desses ensinamentos podem não ter nenhuma mensagem para os dias de hoje, mas muitos são atemporais, continuam atuais e ainda nos servem como argumento forte ou lição de vida.

Minha avó materna dizia sempre: diga com quem tu andas que te direi quem és. Vejam, caros leitores, a verdade que está contida nessas palavras. As companhias, creio, definem sim quem são as pessoas, seus hábitos, gostos etc. Para ilustrar: pessoas que andam com outras pessoas que falam mal de terceiros, aprovam ou são coniventes com os que possuem esse defeito gravíssimo. Já dizia um provérbio chinês: o medíocre fala de pessoas. O comum fala de fatos. O sábio fala de ideias.

Como mencionei, é enorme o repertório de frases prontas que andam de boca em boca. Dizem que nos casos de quem tem boca vai a Roma e quem não tem cão, caça com gato, entre outras tantas, constam versões diferentes. Na primeira, apostam num outro significado: quem tem boca vaia (do verbo vaiar) Roma. Já a caça não seria com o gato, mas como o gato, ou seja, caçar solitariamente como faz o gato. Observem que as novas opções têm mais sentido, mas não garanto que sejam as originais. Já algumas expressões são tão diretas que indicam a ação esperada, como no caso de Deus ajuda quem cedo madruga e devagar se vai ao longe. Há também nesses ditos uma verdade, uma lição que previne as pessoas para os passos que pretendem dar na vida. Na realidade, sugerem que não devemos ir com muita sede ao pote e que é necessário ter cuidado e saber esperar, pois, quem espera sempre alcança (às vezes cansa), mas realmente em muitos casos a pressa é inimiga da perfeição. Dá até para explicar um provérbio com outro. Viram?

Aos incautos, que não compreendem as fraquezas e os medos alheios, é bom que se lembrem de que gato escaldado tem medo de água fria. Para os rancorosos, águas passadas não movem moinho. Orgulhosos, nunca digam que dessa água não beberão. Valentes, lembrem-se de que não se deve cutucar a onça com vara curta.

Curiosamente, algumas frases têm sentido ambíguo e deturpado. É dando que se recebe, frase da maravilhosa oração, atribuída a São Francisco de Assis, que virou dito popular, sofre desse mal. Em termos de bondade, entendemos que o ato de dar ao próximo nos traz recompensa espiritual. Quem dá amor recebe amor. A frase tem também sentido vulgar; na prostituição traduz com fidelidade a ação desenvolvida. Na política, significa troca ilícita e propina.

Por falar em política, a nossa está mais suja do que pau de galinheiro. Não há dúvidas de que debaixo desse angu tem caroço, pois onde há fumaça, há fogo, e, para quem sabe ler, um pingo é letra.

Então, vamos para frente que atrás vem gente.

* Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.

  Comentários
 

É como eu me chego

por Convidado 27 de julho de 2015   Convidado

por Benício Rocha*

Observando as flores que eu dera à minha esposa há uma semana, já pálidas e murchando, não pude evitar a corrida dos meus olhos ao espelho, amigo de outrora, inimigo implacável de agora.

Ali estava meu rosto, que muda a cada dia. E vi que meus olhos diminuíram em tamanho e brilho, a boca como que retraiu, as sobrancelhas encontram-se no meio do caminho e não há dermatologista que dê jeito nisso. Minhas pálpebras, plácidas como orelhas de basset hound, despencam sobre meus olhos. E não quero incluir o cirurgião plástico no meu grupo de prestadores de serviços!

Fujo o olhar do espelho e viajo rápido pelo quarto. Estaciono no cesto de revistas. Sobre todas, uma edição especial da “Fatos e Fotos” remete minha  mente para a agitação de 68, do inumerável número de sonhos perdidos pelos anos subseqüentes. 1968, eu, cheio de mim. 1968, eu, perdido em mim.

Que privilégio viver em qualquer época, que privilégio viver quando o mundo está em mudanças como nunca, tudo e todos se pensando, repensando.

