2016, o ano que não terminou
* por Sérgio Marchetti
“ Temos todos nós que vivemos/ uma vida que é vivida/ e outra vida que é sonhada/ mas a única vida que temos/ é a que está dividida entre a certa e a errada.” (Fernando Pessoa)
O ato de viver tem duas faces: vida e morte. E nos oferece três tempos para viver e só um para morrer. Tudo acontece no presente, embora tenhamos o passado – que nunca voltará – e o futuro que, quando chegar, será apenas presente. Sabemos como foi o começo e que haverá um fim. E, entre os dois, vigora a incerteza de como será a trajetória. Não dá para adivinhar o futuro. Quando muito, planejá-lo. Talvez uma estrela iluminada possa nos guiar pelas veredas do sucesso. Mas não há luz para todos e os resultados não dependem exclusivamente de nós. Fatores internos, crises e políticas desajustadas podem arruinar qualquer um.
Como disse, nossa vida é indicada por tempo, mais propriamente por anos e que, por sinal, mais um chegou ao fim. Tivemos um janeiro de esperanças, dez meses de decepção e um dezembro de desesperanças. Nós, cidadãos maduros, que já passamos do meio dia de nossas vidas, tivemos a oportunidade de repetir esta façanha por diversas vezes. Nem parece que foram tantas.
Chegar ao final do ano e ter a oportunidade de um novo começo, por si só, já é uma dádiva muito digna de agradecimento. Muitas pessoas findaram sua história neste ano que se passou. Outros tantos abortaram seus sonhos em tragédias, tal qual a aeronave da LaMia, cujo piloto causou a morte de 71 pessoas. A causa do acidente foi gerada pela voracidade da obtenção do lucro. Revoltante, desastroso e criminoso o motivo que deixou tantas pessoas com o vazio da inexistência. Perderam maridos, pais, filhos, irmãos, amigos e colegas. A dor da ausência se amplia mais quando acontece um acidente e, principalmente, quando ele é causado por imprudência, irresponsabilidade e ganância.
Pelos mesmos motivos de Miguel Quiroga, no Brasil governantes causaram tragédias piores, legislando em causa própria e estropiando vidas. Faltaram escrúpulos, seriedade e senso de humanidade.
Não tenho dúvidas de que 2016 ficará na memória. Nem Fidel resistiu a ele. Partiu para sempre o grande ditador. Agora, realmente está exercendo a igualdade que tanto pregou. Cuba está sem pai e sem dono. Dom Paulo Evaristo Arns, uma alma boa que lutou pela justiça, sucumbiu neste dezembro e nos deixou mais desamparados ainda. Também perdemos Ferreira Gullar e, junto com ele, os últimos suspiros da poesia.
Por tudo isso, o referido ano ficará marcado na história. No Brasil será registrado como um dos anos mais tristes, em todos os sentidos. E, como escreveu Zuenir Ventura a respeito do ano de 1968; 2016 foi um ano que também não terminou. A conta não fechou. O país não cresceu, a crise não acabou, os maiores responsáveis por ela não foram presos.
“o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou. E agora, José?” (Drummond)
Mas temos que ser fortes e resilientes. Não nos resta outra opção. A dor que não mata, embora arranque pedaços, nos torna mais resistentes.
Apesar do nada que foi esse ano que passou, esperançar é tudo que nos resta conjugar. Então, caros leitores que ainda têm a paciência de ler meu amontoado de ideias traduzidas em pobres palavras, deixem que os primeiros dias de janeiro lhes tragam sóis de esperança, luzes para clarear nosso túnel e, ainda, quem sabe, mais união para que lutemos pelos nossos direitos de cidadãos.
Ainda estamos vivos… Os novos dias nos convidam a ter fé. Então…
“vem, vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. (Geraldo Vandré)
* Sérgio Marchetti é educador, palestrante e professor. Possui licenciatura em Letras, é pós-graduado em Educação Tecnológica e em Administração de Recursos Humanos. Atua em cursos de MBA e Pós-Graduação na Fundação Dom Cabral, B.I. International e Rehagro. Realiza treinamentos para empresas de grande porte no Brasil e no exterior. www.sergiomarchetti.com.br.