A revolução dos bichos
por Sérgio Marchetti
Hoje, após ouvir o noticiário matinal, senti uma enorme revolta e uma tristeza imensa com os rumos de nosso maltratado Brasil. Falaram, os jornalistas, de assassinatos, corrupção, impunidade… Reflitam: nesse momento os governantes nos devem satisfação sobre suas falcatruas e omissões, sobre o quadro vergonhoso e lastimável pintado com as tintas da desonestidade, do descaramento, da advocacia somente em causa própria… Até perdi o fôlego, desculpem-me. Mas diante de tanto absurdo, esses devedores, com ficha imunda, nos impõem aumentos de taxas e de impostos, para pagar os seus próprios desvios. Tudo aqui no Brasil é inusitado – mandam nele um ex-presidente, uma presidente e trinta e nove ministros. Estão lá porque nós pagamos com suor e, literalmente, com muito sangue, o salário e todos os auxílios que se dispuseram a ter direito.
Não por acaso, lembrei-me, agora, de um filme – Gladiador. Nele o que move e dá força aos escravizados é o orgulho e a honra. Mas aqui, no gigante adormecido em berço esplêndido, pelos fatos, quem governa tem força, porém, lhes falta honra. Mas nós, os explorados, devemos continuar sendo honrados. Não podemos permitir que nos roubem também a dignidade.
Falei de filme e, agora, bateu-me à porta da mente a lembrança de um livro, A Revolução dos Bichos, de George Orwell. Faz tempo que o li, mas queria o autor, em sua essência, demonstrar a decepção com a Revolução Soviética e, até mesmo, com o socialismo que ele próprio defendia. Há, naqueles escritos, uma filosofia que gostaria de compartilhar com os leitores. Passados tantos anos que fiz a leitura, ficou-me o registro de que a história se passa na zona rural e, como em muitas fazendas, os proprietários possuíam vacas, cavalos, galinhas, ovelhas e outros animais domésticos. Um dia aqueles animais se reuniram e, comandados por um porco, chegaram à conclusão de que estavam sendo explorados pelos seus donos. As galinhas achavam um absurdo doarem seus ovos e ainda serem abatidas para alimentar os moradores da fazenda. O cavalo e o burro, da mesma forma, se sentiam escravizados num serviço pesado. As ovelhas doavam o leite e a lã. As vacas… talvez tossissem. O que tenho certeza é que o lucro era apenas dos donos da fazenda. “A colheita é comum, mas o capinar é sozinho” (Guimarães Rosa). Uns trabalhavam e outros ganhavam. Surgiu então a ideia da mudança. Os animais tomaram a fazenda.
Logo no início do novo regime, o porco líder, muito falante e, parecendo ser verdadeiro, prometeu o fim dos abusos e da exploração dos animais trabalhadores. Dizia que haveria justiça e vida nova para todos. Mas não houve nada disso. O porco ficou deslumbrado com o poder e não cumpriu as promessas, sendo incoerente com tudo que pregou. Foi corrompido. Rodeou-se de outros animais, concedendo-lhes vantagens nada honestas e, para decepção de tantos seguidores, seus gastos, abusos e desvios foram infinitamente superiores aos de seus antigos donos.
Compreendo perfeitamente a decepção de Orwell. E acredito que muitos leitores compreendam-no também.
Bem, depois destas reflexões, preciso recuperar as boas energias. E, para não ter que sofrer assistindo a outro noticiário, vou me distrair com um filme bem antigo e leve… Ali Babá e os Quarenta Ladrões.
Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui Licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br .