Já quase cansado sonho comigo, um garoto que amava os Beatles, Rolling Stones, Ivan Lins, Ivan Lessa, Mário de Andrade, Mário Quintana, Chico Buarque, Francisco Alves, Milton Nascimento, Cauby, Nelson, Noé, Garrincha, Tostão, Pelé, Jorge Ben, Jorge Amado, Cecília Meireles, Rachel de Queiroz, Clarice, Guimarães Rosa, Gil, Machado de Assis e amava, e amava, e amava…

Exausto, respiro fundo e viajo mais fundo ainda pra dentro de mim. Encontro minha mente a todo vapor, agitada, pensante, menos sonhadora, mais realista, mas também delirante, totalmente Kandinsky.

Estou, naturalmente, mais próximo da minha própria plenitude. Porém, pressionado e incompreendido pelos olhares e comportamentos limitadores dos que me rodeiam.

A sociedade e eu. Vinho maduro bebido por uma sociedade que desconhece a palavra degustar…

É como eu me vejo,

É como eu me sou,

É como eu me chego,

É como eu me vou…

*Benício Rocha é caratinguense ausente e saudoso, mineiro da gema, amante da boa prosa, sócio da MGerais Seguros, aprendiz de servo do Senhor.

  Comentários
 

No tempo em que eu era imortal

por Convidado 6 de julho de 2015   Convidado

por Sérgio Marchetti *

Um amigo me confidenciou que estava com depressão por ter lutado a vida inteira e não ter conseguido realizar seus sonhos. Alguns, disse ele, estiveram muito próximos de acontecer. Mas a lâmina do destino, de maneira incompreensível e muitas vezes injusta, cortou a trajetória de suas realizações. Ele acentuou que, entre uma frustração e outra, uma crise e outra, veio o tempo que, ininterruptamente, roubou-lhe o vigor, o brilho e a esperança. Inspirado em Jorge Luis Borges, disse que, se pudesse começar de novo, faria tudo diferente, mas sabe que agora não tem mais tempo.

Esse relato, infelizmente, não é raro. Muitas pessoas, independentemente da idade, estão fragilizadas, desiludidas e cansadas de ser coadjuvantes, quando possuem bagagem suficiente para ser protagonistas. Pessoas há que acreditam na sorte. Outras apostam no destino: maktub, tudo já está escrito. Eu não possuo opinião formada a respeito do assunto. Sinceramente, estou mais para a constatação de Sócrates: “sei que nada sei”.

Na realidade, caminhamos a passos largos para o mundo da exclusão social, palco da mais cruel e injusta distribuição de renda da história e de poucas oportunidades para os menos favorecidos. Como estamos no Brasil, os cenários são ainda piores.

Meu amigo atravessa uma fase difícil. Está velho e sofre de preconceito, independentemente dos eufemismos utilizados para mascarar a idade avançada. Para o idoso (melhor idade), apesar dos privilégios da lei, não é fácil lutar contra tantas limitações. Mas nem tudo está perdido. A passagem do tempo traz novos papeis – personagens que devemos encarnar no teatro da vida. Experiência é uma joia rara que só é dada a quem vive mais tempo.

Fiquei imaginando como poderia ajudar o amigo. Pensei em dizer-lhe que a mudança é inevitável, traz ameaças, sim. Contudo, proporciona oportunidades, emoções e momentos raros. Quem tem netos diz que é agraciado com um presente de Deus – privilégio dos que não morrem cedo. Há entendimentos que só virão com o tempo. Somente quando ficamos maduros é que descobrimos o porquê do verde ser a cor da esperança. Sonhamos com tantas coisas e, cá entre nós, já sabíamos que certos sonhos declarados eram mais da boca para fora do que verdadeiro desejo. Não iriam se realizar mesmo. Porém, os sonhos se renovam como células.

Aprendi, lendo Shakespeare, “que depois de algum tempo a gente aprende”… que nossos pais tinham mais razão naquilo que nos diziam do que poderíamos supor. E que, com o passar dos anos, a convivência com a morte de parentes e amigos torna-se frequente. E nos momentos tristes, nos encontros com velhos amigos, prometemos com uma mentira sincera que vamos nos reunir em outras situações para comemorar a vida e não para chorar as mortes de pessoas queridas. Passada a comoção, tudo volta ao normal. Não haverá encontro algum, tampouco o resgate das antigas amizades. A peça teatral que um dia, em algum lugar do passado, representamos juntos, não permite reprise, apenas recordação e saudade. Então nos resta a nostalgia. Eu adoro minhas lembranças e as guardo com saudades da minha infância, da rua calma do interior, numa casa com quintal, onde ser menino era ser imortal. Imaginava que nunca ficaria velho…

Lembranças, quantas lembranças…\ Das goiabeiras gentis, \ Dos abacates tão verdes quanto nossas esperanças,\ Dos limoeiros e laranjeiras, dos animais hostis,\ Lembrança de mim, de ti, dos demais.\ No tempo em que éramos imortais.

