Carnaval e cinzas – poeta triste trazendo alegrias…
* por Sérgio Marchetti
É Carnaval! São três dias de folia e brincadeiras… Que nada! Tudo mudou. A brincadeira se transformou em droga, sexo e axé. O que resta nas memórias de algumas retinas fatigadas como as minhas é a saudade das brincadeiras dos antigos carnavais. Era diversão, mas isso é pura nostalgia de quem amava os salões e as marchinhas.
Quando Luiz Carlos Paraná escreveu Maria, Carnaval e cinzas, eu, criança, achei uma falta de gosto fazer uma letra tão triste para o Carnaval. Vejam duas estrofes:
Nasceu Maria quando a folia
Perdia a noite ganhava o dia
Foi fantasia seu enxoval.
Nasceu Maria no carnaval.
E não lhe chamaram assim como tantas
Marias de santas, Marias de flor
Seria Maria, Maria somente
Maria semente de samba e de amor.Morreu Maria quando a folia
Na quarta-feira também morria.
E foi de cinzas seu enxoval
Viveu apenas um carnaval.
Hoje, adoro a letra. Continuo achando triste, mas gosto dela. Tempos depois, também escrevi uma “letrinha” para sair com um bloco de amigos. Mas nunca saímos e a letra ficou guardada. Também não é nada alegre, mas é o que tem para hoje: saudade.
Carnaval e cinzas - poeta triste trazendo alegrias... O meu bloco vai sair na rua E você vai sambar tão nua, Vai fazer o povo me aplaudir, Vai fazer o povo me sorrir... E no delírio que esta marcha traz Todo mundo vai sentir em paz, Vão vibrar com a nossa alegria, Vão dançar com a nossa folia E em coro então vão cantar: Esta é a marchinha de um poeta triste, Esta é a pureza que ainda existe; Este é um bloco bem genial. É a alegria do meu carnaval. E minha ala vai passando lenta, E a multidão nos saudando atenta... É a alegria desse povo triste, Que durante todo o ano insiste Pra poder num carnaval cantar: Esta é a marcha de um poeta triste, Esta é a pureza que ainda existe; Este é um bloco bem genial. É a alegoria do meu carnaval. São três dias de loucura e fantasia, São três dias de teatro e poesia. E antes da quarta-feira acordar O nosso bloco vai com tudo pra abalar, Pois ainda temos uma noite para cantar: Esta é a marcha de um poeta triste, Esta é a pureza que ainda existe; Este é um bloco bem genial. É a nobreza do meu carnaval. A quarta-feira vai se anunciar E as cinzas vão nos separar... Outra vez, a fantasia durou pouco. Mas por você continuo sempre louco. E aí vou vestir a outra fantasia Personagem sério, sem nenhuma alegria, E com ela o ano todo desfilar, Esperando um ano inteiro pra te amar, Para de novo no carnaval cantar: Este é o bloco de um poeta triste, Esta é a pureza que ainda existe; Este é um bloco bem genial. É a nostalgia do meu carnaval. E o meu bloco então passou... Alegrias, fantasias, alegorias desfilou. Mas chegou a quarta- feira e acinzentou E o bloco, que era sonho, acordou.
Então, caro leitor, ponha seu bloco na rua, mesmo que ele seja o bloco do poeta triste, mesmo que sua marchinha nunca seja cantada e que a fantasia nunca seja usada e que tudo isso seja apenas um sonho de três dias. Deixe o bloco passar e levar toda a energia ruim. Seja mais livre, mais tolerante, deixe que o coração lhe conduza e a emoção, fruto de uma outra fantasia, lhe faça mais feliz.
Afinal, Carnaval é feito para usar fantasias e deixar que a insustentável leveza do ser possa tirá-lo do chão. Peça licença à tristeza, separe-se dela; “você pra lá e eu pra cá”, até quarta-feira. Então, fique de bem com a vida. “Vem… pra ser feliz…”
* Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.