Quantos tios, tantos primos – muitos encontros.\ O futuro que nunca chegaria, a infância eterna.\ Nunca a desesperança, nunca o desencontro.\ Sempre o carinho de avó, de mãe terna. \ Os sonhos… tantos sonhos irreais… No tempo em que éramos imortais.

Amigo, recordar também é viver!

* Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui Licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br .

  Comentários
 

Um amigo

por Convidado 22 de junho de 2015   Convidado

por Benício Rocha*

As palavras fluem mansas e tranquilas, reforçadas por agradáveis expressões faciais e um olhar arguto que continua registrando os fatos ao seu redor, de forma organizada, e indo além do visível…

A história da cidade escorre de dentro daquele homem pequeno, que consegue conter um amor por ela maior do que seu gigantismo próprio das metrópoles de hoje.

Ruas, rios, pessoas, personalidades, calçamentos, barro, bairros, bondes, obras acabadas, inacabadas, atualidades, Serra, Santa Tereza, serestas, serenatas, reminiscências, BH.

Com carinho pela história e nojo pelo seu agente, em breves palavras desconstrói o mito do machismo, de indomável libido, incontáveis camas, capangas, camarilhas, mulheres. Jovens, carentes, às vezes discriminadas pela cor, sempre pela pobreza, em seus braços conheciam um homem. Ou só um macho. Primeira vez!

A busca desesperada por uma vida melhor. A ilusão. Um presente. A vida de novo. Às vezes uma barriga, um bebê, um desespero novo. A carência, a dependência de sempre.

O uso do poder do dinheiro. O abuso do ser humano, reduzido a órgão genital.

Depois do sexo, dos negócios infindáveis, do acúmulo de capital, a solidão. O medo diário da morte. Hipocondríaco.

Seu legado, ambição, briga, vergonha…

Nem nome de rua importante se tornou!

Flagelo em nome do capital, na raiz da capital.

Asco.

Um sorriso e uma sentença simples, irônica, cortante: deixa pra lá, passou. E contribuiu pra formação do caráter de grande parte de nossa população…

Pra mudar de assunto, com jeitinho, pergunta se tenho certeza da queda da Graça Foster e acrescenta: “mas você acredita que esse assunto se exaure ali?”.

Fico sem entender como tanto amor por sua cidade, por seu país, cabe nesse homem simples, prático, que, apesar de 78 anos, ainda se indigna. Ainda tem esperança!

Benício Rocha é caratinguense ausente e saudoso, mineiro da gema, amante da boa prosa, sócio da MGerais Seguros, aprendiz de servo do Senhor.

  Comentários
 

por Sérgio Marchetti

Capítulo 2

Conforme dissemos no artigo anterior, o ato de falar em público tem sido apontado como um dos maiores medos e dificuldades dos seres humanos.  A angústia que muitos indivíduos sentem, dias e horas antes da apresentação, resultam num dos maiores desconfortos vividos pelas pessoas. Assim sendo, cuidemos de um dos fatores que mais afeta o orador, tanto psicologicamente quanto na qualidade do conteúdo, que é a escolha do tema. Portanto, quem apresenta deve ter pleno domínio do assunto, com uso de referências e fontes fidedignas. Algumas apresentações se tornam enfadonhas, e até desastrosas, justamente pela falta de conhecimento e de convicção do emissor.

É essencial que o orador conheça seu próprio estilo e potencialize suas qualidades. Pretender ser engraçado apenas por modismo sem dúvida será um passo arriscado com poucas chances de êxito. É importante manter o estilo e não inventar nada. Outra coisa: embora sejamos brasileiros e tenhamos uma cultura de pouco planejamento, algumas providências devem ser tomadas obrigatoriamente com antecedência. São elas:

  • escolha do tema,
  • objetivos e metas que espera alcançar,
  • identificação do público-alvo,
  • planejamento das estratégias e
  • seleção dos recursos.

Toda informação sobre o perfil do público para o qual irá se apresentar, será decisiva para a conclusão do planejamento.

Uma ação que faz muita diferença é conhecer o local onde será realizado o evento e saber sobre suas condições. Podendo, o palestrante deve ensaiar a palestra no local, ainda que por cinco minutos. Isso irá ajudá-lo significativamente.

Outro fator que pode levar um profissional da comunicação em público ao fracasso é a administração inadequada do tempo. É comum vermos palestrantes correndo com suas apresentações ou finalizando-as antes da hora. Passar slides rapidamente dizendo que não são importantes é gafe, além de demonstração de falta de planejamento e até de desrespeito para com aquele público. Justificar, principalmente de forma antecipada, o fracasso ou mesmo uma dificuldade, é falha imperdoável.

Em minhas andanças e observações pude presenciar episódios surreais em eventos. Num deles, o palestrante já se apresentou dizendo que não dominava o tema, e que estava extremamente nervoso. Também pudera… Acreditem, caros leitores, não parou por aí. Ele afirmou ainda: -“Temos duas horas pela frente, Deus é Pai e irá nos ajudar”. Em outra ocasião, um orador ficou mudo, levando a plateia a pensar que era algum truque. Mas ocorreu-lhe uma paralisia, um estado catatônico que o impediu de se apresentar. Foi retirado do palco dizendo repetidamente: -“esqueci tudo!”

Evitar o fumo, as bebidas alcoólicas e alimentos pesados também se fazem necessário.

No planejamento, é importante que o palestrante saiba se haverá perguntas depois da palestra. Digo depois, porque durante a explanação é totalmente desaconselhável quaisquer interrupções. Mas estar preparado para as perguntas é fundamental. Ao respondê-las o orador deve ser objetivo e conciso, evitando quaisquer prolongamentos, o que é muito frequente e cansativo.

Então, meus amigos, como vimos, o ideal é elaborar o conteúdo com um mês de antecedência, pesquisando o tema e fazendo anotações que poderão enriquecer sua palestra.

Por fim, imagine-se ovacionado e aplaudido de pé pelo público.

Clique aqui para ler o Capítulo 1 – Falar em público e comunicar… é só começar

Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui Licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br .

  Comentários
 

por Joel Edmur Boteon*

O glaucoma é uma afecção ocular que causa cegueira irreversível. O diagnóstico precoce, através do exame oftalmológico anual, é imprescindível para manutenção da visão, o que é possível graças à evolução no tratamento clínico e cirúrgico desta afecção.

Os pacientes pertencentes aos fatores de risco, como familiares de portadores de glaucoma, etnia negra, altos míopes e altos hipermétropes, diabéticos, e traumatizados oculares, precisam fazer sempre os exames preventivos, considerando que o avançar da idade também é fator de risco.

Muitos pacientes não estão cientes da hereditariedade do glaucoma, não orientando os membros de suas famílias para exame de triagem para essa afecção.

Durante o exame oftalmológico, os dados da história clínica, a medida da pressão intraocular (tonometria), a visualização biomicroscópica (da presença de alterações da córnea, do cristalino, e da câmara anterior do olho) e do fundo de olho (forma, cor e escavação do disco óptico), orientam para a necessidade de investigação especializada para o glaucoma. A pressão intraocular considerada normal fica entre 10 e 20 mmHg, variando durante o dia.

Para confirmar o diagnóstico de glaucoma e seu controle, solicita-se a paquimetria da córnea (medida da espessura da córnea), a curva diária de pressão intraocular, a retinografia (fotografia colorida do fundo de olho), a determinação do campo visual computadorizado e a gonioscopia (exame do ângulo em que a íris encontra a córnea).

O diagnóstico precoce no glaucoma é fundamental para a preservação da visão. Novas tecnologias têm sido desenvolvidas nesse sentido. O OCT (tomografia de coerência óptica) é mais uma arma nesse arsenal, e seu aprimoramento pode trazer benefícios para um melhor controle da doença. O OCT fornece medidas automáticas do disco óptico (nervo óptico visto no exame do fundo de olho), da rima neural, da escavação do disco óptico, da razão horizontal e vertical da relação escavação-disco, e das medidas da CFNR (camada de fibras nervosas da retina).

Existem vários tipos de glaucomas: os primários e os secundários, os de ângulo aberto (ângulo onde a íris encontra a córnea é amplo e aberto) e os de ângulo fechado (ângulo onde a íris encontra a córnea é estreito ou fechado). O glaucoma mais comum é o glaucoma crônico primário de ângulo aberto.

No glaucoma agudo de ângulo fechado a pressão sobe rapidamente e o paciente percebe halos coloridos ao redor de focos de luz, sentindo dor ocular, náuseas, vômitos e baixa de visão. Trata-se de uma emergência.

No glaucoma de pressão baixa ou normal o olho apresenta alterações glaucomatosas com pressão normal ou baixa.

O glaucoma congênito ocorre em recém-nascidos. A criança apresenta fotofobia (sensibilidade à luz), observando-se as córneas turvas e aumentadas em diâmetro. O tratamento deve ser o mais precoce possível.

Entre os glaucomas secundários temos o glaucoma pigmentar, o pseudoexfoliativo, o traumático, o neovascular, o cortisônico (causado pelo uso de colírios com corticoide) e outros.

O manuseio do glaucoma depende do controle rigoroso da pressão intraocular, que pode ser obtido pelo uso de colírios antiglaucomatosos e/ou por tratamento a laser ou cirúrgico.

O controle do glaucoma deve ser avaliado a cada três ou seis meses, se a pressão intraocular (PIO) estiver normalizada, seguindo as recomendações do especialista em glaucoma – o glaucomatólogo.

A aderência ao tratamento é fundamental para conservação da visão.

*Médico, Doutor em Oftalmologia, professor e Diretor Técnico de Transplante de Córnea do Hospital das Clínicas da UFMG.

  Comentários
 

Pássaros engaiolados

por Convidado 18 de maio de 2015   Convidado

por Benício Rocha*

Meu coração se partiu quado vi uma sacola plástica, dessas de supermercado, voando perto da janela de um apartamento do 5º andar de um prédio, presa por uma linha às mãos de um garotinho. Caixotinho saindo de um caixotão…

Não pude evitar as lembranças de um tempo em que as crianças viviam soltas, descalças, sem alergias e, esbanjando alegria, corriam, pulavam, gritavam e viviam pelas ruas e pastos de capins verdes.

Papagaios linha 24 ou 10, as pipas, cordonet, cuja grafia nunca aprendi.

Faquinhas, taquaras, linhas, papel de seda, tesoura, grude, cores, muitas cores – o roxo era lindo (pano de caixão)!

Carretilha de 8 cruzetas, as feitas pelo “sô” João, lá da Rua Coronel Antônio Salim, já velhinho, eram as melhores da cidade!

Os corações de nossas mães se tranquilizavam e elas sorriam quando, olhando para cima, nos viam em nossas obras coloridas que, alegremente, ocupavam um céu colorido, multifacetado, do qual um sol brilhante queimava nossos rostos.

pássaros engaiolados papagaio

Soltos, descalços, correndo na grama e soltando papagaio. / Foto: Marina Borges

Buscadas, laçadas, linhas pocadas, correrias, alegrias e tristezas, rápidas como pássaros, e a vida abundante que não coube num futuro de espaços mínimos, violência máxima, inteligências artificiais, um sol, às vezes inimigo, que, como caçador pega, fere, mata e se vai…

Uma parte vermelha, alegre, esvoaçante do meu coração uniu-se ao verde daqueles pastos num lindo papagaio menino e a outra parte, negra, triste anciã esquecida num asilo, prendeu-se àquela sacola de plástico pilotada pelo menino online, opaco, protegido pela tela daquela janela da cela por onde passarão seus netos num repetir futurista piorado a cada dia.

Crianças sedentas de vida. Sedentárias. Pássaros engaiolados.

*Benício Rocha é caratinguense ausente e saudoso, mineiro da gema, amante da boa prosa, sócio da MGerais Seguros e aprendiz de servo do Senhor. 

  Comentários
 

por Sérgio Marchetti

Capítulo 1

De acordo com várias pesquisas nacionais e internacionais de fontes confiáveis, constata-se que um dos maiores medos da população mundial é o de falar em público. Os resultados apontam que ele supera até o medo de morrer. Relatos de pânico, lapsos de memória, taquicardia, sudorese, coceiras, pigarro e outras reações estranhas são frequentes e atingem pelo menos a 70% da população. Nos dias atuais, embora haja tanta tecnologia, o número de apresentações presenciais é crescente, ou seja, vamos ter que enfrentar nossos fantasmas e vencer o medo que temos deles.

Por ser professor de Comunicação Oral, muitas pessoas já me procuraram na esperança de eliminarem seus sofrimentos para falar em público. Pude ajudar a muitas delas. E, ao contrário do que todos pensam, meu público individual foi, sem exceção, de pessoas que possuem curso superior e ocupam altos cargos. Um deles me relatou que numa viagem aérea para realizar sua primeira grande palestra, durante uma turbulência chegou a torcer para que a aeronave caísse (ainda bem que ele não era o copiloto), assim morreria como palestrante. Concluí que ele seria tão palestrante quanto Tancredo Neves foi presidente.

Observo, mesmo sem querer, a postura e a voz de profissionais quando estão no palco. Grande quantidade não consegue disfarçar seu desconforto, pois a postura e o tom de voz os denunciam. Sabemos que o momento mais difícil é o do inicio, mais especificamente os primeiros três a cinco minutos. Portanto, administrar o começo é uma estratégia poderosa. Cumprimentar, agradecer e fazer a introdução de forma cadenciada são recursos que podem ajudar a qualquer orador. É providencial falar de assuntos que dominam, acreditam e gostam.

falar em público medo

O palco e o público influenciam nesse medo. / Foto: Marina Borges

Há anos publiquei um livro (com edição já esgotada), cujo título é Falar em Público e Comunicar… é só Começar. Quis, com meus escritos, ajudar a todos que sofrem desse mal. Eu já padeci dele e sei exatamente o que sente uma pessoa inibida quando anunciam seu nome e a chamam para o palco. Naquele momento o palco é o cadafalso. Alguns caminham sem cor e com o semblante de um condenado à morte. Provavelmente dormiram mal de tanta ansiedade e faltou melatonina – hormônio regulador do sono. Outros me confidenciam que seria menos penoso caminhar para a execução do que para falar em público. E não é exagero. Infelizmente o sofrimento é demasiadamente grande para um número expressivo de pessoas.

E de onde vem tanto pavor? Quais são os motivos? Afinal, o orador vai falar de alguma coisa que conhece. Há muita especulação sobre as causas que levam as pessoas a sofrerem tanto, quando estão diante de uma plateia. Os traumas de infância, pais severos e protetores, babás torturadoras, bullying e outros acontecimentos que tenham compelido o indivíduo, fatalmente contribuíram negativamente para gerar temor e, em muitos casos, pânico.

Algumas orientações para falar em público

Para minimizar os efeitos ansiogênicos devemos planejar com muito esmero tudo aquilo que vamos falar sobre um determinado tema, além de dominá-lo. O objetivo de sua apresentação deve estar muito claro. O que pretende? Vender um produto? Convencer o público a tomar alguma atitude?

Toda apresentação deve ter uma abertura, que é o momento de dizer a que veio. Fazer um trailer sobre o assunto vai ajudá-lo significativamente. Na segunda parte faça o desenvolvimento, que é o foco principal da palestra. O orador deve demonstrar sua tese, utilizando-se de referências, estatísticas, fatos, históricos etc. E, ao final, mobilize seu público. Proponha e sugira ações e reflexões. E, por favor, tenha dó. Nada de terminar com o maldito “é isso aí”…

Caríssimo leitor, como viu, há muitos outros detalhes que podem ajudá-lo a transformar o cadafalso em palco. Voltaremos ao tema em outras oportunidades, mas, por ora, cabe dizer-lhe que, de todas as técnicas, a mais importante é a de falar com o coração. Lembre-se disso e vença a inibição com a emoção. Boas falas.

Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui Licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br .

  Comentários
 

Por Léo Heller

O direito humano à água e ao esgotamento sanitário foi explicitamente reconhecido por Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas, de julho de 2010, e do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em setembro de 2010, com forte apoio do governo brasileiro. A Assembleia Geral reconheceu que se trata de “um direito humano essencial para o pleno desfrute da vida”, o que pode ser compreendido em articulação com outras definições sobre os direitos humanos, como a de que todos os direitos são universais, indivisíveis e interdependentes e estão relacionados entre si. Esse reconhecimento, a par de tornar os cidadãos dos vários países portadores desse direito e aptos a reivindicarem-no judicialmente, traz obrigações aos governos e gestores públicos.

O cumprimento do Direito Humano à Água (DHA) supõe assegurar água com disponibilidade, acessibilidade física, qualidade e segurança, financeiramente acessível e que cumpra com os requisitos de aceitabilidade, dignidade e privacidade. Semelhantes atributos aplicam-se ao direito ao esgotamento sanitário. 

No atual momento, em que o país vive uma dramática crise no abastecimento de água, afetando fortemente sua região mais populosa, urbanizada e industrializada, cabe analisar a situação a partir da lente do DHA.

Inicialmente, avaliando o atual desabastecimento, verifica-se que, caso os princípios do DHA tivessem sido observados pelos responsáveis pela prestação dos serviços, as oscilações climáticas que vivemos não teriam se convertido em escassez de água para consumo humano.

Entre os princípios do DHA, espera-se dos Estados-membros das Nações Unidas que empreguem o “máximo recurso disponível” para assegurar o acesso. Violações a esse direito são consideradas situações de retrocesso. Obviamente, caso o planejamento do abastecimento de água nas localidades afetadas tivesse se dado de forma adequada, levando em conta as variações climáticas, mesmo as mais extremas, o problema não estaria ocorrendo com a atual magnitude.

As tendências científicas mais contemporâneas indicam que os sistemas de abastecimento de água têm de ser planejados de forma estratégica, criativa, adaptativa e capaz de aprender com as mudanças da realidade. Quando incorporarmos esses princípios efetivamente no Brasil, nossas cidades ganharão resiliência para enfrentar situações de estresse hídrico.

Outro aspecto que merece um olhar a partir do DHA são as medidas adotadas ou planejadas para enfrentar a crise. Aí reside a maior preocupação atual, pois sabe-se que, em situações de restrição de consumo, são justamente as populações mais vulneráveis as que mais sofrem seus efeitos. Justamente essa população mais indefesa, com menos capacidade econômica, tem de lançar mão de alternativas ao desabastecimento. Isso porque ela é a mais impactada, inclusive quanto à saúde. Refiro-me não apenas ao segmento da população visivelmente mais pobre, a exemplo da que vive nas vilas e favelas, mas também aos moradores de rua, aos idosos, às crianças e à população carcerária.

O atual momento requer colocar os princípios do DHA no centro da atenção dos decisores públicos. A gestão da crise, por meio de medidas para a restrição de consumo, sejam elas quais forem – redução de pressão nas redes, instrumentos econômicos punitivos, campanhas contra o desperdício, rodízio e racionamento – não deve assumir que todos os usuários sofrerão impactos equivalentes. Ao contrário de medidas de caráter universal, essas devem ser tomadas focalizando afirmativamente as parcelas mais vulneráveis da população, que devem ser protegidas, a bem do cumprimento do DHA.

Além disso, outros princípios do DHA também devem ser evocados neste momento: a transparência e a participação. Medidas para restrição do consumo não se restringem a um processo técnico de tomada de decisão. É um processo que tem implicações sociais diretas nas populações das cidades. Portanto, o processo decisório não deve ser uma exclusividade de gestores públicos e de especialistas. Deve ser um processo democrático, que conte com a participação dos representantes dos afetados, seja nos próprios fóruns constituídos para gerir a situação de crise, seja envolvendo os conselhos de participação social já instituídos.

Léo Heller é pesquisador da Fiocruz-Minas, relator especial das Nações Unidas para o Direito Humano à Água Segura e ao Esgotamento Sanitário e membro da Plataforma Política Social.

  Comentários